No comando da luxuosa Ralph Lauren, um CEO ‘fast-fashion’
Ralph Lauren e Stefan Larsson pareceriam formar uma dupla estranha. O patrimônio líquido de Lauren, estimado em US$ 6 bilhões, foi construído em cima de desenhos que fizerem os consumidores aspirarem ao luxo dos clubes de campo americanos. Larsson, embora igualmente elegante, fez seu nome no mercado para o grande público, após períodos bem-sucedidos na H&M e, mais recentemente, na Old Navy, da Gap.
A aliança com Ralph Lauren vai começar quando Larsson assumir o cargo de CEO, em novembro, e deverá trazer à empresa lições importantes do mercado de massas, permitindo a Lauren voltar a seu papel criativo.
Os feitos de Larsson na Gap e as expectativas depositadas em seu trabalho na Ralph Lauren ficaram nitidamente visíveis pela reação das ações das duas empresas ontem. Os papéis da Ralph Lauren eram negociados em alta de 12,9%, cotados a US$ 117,46, por volta do meio-dia, recuperando parte dos 44% que haviam perdido ao longo do ano, enquanto os da Gap recuavam 5,9%.
“Estou bem animado quanto a isso”, disse a analista Daniela Nedialkova, da Atlantic Equities, sobre a mudança de Larsson. “Ele traz exatamente o que a companhia precisa neste momento.”
Houve uma revolução no varejo de moda pelo mundo nos últimos anos, com os consumidores jovens optando cada vez mais pelas roupas do tipo ‘fast-fashion’, de redes como a H&M, Forever 21 e Zara, da Inditex, em vez de marcas mais serenas como a Gap e a J Crew. As empresas da moda rápida copiam os visuais das passarelas e costumam usar redes de fornecimento.
“A Ralph Lauren não pode ficar copiando outras pessoas, é uma marca que é copiada”, diz Michelle Grant, diretora global de análises sobre o mercado de varejo na Euromonitor. “[Trata-se] de quanto dessas habilidades podem ser aplicadas sem degradar a marca.”
Os três anos de Larsson na Old Navy transformaram a marca, que deixou de ser um peso no pescoço da Gap para virar sua estrela, enquanto a própria marca Gap enfrentava dificuldades. No exercício fiscal de 2014, a Old Navy teve vendas de US$ 6,6 bilhões, superando a marca Gap pela primeira vez em quatro anos. Analistas creditam isso, em parte, à preocupação de Larsson com a velocidade em levar seus produtos ao mercado. Quanto mais tempo o produto leva para sair da fase dos esboços e chegar às lojas ou site, maior é a vulnerabilidade às mudanças da economia e do gosto do consumidor.
Essa demora pode ter um efeito prejudicial sobre os estoques e as margens de lucro. O lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) da Ralph Lauren caiu de 20% da receita no ano fiscal de 2013 para uma porcentagem estimada em 15,5% no de 2016.
A empresa já vem investindo para melhorar sua rede de abastecimento e sua estrutura de tecnologia de forma a reduzir quanto demora em levar seus desenhos ao mercado, tempo que um analista disse ser maior do que a média do mercado.
“A velocidade em chegar ao mercado é crucial e é nisso que os sujeitos da ‘fast fashion’ são realmente bons”, disse Nedialkova. “Se a Ralph Lauren puder ser um pouco mais rápida e flexível, seria ótimo para as margens e para a receita”.
Larsson chega à Ralph Lauren em meio à queda do lucro e das vendas e a mudanças para simplificar sua estrutura na forma de seis marcas mundiais – Polo, Luxury, Home, Club Monaco, Lauren e Denin & Supply – enquanto se expande no exterior e corta custos anuais de US$ 100 milhões.
As vendas da Ralph Lauren caíram 5,4% no trimestre até junho, enquanto o lucro mergulhou 60%, para US$ 64 milhões. A queda em parte se deve à reestruturação, mas também reflete a decisão de evitar descontos, ao contrário de algumas rivais do setor de luxo, segundo Grant, da Euromonitor.
A Ralph Lauren busca expandir as vendas nos mercados internacionais e os novos colegas de Larsson vão torcer para que ele consiga replicar seu sucesso na H&M, onde passou 15 anos. Como chefe de vendas mundiais, ele foi fundamental na expansão da empresa sueca que a transformou em uma potência de US$ 17 bilhões com presença em 44 países.
Analistas acreditam que o ideal para a Ralph Lauren seria ter cada uma de suas três principais regiões, Estados Unidos, Europa e Ásia, contribuindo com cerca de 30% das vendas. Atualmente, a Europa representa 20% e a Ásia, apenas 12%. O grupo vem remodelando as operações na China desde que assumiu seu controle direto em 2010, por estar insatisfeita com a forma como sua licenciada vinha lidando com a marca.
Embora a Ralph Lauren seja vista de forma predominante como uma marca de luxo, suas camisas Polo oferecem uma forma mais acessível de entrada à empresa. Além disso, a Ralph Lauren tem mais lojas de desconto do que lojas comuns de varejo.
Analistas do Barclays disseram sentir-se encorajados com a experiência de Larsson em “moda feminina no segmento mais acessível, no qual a Ralph Lauren tenta expandir as operações para complementar sua alta concentração em moda masculina”.
Ainda assim, nem todos estão contentes com a nova aliança Lauren-Larsson. Robin Lewis, autor do boletim informativo “Robin Report”, sobre estratégias de varejo, alertou para o risco de Larsson afastar a empresa do luxo – ou mesmo da moda de preço mais acessível – e levá-la rumo ao grande público. “Larsson vai simplesmente levar a marca para mais perto da ladeira escorregadia que é concorrer no mundo das commodities em que o mercado de roupas está se transformando. Tchau, tchau Ralph”, disse.
A maioria dos analistas acha difícil ver isso acontecer enquanto Lauren, que construiu a empresa com base nos sonhos do lazer de luxo americano, estiver no controle final do lado criativo.
E Larsson não é o primeiro executivo a passar do mercado do grande público para o de luxo nos últimos anos, embora não tenham sido muitos. Grita Loebsack deixou a Unilever para tornar-se CEO da divisão de artigos de couro e de luxo da Kering. A Chanel contratou Maureen Chiquet, da Banana Republic, da Gap, em 2003 e se tornou CEO da empresa em 2007. O diretor de finanças da Ralph Lauren era da Procter & Gamble.
O trabalho de Larsson vai ser monitorado por especialistas para ver quanta experiência do mercado de massas vai ser absorvida pelas operações básicas da empresa e quanto disso vai ficar de fora das passarelas
Fonte: Valor Econômico (por Financial Times).