Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Genderless

(Esta reportagem sobre moda sem gênero é uma continuação. Confira aqui a primeira parte, em que explicamos o conceito de gend...)

Na desordem do armário embutido, as roupas de Renan Kyuchi Tuzino Kamia e Luís Gustavo Garcia se enlaçam. Não tem paletó ou vestido nessa história, mas tem paetê, flores e cores vivas em peças do vestuário que decoram corpos de todos os gêneros.

Renan e Gustavo namoram há três anos e perceberam que seus guarda-roupas se cruzavam, pois possuíam muitas peças iguais das redes de varejo, e que ambos miravam para looks muito parecidos.

Naquele momento, ainda havia no varejo um movimento muito expressivo que vestia famílias, casais, até mesmo pets e seus tutores, com peças ou estampas iguais. Renan e Gustavo chegaram a comprar tecidos e encomendar em costureiras peças idênticas. Eles até deram um apelido carinhoso para eles mesmos: casal breguinha. “Antes os olhares eram de espanto para essa onda de sair com roupas iguais. E isso para casais hétero, homoafetivos, para famílias inteiras ou só mães e filhas. Agora os olhares são mais graciosos”, conta Renan.

Independentemente dos olhares de aprovação ou não, eles ainda gostam e seguem a brincadeira das roupas pares, com uma diferença: a chance de vestirem a própria marca. Renan e Gustavo decidiram criar peças para que todos — ou todes, como enfatizam — possam participar dessa ideia. Com isso, aderiram à produção da moda sem gênero, ou genderless.

Renan e Gustavo genderless
Renan e Gustavo resolveram iniciar um negócio ao perceber que seus guarda-roupas eram parecidos / DIVULGAÇÃO

A criação

Os dois sócios na vida resolveram unir experiências e se tornaram parceiros também nos negócios. Administrador de empresas, Renan tem vivência de 10 anos em rede de bebidas e alimentação no varejo, inclusive tem uma loja de franquia de hot dog em Sorocaba, e Gustavo também tem o mesmo tempo de experiência dedicado ao trabalho em lojas de varejo, como C&A e Zara, entre outras.

Eles deram vida, então, à Two You, nome alusivo a algo dos dois para você — e você, no caso é você qualquer um mesmo, porque as peças vestem todos os corpos, de qualquer tamanho e idade. Gustavo, que tem curso de modelista, é responsável pelo processo criativo. A produção é exclusiva e eles desenham, fazem a modelagem, a piloto e a produção. Primam por tecidos de qualidade, como veludo e linho, e desenvolvem peças exclusivas com preços de fast fashion.

Eles lançaram um site e a loja virtual em setembro de 2019 e a primeira coleção foi chamada de A Lost in Japan. Inspirada em Tóquio, a coleção era formada por dez peças com variações de cores e aplicações. Para apresentar os 20 itens confeccionados com muito brilho, cerejeira e outras flores, eles tiveram uma ideia que resume a beleza do que propõem. “O desfile de lançamento foi feito por amigos, em duplas que, independentemente do gênero, vestiam as mesmas peças. Teve desfile de pai e filho, de casal hétero, de casal homoafetivo, de sogra e nora, de sócios que são um homem e uma mulher.”

Originalidade

Renan e Gustavo perceberam que as roupas se fundem ao modo de usar de cada cliente. A calça que um homem usa com tênis, uma mulher a veste com salto alto, e daí tudo bem porque fica legal. “O que mostra”, Renan enfatiza, “o quanto nosso trabalho é plural”.

A curadoria, que tem todo o cuidado com a eleição de tecidos e estampas, tem como objetivo proporcionar aos clientes uma satisfação que reside num detalhe. “As pessoas querem ser autênticas”.


Autenticidade: uma marca da moda genderless / DIVULGAÇÃO

Referências inspiradoras

É reflexo do tempo, mas, como tudo, a moda tem suas referências. Renan e Gustavo, por exemplo, bebem de fontes do passado recente e do presente. “Alguma coisa esbarra em Michael Jackson. Embora usasse ternos, roupas de cortes masculinos, o cantor usava muito brilho, paetê, aplicações. Tinha vestígios do que, na época, era considerado feminino.”

E quem bem explora essas peças tidas como femininas na atualidade é o cantor Harry Styles, que foi integrante da banda One Direction. Ele explodiu em sucesso e suas músicas estão entre as mais procuradas, mas Renan acredita que sua atitude, explicitada pelo seu visual, também é responsável pelo seu sucesso. “Ele usa muito tule, renda, acessórios femininos, mas sem perder a masculinidade.”


Michael Jackson e Harry Styles são duas referências do trabalho de Renan e Gustavo / REPRODUÇÃO

Livre, leve e solto

A identidade da roupa também é construção social. Quem diria que o kimono, que no oriente já foi usado por gueixas, e que no ocidente já foi usado por navegadores e exploradores, como Renan descobriu em pesquisas, ganha espaço na atualidade como peça versátil e moderna? Tanto que ela tem tudo para ser eleita a peça que dá identidade à marca dos sócios sorocabanos.

Renan admite que tem uma admiração específica pela peça que ele classifica de cosmopolita e de sensual, que na sua versão saiu com um tecido leve e estampa disfarçada de animal print. “Uma peça simples e agradável a pessoas que querem valorizar o corpo, mas que têm cuidado em se mostrar.” Ao mesmo tempo que existe um movimento para a aceitação do próprio corpo como quer que ele seja, enfatiza Renan, é legal ter algumas roupas que são, define, estratégicas. “São um refúgio, um paraíso, porque você usa e fica à vontade, livre e moderno.”

Depois dessa entrevista, aquele kimono que ganhei e nunca usei, vai sair para passear.

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