Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

PARA ABRIR O CAPITAL, A CEDRO FOI A EMPRESA MAIS RÁPIDA DO BRASIL. JÁ, PARA ELEGER UM PRESIDENTE QUE NÃO FOSSE DA FAMÍLIA DOS FUNDADORES, LEVOU 142 ANOS

cara nova (Foto: Luiz Maximiano)

Quando a Cedro Cachoeira, uma fábrica de tecidos, inaugurou o mercado privado de capitais no Brasil, em 1872, ainda havia trabalho escravo no país, faltavam quatro anos para Graham Bell inventar o telefone e mais sete anos para que a lâmpada elétrica fosse criada por Thomas Edison.

Assim, a tradição de 142 anos de vida é o grande bônus da empresa, com sede em Belo Horizonte. Mas é o seu ônus também. Não é tarefa simples gerir uma companhia em que as novas gerações dos fundadores — os irmãos Bernardo, Antônio e Cândido Mascarenhas — formam uma legião de 241 herdeiros acionistas, pertencentes a sete ramos da família, cujos interesses e divergências não raro vão além do escritório.

Hoje, contudo, a Cedro deu uma guinada no quesito gestão. O maior sinal dessa mudança foi emitido no início deste ano, com a escolha do novo CEO, o paulistano Marco Antônio Branquinho Júnior, de 41 anos. Ele está na companhia há uma década, os últimos nove anos na área de recursos humanos (RH). Em janeiro, após vencer uma disputa com cinco herdeiros, assumiu o comando da fabricante de tecidos. “Era tido como líquido e certo que ele não teria a menor chance de se tornar presidente”, diz Herbert Steinberg, sócio da Mesa Corporate Governance, responsável por conduzir a sucessão. “Ninguém acreditava na indicação de uma pessoa de fora da família.”

Mas deu zebra. Ou, melhor, deu profissionalização. O processo de sucessão começou informalmente em 2006. À época, o presidente da companhia, Aguinaldo Diniz Filho, mexeu em algumas peças da diretoria, mas sem alarde. Com um grupo de seis subordinados diretos, delegou funções que antes cabiam ao CEO. A compra de algodão, por exemplo, passou às mãos do diretor industrial. Branquinho foi promovido de gerente para diretor de RH e passou a conduzir treinamentos e projetos antes tocados pelo chefe.

Sucessão (Foto: Luiz Maximiano)

 

Até a cantora Clara Nunes faz parte da história da Cedro. Aos 14 anos, Clara Francisca Gonçalves trabalhou ali como tecelã

 

Com a chegada de Steinberg, em 2011, o processo sucessório se formalizou. Nos primeiros meses, o consultor avaliou os seis diretores, todos pré-candidatos, para escolher os três finalistas: dois membros da família e Branquinho. Ele focou os testes em três questões básicas: a capacidade técnica, a habilidade interpessoal e a maneira de transitar entre as centenas de herdeiros.

Um ano e meio depois,  o consultor reuniu os três potenciais presidentes para falar sobre a etapa final da disputa. O trio faria apresentações individuais ao conselho. Cada um falaria sobre um plano de ação para os anos seguintes. A principal orientação de Steinberg foi para que nenhum deles utilizasse ferramentas de apoio durante a exposição, como o Power Point. Branquinho ficou quieto. E, na hora H, fez o oposto. Ancorou sua explanação em slides. “Se eu tivesse alguma dúvida da escolha, ali não teria mais”, diz Steinberg. “Ele não seguiu a minha orientação, mas um presidente precisa ter ideias próprias.”

O consultor teve de sustentar a decisão diante de inúmeras perguntas do conselho, que demonstrava estranhamento com o resultado. Branquinho parece o único que não se surpreendeu com a notícia. “Eu sabia que, se estava concorrendo,  tinha condições de ser escolhido.” A favor do executivo também contou o seu temperamento tranquilo e sério, um sinal da capacidade de lidar com divergências da família proprietária sem se alterar. Branquinho sorri com discrição, fala baixo e, claramente, pensa antes de se manifestar. Mas reconhece: “A Cedro tem um potencial de conflito gigantesco, o tempo todo”.

História viva (Foto: Luiz Maximiano)

Blindar a companhia contra brigas familiares também é tarefa de um comitê de acionistas, formado em 1988. Ele controla 60% das ações da empresa. Uma das regras definidas pelo grupo determina que os papéis, quando negociados por um membro da família, devem ser oferecidos primeiro aos parentes e só depois ao mercado. Essa norma funciona como um para-raios contra eventuais compradores. Em 2012, por exemplo, havia rumores de que Josué Gomes, CEO da Coteminas e filho do ex-vice-presidente José Alencar, teria interesse em comprar a empresa. Ele já detém 30% das ações da Cedro. A aquisição, contudo, não se concretizou.

Outra regra do comitê define que os votos no conselho sejam unitários. Ou seja, os acionistas precisam entrar em consenso antes de opinar. “A gente briga antes de chegar à assembleia, mas na hora de falar estamos de acordo”, diz Amélia Gonzaga, herdeira e presidente do comitê. Esse estilo de liderar em colegiado é uma marca da Cedro. Ali, tudo é debatido em tom cordial, sem pressa nas conclusões. “É um parlamentarismo”, afirma Steinberg. “Eles têm um tempo próprio de fazer as coisas. Não adotam uma postura arrogante, leviana e de curto prazo. Ser assertivo nas reuniões é quase falta de educação.”

Sucessão (Foto: Reprodução)

Pior é encarar o setor
Administrar questões internas, porém, é somente parte da missão de Branquinho — e, talvez, a mais simples. O setor têxtil vive uma crise aguda no Brasil. Em 2013, fechou com um déficit recorde, como tem ocorrido nos últimos oito anos. A produção de vestuário atingiu um índice negativo (-2,43%). Mas, levando-se em conta esse cenário, até que a Cedro foi bem: cresceu 181% em seis anos. Hoje, conta com 3,7 mil funcionários e é a quarta maior empresa do segmento em faturamento. Faz parte de um mercado formado basicamente
por cinco grandes companhias e milhares de pequenas — as maiores são a Coteminas e a Vicunha. O problema é que o faturamento não se traduz em lucro. E só não está pior graças a incentivos oficiais, como a redução no ICMS, em 2010, e a desoneração da folha de pagamento, iniciada em 2011.

A crise é resultado, principalmente, de três fatores. Um deles é o aumento do preço dos insumos – como o algodão, a mão de obra e a energia. O outro é a concorrência de produtos asiáticos, notadamente os chineses. Em 2010, a fiscalização das condições de trabalho nas confecções também foi reforçada. Muitas delas fecharam as portas. As que sobreviveram ficaram à mercê dos varejistas, que pressionaram os preços para baixo. Esse cenário afetou fortemente os fabricantes de tecidos.

Parceria para inovar
Branquinho tem um plano ambicioso para dar novo fôlego à Cedro. A ideia é chegar a 2017 com faturamento de R$ 1 bilhão (em 2013, a receita foi de R$ 533 milhões até setembro). Mais ainda: a companhia quer aumentar a rentabilidade do negócio. Para isso, vai mudar a composição dos produtos. Até 2013, perto de 70% dos jeans vendidos eram básicos — leia-se limitados. Eles permitem a confecção de cerca de cinco modelos de roupas. Apenas 30% eram considerados “top jeans”, que podem render perto de 15 modelos. Hoje, essa relação mudou. Está em 50%. Em 2015, passará para 30% de básicos e 70% de tops. Ou seja, vai se inverter.

A Cedro também investe em parceria com indústrias químicas, como a Rhodia. O objetivo é criar tecidos tecnológicos, de alta rentabilidade. Alguns deles já fazem parte do catálogo da companhia. É o caso de um uniforme que atenua o efeito do fogo. É indicado, por exemplo, para eletricistas. Outro produto, antimicrobiano, é usado por profissionais de saúde.

tudo em uma A Cedro aumentou a produtividade ao concentrar a produção de fios, antes dispersa em várias unidades, nessa fábrica em Pirapora (MG). Agora, busca aumentar a rentabilidade (Foto: Luiz Maximiano)
a guardiã Amélia Gonzaga, a dona Amélia, preside o comitê dos acionistas, criado para preservar as ações da empresa nas mãos dos herdeiros dos fundadores (Foto: Luiz Maximiano)

Força nas ações
O caminho escolhido por Branquinho, segundo analistas, é promissor. Com as parcerias, a empresa mineira investe em um nicho pouco explorado pelas indústrias brasileiras. “Hoje, boa parte dos tecidos tecnológicos é importada”, diz José Luiz Cunha, diretor-executivo da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX). “E esse é um mercado que permanece aberto no Brasil.”

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Rafael Cervone, observa que a indústria têxtil nacional também pode se beneficiar da chegada ao Brasil de redes internacionais de varejo de moda, como a GAP. “Alguns desses varejistas não têm grandes fornecedores em seus países de origem”, afirma Cervone. “Esta pode ser uma boa oportunidade para as empresas brasileiras.”

Há otimismo, ainda, na bolsa. Hoje, as ações da Cedro têm baixa liquidez. Mas o economista Edgar de Sá, da corretora HPN Invest, acredita que isso pode mudar neste ano. “Com o esperado aumento do dólar, as importações no setor têxtil tendem a diminuir”, diz o consultor. “Isto vai favorecer os produtores nacionais.” Assim, é possível que a Cedro torne mais expressiva sua presença no mercado de capitais. Um mercado, aliás, que ela inaugurou.

Sucessão (Foto: Reprodução)

 

 

 

As primeiras “acções” da Cedro estão expostas no museu do tecido, junto com livros de contabilidade escritos à mão

14/06/2014 10h09 - POR ARIANE ABDALLAH. FOTOS LUIZ MAXIMIANO

http://epocanegocios.globo.com/

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Fiz parte desta empresa com muito orgulho durante 23 anos.

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