Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Produtos importados estão no dia da dia dos pernambucanos, mas afetam posição de indústrias locais

Xinda Pung Li diz que “o povo daqui” adora as bolsas que ele vende até por R$ 5


Não é preciso andar muito pelo Centro do Recife para perceber que os produtos chineses invadiram de vez o nosso dia a dia. São eletrônicos, confecções, louças, guarda-chuvas, pneus, brinquedos… A lista de artigos Made in China ou PRC (People’s Republic of China) é enorme. E o comércio é apenas a ponta desse imenso iceberg. O avanço das importações da China tem provocado o fechamento de fábricas e a eliminação de postos de trabalho em todo o Brasil e essa ameaça fica cada vez mais iminente em Pernambuco.

Um levantamento da Comissão de Defesa da Indústria Brasileira (Cdib) revela que, nos últimos dez anos, várias indústrias fecharam suas portas por causa da invasão de produtos chineses. O estudo aponta, por exemplo, que das 40 fabricantes de escovas que atuavam no mercado há uma década, apenas duas continuam na ativa. No segmento de ímã de ferrite, das três empresas, sobrou apenas uma. Considera-se que a valorização do real frente a desvalorização da moeda chinesa, o yuan, gera uma concorrência desleal e predatória.

Em Pernambuco não há números sobre o fechamento de indústrias por causa da invasão chinesa. Mas sabe-se que os impactos existem. “A invasão dos produtos chineses na economia do Brasil e de Pernambuco é algo que nos preocupa muito. Existe uma diferença estúpida nos custos de produção, pois a China tem uma carga tributária e um custo de mão de obra muito menores, além de uma infraestrutura infinitamente melhor que a nossa”, diz Jorge Côrte Real, presidente da Federação das Indústrias de Pernambuco (Fiepe).

Côrte Real afirma que, para combater essa invasão, é necessário melhorar as condições de produção no Brasil. “Não queremos reserva de mercado, mas é preciso reduzir a carga tributária, diminuir o custo do trabalho e melhorar nossa infraestrutura. Também é preciso fazer uma fiscalização intensa nas fronteiras e verificar com mais cuidado a qualidade dos produtos chineses”, completa o presidente da Fiepe.

Para o coordenador do curso de administração do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), Eduardo Coutinho, a melhor maneira de enfrentar qualquer tipo de competição é o aumento da competitividade. Ele não gosta de falar em “invasão” de mercado, porque considera o comércio bilateral entre os dois países muito importante. “O que está ocorrendo é uma questão conjuntural. De repente o dólar se valoriza, como aliás já está ocorrendo, e como ficamos? Não podemos ficar aumentando ou reduzindo alíquota o tempo todo”, critica o professor.

IPI

Eduardo Coutinho se refere à medida adotada pelo governo brasileiro em meados de setembro, que aumentou o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de carros importados em 30 pontos porcentuais. A medida atingiu em cheio as marcas chinesas, como a JAC Motors.

“Empiricamente não temos dados concretos que mostrem o efeito das importações no emprego. E se o setor importador cresce, também absorve mão de obra”, pondera o professor. 

Têxtil é um dos mais atingidos 

O segmento industrial que mais sofre com a “invasão” chinesa, sem dúvida, é o de manufaturados, sobretudo produtos têxteis e confecções, que gera 1,2 milhão de empregos no país. Levantamento feito pelo Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI), a pedido da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), prevê que a parcela dos artigos importados no mercado brasileiro deve subir de 6%, em 2010, para 8,3% este ano. 

O presidente do Sindicato da Indústria do Vestuário de Pernambuco (Sindivest-PE), Adenízio Vasconcelos, ressalta que o impacto no Polo de Confecções do Agreste só não é maior porque o Brasil e Pernambuco vivem um bom momento econômico. Lá funcionam cerca de 20 mil empresas, gerando 150 mil empregos diretos. “Não abala nosso polo, mas dá sinais de preocupação. Começamos a perceber que há uma ação conjunta e ordenada para que os chineses se infiltrem no nosso polo”, revela.

Segundo ele, as empresas estão se cercando de cuidados para tentar neutralizar essa ação. Uma das frentes de combate é o investimento em qualificação profissional, principalmente no quesito design. Em tese, as confecções que trabalham com design próprio seriam menos afetadas pela “invasão” chinesa. “Qualidade hoje não é diferencial, é obrigação. Precisamos deixar de fazer roupa para fazer moda. Aquela ideia de que os produtos chineses não possuem qualidade não existe mais”, comenta o presidente do Sindivest-PE.

Adenízio lembra que essa questão não é um problema específico das empresas, pois envolve vários acordos internacionais entre o Brasil e a China. Ele destaca que há todo um ambiente que favorece o produto chinês – baixa carga tributária, mão de obra barata etc. – e que dessa forma fica cada vez mais difícil competir.

Outro problema é a entrada ilegal de produtos chineses no país. Uma das formas de driblar o pagamento de taxas antidumping é produzir na China e declarar que produz em Taiwan, na Indonésia ou no Vietnã. Isso tem ocorrido muito no setor de calçados, uma vez que os produtos chineses são sobretaxados em US$ 13,85 por par para equiparar os preços aos valores do mercado brasileiro. (M.B.) 

Mercadorias tomam conta de ruas do Centro 

Os produtos chineses penetraram a tal ponto no nosso dia a dia que até no conhecido e regional “vuco-vuco” do Centro do Recife é difícil encontrar uma loja que não comercialize mercadorias ching ling. A invasão é tamanha que nas tradicionais ruas Direita, das Calçadas, São José e Santa Rita  já tem mais vendedor chinês que pernambucano. 

De nome complicado, Yang Feng Di, sócio da loja Tao Tao, na Rua de Santa Rita, é um dos imigrantes de “olhinhos puxados” que resolveu se fixar por aqui. Com português enrolado, ele confessa que Pernambuco não foi sua primeira opção de lar fora da China, mas por causa da economia aquecida, o estado acabou sendo o principal foco dos empresários chineses no Nordeste brasileiro. “Na China não tem espaço para pequenos comerciantes e os pernambucanos são um bom público, porque gostam de comprar novidades, ainda mais com preços baixinhos, como os nossos”. O mesmo raciocínio foi seguido por Xinda Pung Li, conterrâneo e concorrente de Yang, que tem uma loja de bolsas na Rua de São José. “A gente vende bolsas diferentes, de todas as cores, formatos e preços, até por R$ 5. O povo daqui adora”.

A boa notícia é que, ao contrário do que possa parecer, a “invasão” ching ling de produtos e pessoas não afeta os comerciantes locais. De acordo com Roberto Castelo Branco, superintendente do Sebrae Pernambuco, vender produtos chineses é, na verdade, uma vantagem para os empresários locais. “Se você for nos Estados Unidos, vai voltar com sacolas cheias de made in China. A maioria das grandes redes norte-americanas compra de fábricas chinesas ou monta fábricas por lá. Os produtos têm qualidade e preço muito competitivo. O que prejudica o comércio são as falsificações e contrabandos”.

A comerciante Maria Auxiliadora Araújo, que trabalha há quase 10 anos na Rua de Santa Rita, é defensora entusiasmada das mercadorias asiáticas. “Se não fossem os chineses, o movimento do Centro teria acabado. É difícil competir com os shoppings. O que podemos oferecer são novidades e preços baixos e os da China são ‘ó’, deste tamanhinho”, afirmou. 

Outro que vê com bons olhos a entrada de mercadorias chinesas aqui é Oswaldo Ramos, coordenador das missões da Federação de Comércio de Pernambuco (Fecomercio). “Não só entendemos como algo positivo, como procuramos estimular as relações entre empresários pernambucanos e chineses. Nesta segunda-feira, estamos levando nossa segunda missão à China, com 80 comerciantes e industriais locais”. 

Lobby do governo e mão de obra barata 

Comércio de produtos chineses toma as ruas do tradicional vuco-vuco do Recife

 

 

Mas afinal, porque os produtos chineses são tão baratos e competitivos? Para o economista especializado em comércio internacional Olimpo Galvão, a resposta está na combinação de lobby do governo, enorme contingente de trabalhadores e mão de obra barata. “No final da década de 1970, houve uma grande reforma econômica no país e o governo resolveu abrir as portas para investimentos externos. Países como Estados Unidos, Inglaterra e outras nações desenvolvidas começaram a comprar peças e componetes na China, por preços bem abaixo do mercado”. 

O principal trunfo dos chineses sempre foi seus quase 1,3 bilhão de cidadãos sem direitos trabalhistas, o que barateia em quase cinco vezes os custos de produção (comparando com o Brasil). “A China é uma ditadura. Não existem sindicatos, nem greves. Os camponeses, que são quase 500 milhões, querem desesperadamente trabalhar nas cidades. As empresas se aproveitam disso e formam verdadeiros exércitos de robôs que trabalham 14 horas por dia, de maneira ordenara, ganhando menos de US$ 200 por mês”, detalhou Galvão. 

Essa exploração aumentou em 2001, quando a China oficializou sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC). Nesta época, outro fenômeno na economia global, conhecido como offshoring, se consolidou no país. “Este processo se difere da terceirização porque as grandes marcas começaram a montar e fabricar todo o produto na China e não mais partes do produto”. 

Alguns empresários chineses começaram a falsificar e contrabandear mercadorias com facilitação do governo, que não reconhece direitos autorais. É simples: o gerente de uma fábrica domina o processo e monta sua própria empresa reproduzindo, de maneira precária, o que aprendeu. Surgiram as reproduções, como tênis da “Mike”, e as falsificações. 

Grande parte destes produtos chega ao Brasil através do Paraguai. Para os comerciantes, a entrada destes produtos no estado pode ser vantajoso, pois eles pagam menos impostos e tributos, mas não há garantias para os consumidores. 

O outro lado do balcão 

O Centro Cultural Brasil-China estima que cerca de 2,5 mil chineses vivem hoje em Pernambuco. “Esse número pode ser um pouco maior, perto dos 3 mil, já que o último censo foi feito no final de 2009”, explica uma das coordenadoras da entidade, Vera Liu, lembrando que em 2000 havia apenas cerca de 500 chineses no estado. 

Vera Liu explica que o grande aumento no número de chineses em Pernambuco nos últimos anos se dá por vários fatores. “Os que chegam aqui dificilmente vieram diretamente de seu país de origem. A maioria já estava no Brasil, principalmente em São Paulo. Desta forma, Pernambuco se mostra como uma opção comercial mais vantajosa com um custo de vida mais barato e possibilidades maiores de lucro”, explica Vera. 

Os chineses estão mudando o formato de fazer negócios em algumas ruas do centro do Recife. Conhecidos por serem retraídos, além de a maioria não conseguir falar bem o português, muitos deles acabam se isolando dos brasileiros. “Não é que o chinês seja chato, mas é da natureza dele ser muito discreto. E o fato de não dominar a língua local dificulta a aproximação”, explica Vera Liu. 

“A dificuldade é clara pela complexidade da língua portuguesa, que diferente do mandarim, possui concordâncias e diversos tempos verbais, além da parte de fonética e ortográfica”, explica a professora da mandarim Chen Pi Yun. “Infelizmente, a maioria dos chineses chega ao Brasil sem falar o idioma e, com o trabalho, mal tem tempo para se dedicar ao estudo”, completa Chen.

Jane Zhang chegou ao Brasil há 20 anos e precisou aprender o português enquanto exercia sua atividade. “Foram os brasileiros que trabalhavam comigo que me ajudaram. Fui aprendendo a nova língua com o tempo, principalmente por escutar e memorizar”, completa Zhang, que atualmente trabalha em restaurante. 

Na prática, é comum encontrar comerciantes chineses conversando em mandarim enquanto estão juntos, algo que não agrada ao cliente brasileiro. “Entendo que eles não dominam o nosso idioma, mas acho falta de respeito. Não sabemos do que  falam e, além disso, às vezes fazemos perguntas simples e eles não sabem responder”, queixa-se a comerciante Debora Almeida. 

A realidade dos chineses no Recife é de trabalho e trabalho. “Geralmente somos os primeiros a chegar e os últimos a sair”, explica o comerciante Li Ping. Assim como ele, a jovem Emmy Huó passa o dia inteiro na pequena loja localizada em uma galeria na Rua das Calçadas. Emmy recebe o almoço em uma marmita e muitas vezes come atrás do balcão. Na sua maioria, os comerciantes chineses no centro do Recife se alimentam em intervalos durante as vendas.

Mas nem tudo é dificil nesse processo de adaptação. “Gosto muito do clima, que é melhor do que o do meu país”, explica a comerciante Chloe Huó. No caso da China, que tem diferentes climas, em função de sua extensa e complexa topografia, incluindo verões secos e invernos com neve, fica fácil entender o motivo de Chloe preferir o clima pernambucano.

 

Fonte: Diario de Pernambuco - Economia

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