Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Costanza Pascolato reflete sobre o retorno do fetichismo e do sexy às passarelas

A couture da Valentino e da Jean Paul Gualtier e o retorno às passarelas da Mugler, ícone do fetiche fashion, fazem a moda transbordar ousadias sexy e exibicionistas.

Pierpaolo Piccioli inseriu recortes ousados na alta-costura 2023 da Valentino. Haider Ackermann uniu o fetichismo à alfaiataria na Jean Paul Gaultier. Já Casey Cadwallader resgatou a silhueta fetichista dos arquivos da Mugler — Foto: Launchmetrics Spotlight

Pierpaolo Piccioli inseriu recortes ousados na alta-costura 2023 da Valentino. Haider Ackermann uniu o fetichismo à alfaiataria na Jean Paul Gaultier. Já Casey Cadwallader resgatou a silhueta fetichista dos arquivos da Mugler — Foto: Launchmetrics Spotlight

Que ultimamente a moda anda mais sexy e sexual não é nenhuma novidade. Lingeries aparentes, silhuetas esguias e recortes que ampliam decotes e aberturas sobre o corpo se tornaram corriqueiros. A pandemia teve grande contribuição nesta movimentação, embaçando fronteiras entre roupas usadas na intimidade e as que são vestidas nas ruas – sem falar no “transbordamento” da necessidade de fazer-se ultracativante para ser, com sucesso, “mídia-sociável”. Com o lockdown e a interação digital, estrelas do showbiz logo apareceram fartamente estimulando a criação de visuais cada vez mais afoitos. E desde que Kim Kardashian surgiu coberta de preto da cabeça aos pés no macacão da Balenciaga no Baile do Met em Nova York, em setembro de 2021, o fetichismo tem invadido guarda-roupas cada vez mais cotidianos.

Fetiche, o nome, tem origem na palavra “feitiço”, que os portugueses inventaram em 1482 a partir do latim facticius, que quer dizer artificial, não natural, e sempre esteve associada à luxúria, à libertinagem. Agora, alguns dos mais notáveis criadores da moda de luxo e até da alta-costura escolheram explorar esta face mais obscura do estilo. O fetichismo é uma voga que aparece de tempos em tempos e se reconecta, consciente ou inconscientemente, com os fantasmas de cada um, revisitando estéticas antes consideradas tabu. E, por incrível que pareça, é impossível falar em moda sem citar o fetichismo porque existem, sim, conexões entre estes dois universos. Ambos fazem apelo ao que há de mais secreto e primário, que é desejo de sedução, refinamento e relevância.

A moda e o fetichismo também podem ser sinal de pertencimento a um determinado grupo, de integração numa sociedade, ou um meio de expressão de rebeldia ou desafio aos valores e ideias em vigor. Historicamente, o vocabulário fetichista se organiza a partir dos anos 1900. Na época, as revistas de moda em Paris reagiam contra a concepção burguesa da “mulher-troféu-passiva” que dominou o período pós-industrial. Orientavam as senhoras com dicas para agradar seus maridos. Assim, a lingerie foi a arma escolhida, com o papel definitivo concedido aos espartilhos e anáguas. O corpo então, todo coberto, mas esculpido em forma de S, nunca havia sido tão dominado e ao mesmo tempo erotizado. Mas foi só em 1974 que o guarda-roupa mais hardcore se infiltrou oficialmente na moda. Naquele ano, Vivienne Westwood e Malcolm McLaren abriram a butique Sex em Londres, onde todo o glossário fetichista inspirado nos figurinos BDSM podia ser encontrado. Mais tarde, designers como Thierry Mugler e Azzedine Alaïa marcaram época conferindo ao fetichismo fashion nobreza, glamour e até humor, como Jean Paul Gaultier e seu sutiã de cones para Madonna.

Haider Ackermann para Jean Paul Gaultier — Foto: Launchmetrics Spotlight

Haider Ackermann para Jean Paul Gaultier — Foto: Launchmetrics Spotlight

Agora, com sua necessidade de mudança e renovação contínuas, a moda de luxo se volta para a sedução fetichista, antes restrita a subculturas. Até a Valentino, com Pierpaolo Piccioli, inseriu recortes mega ousados e inovadores na impecabilidade de sua alta-costura para o verão 2023, com uma enorme variedade de exposições estratégicas do corpo.

Em manifestação refinada, Haider Ackermann mostrou sua estupenda alfaiataria, interpretando, como convidado, a coleção couture de Jean Paul Gaultier, um dos protagonistas do fetichismo nos anos 1980 e 1990. As versões de Ackermann e suas linhas puras trouxeram graça e respeitável individualismo ao que é excêntrico e atrevido.

O momento fashion-fetichista com a cara mais contemporânea, no entanto, veio com o retorno de Mugler às passarelas para o prêt-à -porter inverno 2022 – em formato see now, buy now – pelas mãos do diretor criativo Casey Cadwallader. A apresentação foi logo depois do fim da semana couture, em janeiro, num amplo espaço do Parc de la Villette, em Paris, com show único, integrando todas as características do exibicionismo. Roupas com recortes mais que reveladores e formas esculturais que pareciam ter saído diretamente dos arquivos de Thierry Mugler vestiam as modelos. Depois de desfilarem, elas davam voltas em plataformas rolantes cercadas por câmeras. As imagens, transmitidas numa tela de TV gigante e em filmes disponibilizados ao público, fundiam o digital e a vida real e viralizaram logo em seguida. O que era bizarro hoje é sexy. E, atualmente, mulher sexy é mulher poderosa.

Dominique Jackson para Mugler — Foto: Launchmetrics Spotlight

Dominique Jackson para Mugler — Foto: Launchmetrics Spotlight

Por Costanza Pascolato

https://vogue.globo.com/colunas/costanza-pascolato/coluna/2023/04/c...

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