Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Por João Braga

 

 

Tudo começou em 1921, quando Guccio Gucci (1881-1953) retornou a Florença depois de uma temporada em Londres trabalhando no luxuoso Hotel Savoy. Então, como funcionário do setor de hotelaria, Guccio percebeu que viajantes endinheirados que lá se hospedavam no pós-Segunda Guerra Mundial usavam malas de viagem e valises muito sofisticadas feitas de materiais nobres e com acabamentos impecáveis.

Nessas circunstâncias e conhecendo a prática de ofícios artesanais de tradição familiar – seu pai fabricava chapéus de palha –, Guccio, na cidade cortada pelo Rio Arno, local onde já havia florescido o Renascimento cultural humanista clássico a partir do século 14 e então chamada Fiorenza, atual Firenze (Florença, em portuguesa língua), fundou sua empresa de artigos em couro destinados a um público refinado e que circulava ao redor do mundo.

Naquela bela e histórica cidade, cujo nome deriva das florações primaveris, a semente brotou, cresceu e deu muitas flores de variadas cores e diversos matizes, sem esquecer dos aromas exalados que atraem insetos, libélulas, borboletas e outros delicados seres que planam ao flabelar dos suaves ventos que trazem consigo pólens para germinar outras cores de extrema beleza e aromas de agradável olfato.

A poética natural associada à visão empresarial de Guccio Gucci proporcionou-lhe a experiência de fundação da casa que viria a ser um ícone da identidade cultural de moda e luxo italianos: Gucci.

Logo logo seus produtos já eram aceitos e consumidos por elitizada e exigente clientela italiana e internacional. Ainda nos anos 1930, antes da insurreição de um novo conflito bélico mundial, Guccio já tinha aberto filial em Roma, capital da Itália e antigo centro do mundo que herdara o título de “Cidade Eterna” e que tinha sido a primeira cidade do planeta a ter 1 milhão de habitantes há aproximadamente 2 mil anos atrás − afinal, “todos os caminhos levavam a Roma”. Parecia que o leite da loba que amamentara Rômulo e Remo também servia de seiva para o sucesso desta florentina flor estabelecida no Lácio. Não demorou muito para ir também a outras cidades italianas e para inúmeras outras cidades do planeta.

Comunismo, fascismo e nazismo aterrorizaram o mundo em novo conflito deflagrado entre 1939 e 1945. A Segunda Guerra Mundial ocorrida em solo europeu destruiu e matou, deixando um rastro de sofrimento e apuro, desestruturando a economia do Velho Continente. Não havia possibilidade de grandes elaborações e sofisticações em produções de diversas áreas, inclusive na moda. Racionamento foi a palavra de ordem na Europa dos anos 1940. Com o término da guerra, o continente precisava se reerguer e, devido à ausência de materiais tidos como mais nobres e sofisticados, Guccio Gucci resolveu lançar, em 1947,uma bolsa de couro de porco com alça de bambu importado do Japão, que veio a ser a famosíssima bolsa Bambu, que ao longo dos anos foi reeditada em diversos materiais e cores e, ainda hoje, é um desejo daquelas mulheres que prezam e querem um objeto de moda associado ao glamour, ao luxo e à sofisticação.

No decênio seguinte, entre 1952 e 1953, foi a vez da criação e lançamento de outro objeto que, futuramente, viria a ser peça do Metropolitan Museum of New York como identidade de design de moda do século 20: o sapato mocassim com bridões metálicos de inspiração equestre sobre o peito do pé. Chamados, em inglês, de loafers with horsebits, estes calçados sem cadarços, somente para enfiar os pés, tornaram-se outra identidade da Casa Gucci.

A década de 1960 trouxe um sopro de extrema sofisticação à empresa quando a princesa Grace Kelly, de Mônaco, em 1964, visitou a loja de Milão em Via Montenapoleone. Tamanha foi a satisfação da família Gucci que Rodolfo, um dos filhos de Guccio, pediu que fosse desenvolvido algo para celebrar a visita da princesa e também presenteá-la: eis que foi criada uma estampa para ser impressa sobre um lenço de seda, contendo nove buquês de flores das quatro estações do ano, além de delicados insetos voando entre cores e formas dando mais vida às flores quase reais para homenagear a realeza do principado. Batizada de Flora, essa estampa tornou-se outro ícone da Gucci, havendo posteriormente variações dos motivos florais e cores para os lenços da coleção Flora. Hoje em dia, essa mesma estampa é usada em tecidos para roupas e também para as bolsas femininas da casa.

Ainda nas bolsas, nos mesmos anos 1960, Jacqueline Kennedy, viúva do presidente norte-americano, já casada com o armador grego Aristóteles Onassis e que ficou conhecida como Jackie O., foi fotografada usando um modelo de bolsa da Gucci que, a partir de então, foi denominada de bolsa Jackie O. em sua homenagem.

Com todo o conceito de sofisticação desde sua origem, em 1921, acrescido de um percurso histórico com muito charme e incrementos de apurado design, a Casa Gucci construiu sua identidade e deu excelentes contribuições de novidades ao mundo da moda.

Inovando, investindo, passando por dificuldades, revitalizando-se e atualizando-se aos tempos, a Gucci é hoje uma casa que pertence ao universo do luxo internacional. Com produtos de moda feminina, masculina, roupas de gala, lenços, bolsas, malas, carteiras, calçados, perfumes, cintos, acessórios em geral e muito charme, a casa não abre mão de que toda a produção seja artesanal e, mais do que isso, tudo made in Italy, como forma de manter a tradição do artesanato italiano e realmente distinguir-se no mundo do luxo com artigos fatto a mano.

Entre maio e junho de 2014, o Shopping JK Iguatemi, de São Paulo, hospedou uma belíssima exposição da Gucci com 110 peças históricas e/ou contemporâneas, além de fotografias e vídeos contando a história da empresa. As peças aqui expostas vieram do acervo do Museo Gucci, fundado em Florença em 2011 para comemorar os 90 anos de fundação da casa. Oportunidade ímpar para deleites estéticos, muito charme e difusão dos sofisticados produtos da Gucci no Brasil.

As duas letras maiúsculas GG entrelaçadas (de Guccio Gucci), que são o logotipo da casa desde os anos 1960, envolveram o grande público de moda que ali apreciou a bela exposição que, pela primeira vez desde a fundação do Museo Gucci, deixou terras florentinas para aterrissar em São Paulo.

 

João Braga é estilista, escritor e professor de história da moda das faculdades Faap e Santa Marcelina e da Casa do Saber.

Foto: Fernando Silveira/Faap/Divulgação

http://www.costuraperfeita.com.br/edicao/27/materia/voce-sabia.html

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