Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Algodão em mudança – Parte 1

A agitação que sacudiu o mercado do algodão em 2011, com vagas que se repercutiram no ano seguinte, provocou diversas situações de incumprimento por parte das fiações, o que fez com que o mercado até agora orientado por “acordos de cavalheiros” esteja a optar pelas vias judiciais. 

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Algodão em mudança – Parte 1

O comércio mundial de algodão, que ainda opera com base em apertos de mão e confiança, para admiração dos operadores mais rígidos noutros mercados de matérias-primas, pode perder muito do seu estilo “clube de cavalheiros” devido a uma onda de falta de pagamento por parte das fiações.

Os negociantes estão a rever práticas com séculos que se baseavam em promessas de pagamento em vez de depósitos de dinheiro – com qualquer disputa resolvida calmamente através de arbitragem – e agora estão a tomar, ou a considerar tomar, ações legais para parar a maré de falta de pagamento de contratos causada pela elevada volatilidade dos preços que afeta a indústria desde 2011.

O National Cotton Council (NCC) estima que contratos no valor de mil milhões de dólares (746,77 milhões de euros), ou 7%, dos 14 mil milhões de dólares do mercado mundial de algodão podem estar em falta de pagamento.

Muitos dos acordos têm sido rasgados, já que foram assinados quando os preços estavam a subir para os valores recorde de 2,20 dólares por libra em março de 2011. Em muitos casos, a batalha para assegurar fornecimento significou que as fiações concordaram pagar preços recorde, embora a entrega da fibra fosse apenas contratada para um ano depois.

Quando os preços colapsaram para menos de um dólar, as fiações que se debatiam com margens esmagadas e fraca procura afastaram-se desses negócios com preços altos a uma taxa sem precedentes.

Joe Nicosia, diretor de algodão na trading Louis Dreyfus, a maior negociante mundial de algodão, está a ameaçar submeter processos legais contra os clientes que reneguem os contratos e está agora a forçar alguns compradores a fazerem depósitos.

«A arbitragem não é o último recurso. É uma fase intermédia. Há imposições legais», indicou numa entrevista à margem da conferência Cotton Beltwide, a maior reunião de agricultores dos EUA. «Levaremos as pessoas a tribunal», acrescentou.

Nicosia não nomeou quem estava na sua mira, mas a mensagem foi clara. «Não vamos esquecer, não vamos deixar de perseguir. Vamos perseguir política e legalmente», afirmou Nicosia, que é visto como o porta-voz não-oficial da comunidade de negociadores de algodão.

Peso financeiro
Recorrer a processos judiciais dispendiosos e demorados com a esperança de apreender bens como compensação é um passo dramático para a indústria. A estratégia não é usada de forma abrangente há décadas e ir para tribunais estrangeiros é raro, afirmam pessoas ligadas ao mercado. Enquanto agentes entre os agricultores e as fiações, os negociantes foram muito atingidos por quebras de contrato.

Ficar com depósitos ou pedir garantias de bancos ou empresas-mãe de alguns clientes pode ajudar a retomar a confiança. Isso é considerado mais seguro do que letras de crédito, que têm sido o método tradicional de garantia.

Alguns negociantes conseguiram pedir depósitos de 5% a 10% de fiações na Ásia, afirma Jordan Lea, presidente e coproprietário da empresa de negociação de algodão Eastern Trading, na Carolina do Sul.

Os negociantes estão também a fazer muito mais diligências sobre novos clientes, afirmam fontes ligadas ao negócio.

Ainda assim, uma mudança nas práticas seria difícil de introduzir nos EUA, onde as fiações de pronto-pagamento iriam hesitar com os pedidos de depósitos. Também deveria aumentar o fardo financeiro de muitas empresas que estão já com dificuldades de liquidez devido às grandes variações de preços, que afetaram a procura por fibras naturais.

Fiações no Bangladesh, que têm o maior número de faltas de pagamento desde 2011, foram muito afetadas quando as linhas de crédito foram retiradas com os preços a diminuírem para menos de metade dos picos de março de 2011, indicou Muhammad Ayub, presidente da Associação de Algodão do Bangladesh.

Os produtores de vestuário também cancelaram as encomendas na altura das variações dos preços, indicam fontes das fiações. «Os devedores são vítimas das circunstâncias», considera Ayub.

Esta não é a primeira vez que a indústria fica em dificuldades com o excesso de capacidade, margens baixas e cancelamento de contratos. E muitas fiações também honraram os seus contratos, incorrendo em enormes perdas, ou negociaram novos termos com os seus fornecedores.

Embora as fiações sejam um dos focos de problemas para a forma tradicional de negociar algodão, os agricultores também não estão isentos de culpa, como revela a segunda parte deste artigo.

Algodão em mudança – Parte 2

Com tantas situações de incumprimento, que estão a levar a prejuízos de milhões de dólares, a confiança caiu a pique, não só entre tradings e clientes, como entre tradings e agricultores. Uma situação que já chegou a Washington e à barra dos tribunais americanos, depois do fracasso do processo de arbitragem. 

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Algodão em mudança – Parte 2


As elevadas perdas causadas por situações de incumprimento por parte das fiações, devida essencialmente à enorme flutuação dos preços do algodão desde 2011 (ver Algodão em mudança – Parte 1), foram ainda agravadas pela rejeição dos contratos do outro lado do binómio comercial: os agricultores.

Muitos agricultores que fizeram contratos para vender as suas colheitas de algodão a preços muito mais baixos em 2010 renegaram esses acordos quando os preços começaram a subir um ano depois, forçando os negociantes a pagar muito mais para cumprirem os seus compromissos de exportação.

Esses fracassos foram geridos de forma mais rápida do que os negócios a longo prazo para os quais as fiações foram atraídas.

Cerca de 185 empresas de quase 50 países, incluindo os EUA, rasgaram contratos e desrespeitaram as decisões de arbitragem contra eles nos últimos dois anos, segundo os registos mantidos pela International Cotton Association (ICA), que regula a indústria. Os seus 500 membros incluem agricultores, negociantes e fiações.

Com o mercado a passar por um dos períodos mais tumultuosos da sua história, os processos judiciais começam a surgir em várias direções.

Joe Nicosia, diretor de algodão na trading Louis Dreyfus, a Louis Dreyfus e a sua subsidiária americana, a Allenberg Cotton, são eles próprios alvo de um processo judicial. Enfrentam alegações do ex-negociante da Glencore Internacional PLC, Mark Allen, de artificialmente inflacionarem os preços em 2011, num dos processos judiciais de manipulação de matérias-primas com maior visibilidade em mais de uma década.

Allen acusou a empresa e o seu patrão de violarem as leis da concorrência ao encurralarem o mercado de futuros, levando ao aumento dos preços em maio e julho de 2011, mesmo enquanto os preços no mercado físico estavam mais baixos.

O negociante deixou o seu emprego na Glencore em novembro de 2011 depois da empresa de trading ter perdido mais de 300 milhões de dólares (cerca de 224 milhões de euros) no mercado durante a agitação. A Louis Dreyfus negou as acusações e apresentou uma moção em novembro para arquivar o caso.

As apostas altas também levaram alguns agricultores ao limite, muitas vezes para beneficiarem de tradings como a Dreyfus. Recentemente, um dos maiores grupos de agricultores da Austrália, a Namoi Cotton Co-operative Ltd, aceitou um acordo da trading depois de ter perdido quase 70 milhões de dólares australianos, em parte devido a faltas de pagamento em 2011 e 2012.

Jogo duro
Ao jogar duro, Nicosia, que cresceu em Chicago, longe do mercado/clube de algodão de Memphis, Tennessee, quer recuperar algum do dinheiro da empresa. A Dreyfus não revelou o valor das contas por pagar.

Em contrapartida, os negociantes esperam que uma das figuras mais influentes e de alto perfil da indústria ajude a mudar a maré.

«Ele está a tentar encontrar um remédio para a própria situação. É bom para a indústria. Devíamos todos fazer isso», considera Jordan Lea, presidente e coproprietário da empresa de negociação de algodão Eastern Trading, que também tem funções de mediação na ICA. «É também tentar contrariar essa mentalidade e crença de que está tudo ok (com as faltas de pagamento)», acrescenta.

Embora a ICA tenha sido inundada por um número recorde de pedidos de arbitragem em 2011 e 2012, teve dificuldades em pôr em prática as decisões.

A sua lista negra de empresas que não cumpriram os seus procedimentos de arbitragem aumentou mais de um terço desde 2011, para mais de 500.

O Bangladesh, o segundo maior importador de algodão a seguir à China, tem de longe o maior número, com 47 empresas, o que equivale a um quarto das adições desde 2011. O Vietname, o sexto maior importador mundial, tem 24 listadas nos últimos dois anos, enquanto o Paquistão tem 15 empresas, seguido da Tanzânia, com 14 empresas.

Até 2011, a ameaça de ser acrescentado à lista negra, que data de 1976, era muitas vezes suficiente para deter os faltosos.

Mas com as empresas a ignorarem as sentenças, impor as decisões tornou-se um dos maiores desafios da ICA. Numa ação radical, a associação criou um comité de vigilância para monitorizar as empresas suspeitas de usarem métodos “desonrosos”, como criar empresas-fachada para comprar em nome das faltosas.

Nicosia, que trabalha há 30 anos para a Dreyfus, também pediu a Washington para pressionar os governos estrangeiros para imporem os contratos e as sentenças da arbitragem.

O seu pedido surge numa altura em que uma delegação de negócios, incluindo representes da grande empresa de trading Cargill Cotton e de associações americanas, se preparam para marchar para o capitólio para pedir ajuda.

«A indústria tem uma longa história de integridade», afirma Nicosia. «Isso tem sido desafiado e se não for remediado, vai resultar em mudanças nos preços e contratos», concluiu.
  Fonte:http://www.portugaltextil.com/tabid/63/xmmid/407/xmid/42048/xmview/...

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