Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Os receios de um abrandamento entre os compradores chineses têm perseguido a indústria do luxo durante a maior parte do ano. Na semana passada, a dimensão do problema foi sentida por uma das maiores e mais expostas marcas da moda, a Gucci.

Gucci - Outono-Inverno 2024/2025 - Womenswear - Itália - Milão - ©Launchmetrics/spotlight


O grupo francês Kering SA viu o seu valor de mercado perder 9 mil milhões de dólares depois de alertar que as vendas dos produtos da marca italiana na China caíram neste trimestre. A desaceleração também começa a manifestar-se noutros setores da indústria do luxo.

Um relatório separado mostrou que as exportações de relógios suíços para o país – um dos principais destinos de relógios de alta qualidade – caíram no mês passado. Os analistas, entretanto, preveem que a procura de luxo na China irá arrefecer ainda mais este ano.

A onda de notícias preocupantes fornece a mais recente evidência de que um aumento previsto nos gastos dos chineses abastados, libertados dos confinamentos mais rigorosos do mundo devido à Covid, não está a concretizar-se. Embora algumas empresas de luxo estejam a gerir melhor as consequências do que outras, as restantes poderão ser forçadas a repensar a forma como fazem negócios na China – a começar pela Kering.

“Há anos que não compro nenhuma bolsa Gucci”, lembrou Wu Xiaofang, uma banqueira de 34 anos que mora em Xangai e que já foi tão apaixonada pela marca que comprou três bolsas durante uma viagem a Itália em 2016. “O novos designs são maus.”

Wu faz parte de uma geração de compradores de luxo chineses que se tornou mais seletiva a propósito de onde e como gastar o seu dinheiro. O aumento do desemprego e a recessão no setor imobiliário prejudicaram a confiança dos consumidores, enquanto que as pressões deflacionistas estão a alimentar preocupações sobre o crescimento num dos maiores mercados de consumo do mundo.

A barreira para atrair os compradores chineses aumentou, portanto. A Gucci viu uma queda significativa nas vendas online chinesas nos últimos meses – inclusive no seu site oficial e na plataforma de comércio eletrónico Tmall, disse uma fonte familiarizada com a situação que pediu para não ser identificada por discutir assuntos confidenciais.

Sabato de Sarno, que se tornou diretor criativo da Gucci no ano passado, adotou uma estética mais minimalista do que os designs extravagantes do seu antecessor, Alessandro Michele. É muito cedo para dizer se a sua moda mais elegante e discreta irá agradar aos clientes chineses, uma vez que só recentemente estes itens apareceram nas lojas.

No entanto, alguns compradores podem considerá-los menos distintivos do que antes, disse o consultor de moda Mark Liu, e demasiado semelhantes em estilo a nomes como Valentino, Prada e Celine. A Kering disse que os primeiros produtos de pronto-a-vestir da última coleção Ancora assinada por De Sarno foram bem recebidos.

A Gucci é há muito tempo uma das mais voláteis das principais marcas de luxo, com a sua fortuna a subir e a cair com base no burburinho em torno de designers como Michele e do seu antecessor, Tom Ford. Isso torna a Kering altamente vulnerável a mudanças de gosto, especialmente porque a marca italiana é responsável por cerca de metade das suas vendas e mais de dois terços do lucro.

A Gucci “parecia ter-se transformado numa marca de streetwear por algum tempo, depois tentou voltar a ser uma marca sofisticada”, disse ainda Wu. “Agora não sei quem quer atingir”.

Ações em queda



A Kering surpreendeu os investidores ao anunciar, a 19 de março, que as vendas da Gucci caíram quase 20% neste trimestre, lideradas pela região Ásia-Pacífico. O preço das ações caiu mais em três décadas.

O grupo começou a tomar medidas para impulsionar a sua marca em dificuldades há dois anos, quando nomeou um novo diretor de moda para a Gucci na China e em Hong Kong. A Gucci separou-se então de Michele e contratou De Sarno, um designer menos conhecido da Valentino. De seguida, a Kering substituiu Marco Bizzarri, que dirigiu a Gucci durante cerca de oito anos, por Jean-François Palus, um antigo braço direito de Pinault.

Mais mudanças poderão ser necessárias para tranquilizar os investidores.

“Apesar da insistência da Kering de que Jean-François Palus é o CEO interino certo para a Gucci, o mercado não concorda”, escreveu Piral Dadhania, analista da RBC Capital Markets, numa nota na passada sexta-feira. “Com a deterioração do desempenho financeiro, o argumento para nomear uma nova figura de proa com um historial comprovado seria bem-vindo, na nossa opinião, pois pode permitir um ritmo mais rápido de mudança e novas ideias externas.”

A Kering não respondeu a um pedido de comentário.

A desaceleração na China também está a afetar marcas além da Gucci, embora não de forma tão dramática. Não obstante as principais marcas de luxo como a Rolex, Hermes, Chanel e Louis Vuitton terem registado um crescimento de dois dígitos em 2023 em Hong Kong – um destino popular para os compradores chineses – essas vendas desaceleraram já em outubro, disse uma fonte familiarizada com o assunto, pelo que os preços dos relógios premium caíram 40% em janeiro em relação ao ano anterior.

Poucos bens de luxo estão mais expostos às mudanças no sentimento do consumidor chinês do que os relógios suíços. As exportações para a China caíram 25% em fevereiro em relação ao ano anterior, informou a Federação da Indústria Relojoeira Suíça na semana passada, enquanto as remessas para Hong Kong caíram 19%.

Juntas, as exportações para esses dois destinos superam os EUA, o maior mercado único para relógios suíços.

“Há uma desaceleração”, frisou Nick Hayek, CEO do Swatch Group AG, cujas marcas incluem a Omega e Tissot. A China foi responsável por um terço das vendas da empresa em 2023.

Os compradores na China e em Hong Kong estão a visitar as lojas da marca Swatch Group, mas estão mais hesitantes em puxar o gatilho para uma compra importante, disse o CEO. “Têm o dinheiro, mas são mais críticos sobre quando e como gastá-lo.”

Representantes da Rolex e da Chanel não quiseram comentar, enquanto que a LVMH e a Hermès não responderam imediatamente aos pedidos de comentários.

Retardando o crescimento



Os males não se limitam à China. Depois de uma recente viagem de duas semanas à Ásia, os analistas de luxo do HSBC liderados por Erwan Rambourg afirmaram numa nota de sexta-feira que a situação da procura na China está “a revelar-se difícil”. Mas a desilusão também veio das tendências fracas em Hong Kong, Macau e Singapura, uma vez que os turistas chineses, embora venham em maior número, não parecem estar a gastar muito, escreveram.

Algumas marcas podem ser forçadas a encontrar formas de reduzir a sua dependência da China. Prevê-se que o crescimento das vendas de luxo neste ano desacelere para um dígito médio, em comparação com 12% em 2023, de acordo com um relatório da Bain & Co., uma empresa de consultoria. Mas esse crescimento será impulsionado por indivíduos com elevado património líquido ou com ativos investidos superiores a 10 milhões de yuans (1,4 milhões de dólares).

Algumas marcas de luxo contrariaram a tendência de desaceleração. A Prada SpA, proprietária da marca Miu Miu, viu as vendas no retalho aumentarem 32% na região Ásia-Pacífico, excluindo o Japão, no quarto trimestre. No início deste mês, Andrea Guerra, CEO do grupo italiano, disse estar satisfeito com as tendências de janeiro e fevereiro. A Hermès International SCA também registou taxas de crescimento de dois dígitos no quarto trimestre.

Em tempos de incerteza, os consumidores chineses tendem a preferir artigos de luxo com maior probabilidade de manter o seu valor ao longo do tempo, disse Bruno Lannes, coautor do relatório da Bain. É por isso que as marcas com esses produtos se saíram melhor do que aquelas que lançam produtos sazonais, afirmou.

A gigante norte-americana de cosméticos Estée Lauder Cos., proprietária de marcas como La Mer e Tom Ford, continua a apostar alto na China devido às suas perspetivas de crescimento a longo prazo e para evitar ceder terreno a empresas emergentes locais. A volatilidade acabará por diminuir à medida que a expansão da classe média chinesa continuar a aumentar o consumo per capita ao longo do tempo. “Essa tendência não está a mudar”, informou o CEO Fabrizio Freda numa conferência do UBS em Nova Iorque este mês.

Algumas marcas de luxo, no entanto, estão a reconsiderar a sua estratégia na Ásia para olhar para além da China em busca de crescimento futuro, disse Angelito Perez Tan Jr., cofundador e CEO do RTG Group Asia, que opera negócios que incluem uma consultoria de luxo. A Índia, o Sudeste Asiático e o Médio Oriente são vistos como tendo um grande potencial a longo prazo, destacou.

“Os executivos analisaram a questão de forma mais holística, em termos de que há mais na Ásia do que apenas a China”, disse ainda Tan. “As marcas de luxo em geral perceberam que algumas delas dependiam demasiado do consumidor chinês. Estes perceberam que não podem colocar mais todos os ovos na mesma cesta”.

"Copyright FashionNetwork.com com Bloomberg"

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