Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Conheça a história de Aweng Chuol, modelo que é capa da Vogue de junho/julho

Nascida em um campo de refugiados de guerra no Quênia, Aweng Chuol se mudou para a Austrália aos 12 anos e estreou nas passarelas em 2018 após ser descoberta enquanto trabalhava em uma rede de fast food em Sydney. Aqui, conheça mais sobre a trajetória da modelo de 24 anos, que é a estrela de junho/julho da Vogue Brasil.

Aweng Chuol na Capa da Vogue Brasil de junho/julho de 2023 Aweng Chuol na Capa da Vogue Brasil de junho/julho de 2023 Gabriela Schmidt/ Vogue Brasil

Aweng Chuol estava arrumando as malas para embarcar para Nova York quando me recebeu na suíte do hotel Unique, em São Paulo. Era um fim de tarde de maio, a temperatura começava a cair na capital paulista e a modelo australiana vestia legging, moletom e um rabo de cavalo que segurava as longas tranças feitas para o shoot. Sorridente, me recebeu efusiva enquanto terminava uma conversa por mensagens de texto no celular. Aweng tem uma energia contagiante, a fala rápida e uma destreza com o telefone celular bem típicos da geração Z. À medida que a conversa avançou, a menina sorridente que estrela campanhas de grandes marcas mundo afora foi deixando transparecer uma sabedoria rara para os seus 24 anos. “Tive que desenvolver meu conhecimento por um instinto de sobrevivência”, disse a australiana, que nasceu em um campo de refugiados de guerra no Quênia.

Sua estreia nas passarelas internacionais aconteceu em 2018, duas semanas depois de ser descoberta por um olheiro em Sydney, na Austrália. “Eu trabalhava no McDonald’s e uma mulher perguntou se eu queria ser modelo. Em um primeiro momento, nem ouvi o que ela disse e perguntei qual era o sanduíche, mas ela insistiu”, conta. Duas semanas depois, Aweng desembarcou em Paris com 300 euros na conta para desfilar a coleção de outono/inverno da Vetements. “O começo é muito difícil, é importante você encontrar a sua turma”, diz a modelo. Aweng atribui parte do seu sucesso às boas conexões que estabeleceu nesse início, sendo a principal delas com a stylist nova-iorquina Haley Wollens, que atua em campanhas para Diesel e Mugler. “Alguns dos meus maiores trabalhos são assinados por essa mulher incrível”, diz Aweng. “Nos tornamos amigas.” Nestes seis anos, a australiana desfilou para a própria Mugler, Savage x Fenty e para a Burberry, estrelou campanhas para Balmain, Farfetch, H&M, fez vídeos para Dior; e foi capa das Vogues tcheca, tailandesa e britânica. Na beleza, modelou para M.A.C. Cosmetics. Também participou do álbum visual Black Is King, de Beyoncé, em 2020. Hoje, está entre as 50 modelos mais importantes do mundo segundo o Models.com. “Vejo minha carreira como arte. Sou eu, o fotógrafo e o stylist que transformamos um moodboard em algo real. A maneira como me posiciono, minha energia, tudo influencia o resultado final. Boas modelos são artista

Aweng Chuol na Capa da Vogue Brasil de Junho 2023 — Foto: Gabriela Schmidt/ Vogue Brasil

Aweng Chuol na Capa da Vogue Brasil de Junho 2023 — Foto: Gabriela Schmidt/ Vogue Brasil

Baseada em Londres, Aweng faz parte de um seleto clube de fashionistas que vive na capital britânica. “Fiz muitos amigos na indústria. Aliás, faço amigos em todos os lugares. Sempre puxo assunto com estranhos.” Fã da noite, elenca stylists, editores e fotógrafos como parte de sua turma. Diz que seu restaurante preferido é o The Twenty Two, em Mayfair, que também é um clube privativo frequentado por Edward EnninfulNaomi Campbell e Mert & Markus. Ainda estão no topo da sua lista o Duck and Waffles, em Spitalfields, e o Chiltern Firehouse, também em Mayfair, para tomar drinques. Aos risos, Aweng define seu estilo como “rica-elegante”. Durante o dia, veste-se confortavelmente, mas, à noite, investe em produções glamorosas. “Gosto de me sentir outra pessoa, de exaltar minha sensualidade, de vestidos que deixam o colo à mostra e adoro diamantes, nossos melhores amigos. Rihanna é meu maior ícone”, diz. Embora a maior parte dos seus trabalhos aconteça em Londres e Nova York, Aweng diz que passa a maior parte do tempo em aviões. “Moro em um Boeing 737”, brinca. “Gosto de viajar e de ser nômade”, completa ela, que tem um apartamento em Hammersmith, no oeste de Londres, onde guarda seus livros e revistas. “Antes de ser modelo, eu estudava Direito. Queria ser diplomata para viajar o mundo ou ser chefe das Nações Unidas. Sonhar alto nunca é demais.”

“Antes de ser modelo, eu estudava Direito. Queria ser diplomata para viajar o mundo ou ser chefe das Nações Unidas. Sonhar alto nunca é demais.”
— Aweng Chuol

O interesse pela ONU não é gratuito. Aweng nasceu em um campo de refugiados no Quênia, o Kakuma, que abriga milhares de refugiados de conflitos no nordeste africano. “Minha mãe nasceu no Sudão e perdeu os pais muito cedo por causa da guerra”, diz. Ela se refere à Segunda Guerra Civil Sudanesa, um conflito religioso entre o Sudão e o Sudão do Sul, que culminou na morte de 2 milhões de pessoas entre 1983 e 2005 e no deslocamento forçado de outros 4 milhões. “No caminho para o Quênia, quando tinha 14 anos, minha mãe conheceu meu pai, que tinha sido uma criança soldado. Quando chegaram em Kakuma, estava grávida de mim. Eu e outros três irmãos nascemos lá”, conta. Apesar do contexto de guerra, Aweng diz que carrega lembranças felizes da sua primeira infância. “A guerra estava lá, mas as crianças não sabiam de tudo e o campo em si era um lugar seguro. Eu passava o dia brincando, subindo em árvores. É dessas brincadeiras que trago as cicatrizes que tenho no rosto. Eu era uma criança muito desajeitada. Ainda sou uma adulta desajeitada”, diz. Entre as lembranças felizes, também estão as músicas dos Jackson 5, que tocavam na rádio do campo, e a sopa de quiabo com carne e cebola servida com arroz, um prato tradicional do região. “Eu era criança e não tinha a capacidade de pensar a respeito da situação que tenho hoje.” No campo de refugiados, seus pais reecontraram familiares, entre eles um casal de tios de sua mãe, que a ajudou a criar os filhos, a quem Aweng chama de avós. O avô era pastor da Igreja Católica e, graças a essas conexões, conseguiu refúgio para a família na Austrália. “Ele tirou umas 40 famílias da situação de guerra desta forma. A igreja patrocinava as viagens. Sou muito grata por isso.”

A ligação da família com a igreja também fez com que Aweng crescesse entre cantos, orações e sempre com a presença da Bíblia. “Mas não me tornei uma pessoa religiosa. Encontrei meu próprio caminho para lidar com a espiritualidade. Entendi que nossa energia nunca morre. E isso é ciência básica: energia não morre. Com essa consciência, me conectei ao meu poder e aprendi coisas de diferentes religiões e estou tentando ficar mais calma, paciente e disciplinada a cada dia.” Entre seus estudos, Aweng diz que se debruçou recentemente sobre temas como numerologia, alquimia e a história de religiões como o budismo, hinduismo. Não deixa de lado, no entanto, os artigos científicos. “Adoro ler sobre ciência, especialmente quando há alguma ligação entre espiritualidade e o cérebro. Sou uma nerd”, diz, aos risos. Nesses mergulhos, descobriu o poder da meditação, que pratica todos os dias, durante pelo menos uma hora. “Se fico ansiosa, gosto de pensar sobre a questão muito profundamente. Quando recebi o convite para ser capa da Vogue Brasil, por exemplo, meditei sobre isso para poder me sentir pronta para este trabalho.”



Ainda sobre a influência dos preceitos religiosos em sua vida, Aweng diz que eles foram um ponto de conflito com a comunidade quando decidiu tornar público seu relacionamento com uma mulher, a nail artist Alexus Chuol. “Falar sobre esse assunto com a minha família sempre pareceu muito assustador. Quando me perguntam sobre isso, digo para as pessoas não se assumirem se não estiverem em um ambiente seguro. Ninguém pode julgar uma pessoa LGBTQIAPN+ que não quer tornar sua vida pública por isso. Ninguém sabe o que a pessoa está vivendo”, afirma. “Também falo para escolherem a própria felicidade, sempre. Você não pode estar errado se escolhe a própria felicidade e a própria paz.”

Aweng diz que nunca fez um anúncio formal da sua homossexualidade para a família. “Tive um namoro longo com uma menina antes de me casar e soube que nunca seria passageiro. Mas acredito que minha família achava que era uma fase, que eu era muito nova, que ia passar. Até que me casei.” A cerimônia aconteceu em 2020, no City Hall, em Nova York, e o relacionamento chegou ao fim no ano passado. “Naquele momento, sinto que a minha família pensou: ‘O que podemos fazer agora? Ela já está casada’. E eu pago as minhas contas. Não há o que dizer. Mas ouvi coisas muito doloridas da comunidade, que é mais religiosa. Não me afetou muito, mas acho que eles foram maldosos.” Hoje, Aweng diz que não tem nenhum conflito em relação à sua sexualidade. “Todo mundo devia gostar de mulheres. Elas se tornam mães, são bonitas, pacientes. Sou feliz por gostar de mulheres, é muito profundo.”

Em paralelo ao seu trabalho na moda, Aweng é uma ativista pela saúde mental e procura jogar luz sobre a situação de crianças em zonas de guerra. Apoia organizações como a Unstoppable Foundation, que apoia a educação no nordeste da África e outra que combate o recrutamento de crianças como soldados. “Toda infância deveria ser segura. As crianças deveriam estar todas bem.”

Aweng foi a primeira mulher da sua família a entrar na faculdade de Direito, uma formação até então exclusiva aos oito dos seus tios homens. “Quando eu tinha 16 anos, falei para um deles que faria esse curso. Ele riu e disse que eu não conseguiria. Respondi: ‘Ah, vou sim! Dois anos depois, entrei. Quando parar de modelar, pretendo terminar o curso.” Aweng também tem aulas de atuação em Londres porque acredita que as técnicas ajudam no trabalho como modelo, mas também porque vislumbra no teatro e no cinema uma nova possibilidade de carreira. “Sempre sonhei alto. Cresci em uma sociedade onde a regra é matar ou morrer. Sei que sou uma artista.”

https://vogue.globo.com/moda/noticia/2023/06/conheca-a-historia-de-...

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