Pesquisa da FEQ desenvolve material à prova d’água e com ótima capacidade para o transporte de vapor.
Dentro de algum tempo, é bem provável que você abra o armário e tenha que levar em consideração um novo aspecto na escolha da roupa que vestirá para ir ao trabalho ou à academia. Assim, além de decidir pela cor e design, terá também que optar pelo tecido mais apropriado às suas necessidades de momento. Este poderá lhe proporcionar tanto um bom transporte de umidade quanto uma melhor troca de calor com o ambiente, para ficar em somente dois exemplos. Embora ainda seja embrionária no Brasil, a pesquisa voltada ao desenvolvimento de produtos têxteis funcionais começa a apresentar resultados promissores no país.
Um desses estudos foi conduzido pela engenheira têxtil Camilla Borelli Silva, no contexto da sua tese de doutoramento defendida na Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp. O trabalho, orientado pelo professor Edison Bittencourt, resultou no desenvolvimento de um tecido impermeável, atributo indispensável à produção de determinadas roupas esportivas e profissionais. Conforme a autora do estudo, cada vez mais a indústria busca fabricar itens de vestuário que ofereçam algo além da simples cobertura do corpo.
Os tecidos funcionais, que já foram chamados de “inteligentes” no passado, têm exatamente essa missão. O conforto se destaca como um dos atributos mais valorizados nos artigos têxteis e pode ser definido pelos aspectos físico, termofisiológico e psicológico. “No caso da minha pesquisa, o principal objetivo foi analisar o conforto termofisiológico proporcionado pelo tecido, termo que tem a ver com a sua capacidade de liberar o calor e a umidade gerados pelo corpo no ambiente”, afirma.
Camilla explica que o corpo humano libera calor durante a prática de qualquer atividade física. Para regular a temperatura, o organismo gera primeiramente vapor d’água, que depois de condensado vira suor. “O tecido da roupa funciona como uma barreira para a troca de calor e liberação de suor entre o corpo e o ambiente. Ou seja, se essa troca for feita de maneira mais eficiente, o corpo se resfriará mais depressa, evitando que o vapor se transforme em líquido e permitindo que o tecido seque mais rapidamente. Com isso, a pessoa se sentirá mais confortável”, pormenoriza.
O conforto fisiológico, prossegue a pesquisadora, deve existir não somente quando a pessoa realiza alguma atividade física intensa, mas em relação a qualquer ação em que haja geração de suor, o que torna evidente a necessidade de utilizar tecidos que ofereçam aos usuários uma boa gestão de umidade. “Ou seja, precisamos de tecidos que protejam do frio ou calor e simultaneamente permitam o transporte da umidade ao ambiente”, reforça.
Em seu trabalho, a engenheira têxtil criou um tecido a partir de fios de poliéster. A escolha dessa matéria-prima foi feita porque ela dá origem a tecidos resistentes, baratos, que não amassam e são fáceis de lavar e secar. “Eu variei a quantidade e o diâmetro dos filamentos que compõem os fios, bem como a forma como os fios foram tramados. Esses aspectos são importantes porque interferem na capacidade do tecido de transportar umidade. O passo seguinte foi analisar a influência destas diferentes configurações no comportamento do tecido. Para isso, eu usei um método ainda pouco conhecido no Brasil, denominado Moisture Management Tester (MMT)”, relata Camilla. O aparelho pertence ao Centro Universitário da FEI, onde Camilla coordena o curso de Engenharia Têxtil.
“O MMT é um método muito interessante porque faz uma análise dinâmica do transporte de umidade no tecido. Nos testes convencionais (capilaridade), o tecido é colocado em contato com a água, que sobe ao longo do seu comprimento. Quanto mais a água sobe, maior capacidade de transportar umidade ele tem. Ocorre que isso não é o que acontece no corpo. Por isso o MMT é uma ferramenta importante na gestão da umidade do tecido. Em outras palavras, ele simula o suor passando pelo tecido e analisa o espalhamento, a velocidade do espalhamento e quantidade de líquido em cada face ou superfície do tecido e quanto de líquido passou de um lado para o outro”, detalha a autora da tese de doutorado.
A pesquisadora adverte, porém, que esse método não mede as propriedades de transporte de umidade na forma de vapor e nem o tempo de secagem do material, que também influenciam na percepção humana de conforto. “Por isso, dependendo do tipo de aplicação a ser avaliada, é necessário complementar a pesquisa com outros testes. Neste estudo, por exemplo, foram avaliadas também as propriedades do tecido relativas à capilaridade, permeabilidade ao vapor e permeabilidade ao ar”, pormenoriza Camilla.
Retornando ao método MMT, ao final da análise ele fornece gráficos que ajudam o pesquisador a classificar o desempenho do tecido. “O material que eu analisei, em razão da configuração que fiz, tem características que o tornam à prova d’água e com ótima capacidade para o transporte de vapor. Trata-se, portanto, de um produto apropriado para uso em climas frios, para a prática de esportes de inverno e até mesmo para a confecção de uniformes profissionais”, informa Camilla. De acordo com ela, a obtenção desse tipo de resultado gera informações relevantes para ajudar no desenvolvimento de novos produtos por parte da indústria.
No Brasil, complementa a autora da tese, ainda há muito que se avançar em relação a pesquisas na área têxtil. “Temos notado uma movimentação nesse sentido no país, mas ela ainda é incipiente e está concentrada principalmente na academia. No exterior, há um volume maior de estudos, inclusive por parte do setor produtivo. Entretanto, mesmo lá fora as abordagens em torno do tema conforto são recentes. É importante que nós tenhamos mais pesquisas nessa área, pois o mercado é muito amplo. Se pararmos para pensar, veremos que estamos cercados por produtos têxteis”, observa Camilla.
Ao falar de produtos têxteis, a pesquisadora lembra que não está se referindo somente a roupas. “Os tecidos são utilizados por diversos segmentos, entre eles a medicina e a construção civil. Nesta última, por exemplo, é comum a aplicação de tecidos entre a alvenaria e o acabamento com o objetivo de impermeabilizar a estrutura”, lembra. Em relação ao seu trabalho especificamente, Camilla revela que já foi procurada por algumas empresas interessadas em discutir a definição parcerias. “Essa aproximação entre a academia e a indústria é fundamental, pois é ela que permitirá o desenvolvimento de novos e melhores produtos”, diz.
Publicação
Tese: “Comparativo das propriedades de transporte de umidade, capilaridade, permeabilidade ao vapor e permeabilidade ao ar em tecidos planos de poliéster”
Autora: Camilla Borelli Silva
Orientador: Edison Bittencourt
Unidade: Faculdade de Engenharia Química (FEQ)
http://www.unicamp.br/unicamp/ju/570/vez-dos-tecidos-funcionais
Tags:
Parabéns Edison Bittencourt.
O trabalho, orientado pelo professor Edison Bittencourt, resultou no desenvolvimento de um tecido impermeável, atributo indispensável à produção de determinadas roupas esportivas e profissionais.
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