Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Quatro anos depois de mergulhar num inferno pessoal e profissional, ele retorna ao mundo da moda para tirá-lo do normal

Normalidade foi a palavra que definiu o estilo de 2014. O ano começou com os desfiles da Chanel e da Dior, baluartes da elegância francesa, apresentando roupas de alta-costura com modelos usando tênis. As grifes de luxo pareciam ter se rendido à tendência “normcore”, que prega um guarda-roupa sem ostentação, basicamente de jeans, camisetas e moletons amarrados na cintura, e que fala diretamente ao coração da geração internet. São jovens que têm como ídolos não as estrelas inalcançáveis de Hollywood e seus vestidos caríssimos, mas os bilionários do Vale do Silício, como Steve Jobs, Larry Page e Mark Zuckerberg. Fundador do Facebook, de 30 anos, Zuckerberg chegou a dizer que não trocava sua camiseta cinza e seu jeans surrado por nenhuma peça de moda. Que, assim como não gosta de decidir o que vai tomar no café da manhã, não “perde tempo” escolhendo o que vai vestir, já que precisaria dedicar seu tempo integralmente às decisões de sua empresa.

Assim como os seguidores das redes sociais, o mundo fashion também tem humores voláteis. O ano de 2015 começou na direção oposta, apontada por um dos estilistas mais influentes dos últimos 20 anos, o inglês John Galliano. Seu desfile de retorno à moda, que aconteceu em Londres, em janeiro, foi uma bela – e aplaudidíssima – aula de extravagância.

Galliano estava fora do mercado desde março de 2011, quando foi demitido da grife francesa Dior após ter sido flagrado bêbado desferindo impropérios antissemitas num bar parisiense. Processado e internado para se recuperar do vício no álcool e nas drogas, perdeu também o controle da marca que leva seu nome, hoje sob controle do conglomerado LVMH, a maior empresa de luxo do mundo. Nas poucas entrevistas que deu depois do episódio, atribuiu seu descontrole à pressão de produzir, durante 14 anos ininterruptos, oito coleções anuais, sem contar as campanhas publicitárias de roupas e perfumes e turnês internacionais de abertura de lojas.

 
 
 
 
 
 


Uma de suas maiores apoiadoras, a editora da Vogue americana Anna Wintour, tentou, sem sucesso, alocá-lo na equipe do estilista americano Oscar de la Renta. A parceria durou apenas uma coleção – Galliano não queria morar nos Estados Unidos e sonhava com sua volta triunfal a uma marca europeia de prestígio.
 

ELE VOLTOU 1. Galliano como toureiro. A intenção era provocar. 2. Galliano como discreto funcionário da moda. Ele quer se reconciliar. 3. Um dos modelos da Maison Margiela. Chega de normalidade (Foto: Tony Barson, reprodução e Tom Jamieson/The New York Times)
ELE VOLTOU 1. Galliano como toureiro. A intenção era provocar. 2. Galliano como discreto funcionário da moda. Ele quer se reconciliar. 3. Um dos modelos da Maison Margiela. Chega de normalidade (Foto: Tony Barson, reprodução e Tom Jamieson/The New York Times, )

O empresário italiano Diego della Valle cogitou contratar Galliano para assumir a direção criativa do retorno da grife Schiaparelli, fundada nos anos 1930 pela estilista italiana Elsa Schiaparelli, e que fechara as portas em 1954. Foi dissuadido pelo empresário francês Bernard Arnault, dono da Dior, que tem participação na holding de Della Valle e ódio mortal a Galliano pelo escândalo que quase minou a credibilidade de sua marca.

Outro italiano decidiu apostar no talento indiscutível do estilista, o empresário Renzo Rosso, dono do conglomerado de sugestivo nome Only the brave (Somente os bravos, em tradução livre), que reúne as grifes Diesel, Viktor & Rolf, Marni e Maison Martin Margiela. Foi para a Margiela, fundada em 1988 pelo belga Martin Margiela, que Rosso contratou Galliano. “Dei a Galliano total liberdade para criar, e ele trabalhou incansavelmente durante os últimos seis meses para esse trabalho excepcional”, diz o empresário. No fim do desfile, anunciou que a marca passaria a se chamar Maison Margiela, tirando o prenome de seu discreto fundador, que deixou a empresa em 2008, alegando não se adequar ao glamour do mundo da moda.

Esqueçam qualquer normalidade. As peças de Galliano tinham texturas tridimensionais, máscaras acopladas a vestidos, luvas de cristais, leggings bicolores. Viam-se uma parca com estampa de tigre usada sobre saia vermelha-escarlate, um vestido de noiva barroco cheio de penduricalhos, drapeados e assimetrias, um short jeans todo rasgado e sapatos com plataformas altíssimas, que parecem sepultar a era dos tênis e dos chinelos de dedo. Mas também havia traços de uma alfaitaria impecável e elegante, como num vestido de corte reto de veludo vermelho, com decote profundo nas costas. Galliano sabe chocar, mas também vender.

Sabe, igualmente, que ainda precisa do perdão coletivo. Em vez de aparecer no final do desfile vestido de toureiro louco ou de pirata de peito de fora, como nos tempos da Dior, surgiu com a longa cabeleira penteada para trás, usando um jaleco branco, a exemplo de como se vestem os alfaiates e artesãos dos grandes ateliês de alta-costura. A escolha de Londres como cenário do desfile da semana passada, que contou com 100 convidados (como a modelo Kate Moss e a amiga Anna Wintour) também foi oportuna. Se tivesse apresentado a coleção em Paris, no calor do atentado do início do mês ao mercadinho judeu, poderia ter sido mal recebido.

Tanto a crítica especializada quanto os grandes compradores das lojas de departamentos internacionais aclamaram a coleção extravagante de Galliano. “Enquanto essa onda de normalidade maçante chega à praia, a volta de John Galliano às passarelas deve ser bem-vinda por qualquer um que ame a glória do extraordinário”, diz a editora de moda inglesa Suzy Menkes.

Sobre a opinião de Mark Zuckerberg a respeito da desimportância da moda em seu cotidiano, é bom lembrar que a hashtag #fashion foi compartilhada nada menos que 150 milhões de vezes em suas redes sociais, o que alçou o assunto à lista dos cinco mais postados em toda a história. A moda nunca esteve tão na moda. Por isso, é bom ter Galliano de volta para nos recordar que seus maiores protagonistas nunca foram pessoas muito normais.

http://epoca.globo.com/vida/noticia/2015/02/volta-do-estilista-bjoh...

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