As vantagens de ser invisível - Tendência de comportamento

[Romildo de Paula Leite]

Acontecimentos socioculturais no mundo todo ganham reflexos na moda, na arte e decretam o anonimato como o mais novo luxo. Novas poéticas visuais chegam à moda e influenciam as tendências no momento de criar produtos. As tendências como normalcore (se vestir avesso ao clamor fashionista) ou mesmo a lowengware (influenciada pelo conforto) se confirmam cada vez mais nas passarelas e chegam ao mercado de massa.

O mix de produto de uma coleção comercial geralmente é composto por 10% de peças básicas, 20% de peças vanguardistas e 70% de peças fashion – as peças que são criadas a partir da pesquisa de tendência. É claro que este percentual muda de empresa para empresa, entretanto cada vez mais as peças básicas aumentam seu percentual.

O que parece um guarda roupa confortável é, na verdade, reflexo de um movimento muito mais amplo: o anonimato se opondo a moda superdecorada dos últimos anos. A superexposição do indivíduo em redes sociais, em selfies, começam a inverter o atual comportamento social em busca de um anonimato, do invisível como característica positiva.

Como se sabe, moda não se resume a roupas e vive de ciclos, e o atual tem tudo a ver com o movimento em busca deste anonimato. É vontade de se parecer ou portar como comum depois de anos em busca de uma moda que exibisse a diferenciação como viés criativo. Não é à toa que nos desfiles que apresentam a proposta criativa da Chanel 2015 a mulher Chanel se apropria do cotidiano e faz coisas como ir ao mercado ou uma manifestação.

Chanel inverno 2015

Nos anos de 1990, o belga Martin Margiela fez do seu anonimato uma estratégia de identidade da marca, sem jamais mostrar seu rosto e conceder entrevistas, o estilista deixava suas roupas falarem por si mesmas. Na passarela as modelos sempre tinham o rosto coberto.

Margiela Verão 2009

A moda não descobriu sozinha as vantagens de ser invisível. Na música parte do fascínio do Daft Punk se deve ao fato de poucos saberem quem eles realmente são, pois sempre se apresentam com capacetes com designs inovadores e futuristas. Na última premiação do Emmy, a qual concorreram em diversas categorias, poucos perceberam a presença deles à paisana na plateia.

Nas artes visuais, o mesmo acontece com o Bunsky – pseudônimo de um dos artistas mais expoentes da atualidade, e também mais bem pagas que segue anônimo desde 1992.

O marketing do anonimato chegou à moda e cabe ao criador de moda perceber o mundo que vive e traduzir em peças que despertem desejo aos seus consumidores o novo desejo de ser invisível.

Por Kledir Salgado
Designer de moda com Mestrado em Têxtil e Moda pela USP