Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Moda - Se a Europa Não Dita Mais as Regras, Vivas aos Brics!

Zegna: 'Comparado ao México, o Brasil é bem mais informal, mais casual; os mexicanos gostam do terno, da gravata'

A norma de pedir as perguntas por escrito, antes de qualquer entrevista, parece apenas uma formalidade quando o empresário Gildo Zegna começa a conversar. Assim que apoia o Blackberry na mesa, o CEO do Grupo Zegna deixa de lado qualquer roteiro. No final, é ele quem ultrapassa o tempo previamente combinado e segue com indagações. Quer notícias do Brasil. "Como anda o governo Dilma? Quais as perspectivas econômicas para os próximos meses? O que será da Daslu depois da morte de Eliana Tranchesi?" - pergunta. "A Daslu era algo impressionante", diz. "Nos anos 1990 não havia nada igual no mundo. Nem em Nova York."

Para esse homem de olhos azuis e cabelos penteados para trás, acompanhar a filosofia que move o mundo luxo é uma questão de sobrevivência. Diariamente ele vem sendo intimado a se adaptar a uma geopolítica na qual a Europa não dita mais as regras. Para manter a empresa, sabe que é preciso açular novos consumidores, cortejar mercados desconhecidos e adaptar a palavra elegância a quem pode comprá-la. Os chineses compõem hoje 40% do mercado da Ermenegildo Zegna, uma das mais tradicionais grifes de moda masculina italiana e a primeira marca de luxo a chegar lá.

O faturamento de € 1,1 bilhão em 2011, com crescimento de 21% com relação a 2009, está alicerçado nos Brics. É, em grande parte, para esses países que trabalham os 7 mil funcionários da empresa. Com a pretensão de vestir o homem contemporâneo, do mais conservador ao casual, a marca tem outras etiquetas como a Zegna Sport e a Z Zegna. Para clientes especiais mantém a Su Misura, um serviço de alfaiataria top de linha, onde é possível escolher cada detalhe e o preço de um terno nunca é inferior a € 3 mil. A marca mais recente do grupo é a feminina Agnona, para a qual eles fornecem apenas os tecidos.

A empresa que surgiu em 1910, em Trivero, na região do Piemonte, com a ambição de produzir os melhores tecidos do mundo, mais tarde passou a se dedicar ao vestuário. Com a venda de ternos, camisas, gravatas e sapatos fez seu nome em 90 países. No Brasil, tem uma loja no Rio, outra em Brasília e se prepara para abrir a quarta em São Paulo, no shopping Iguatemi JK. "Esse é nosso único plano no curto prazo para o país", disse Zegna, em conversa exclusiva com o Valor na recém-inaugurada loja da Via Condotti, em Roma.

Valor: Como manter uma empresa familiar, centenária, fora dos conglomerados de luxo?

Gildo Zegna: O que você quer dizer com fora?

Valor: Que continua nas mãos da família. Não é como Vuitton ou Gucci, por exemplo.

Zegna: Vejo isso de uma maneira um pouco diferente. Nós estamos dentro do mundo do luxo, voltados para a moda masculina. Creio que não faz diferença se somos parte de um grupo ou uma empresa familiar. Luxo é luxo, seja familiar, público ou privado - tanto faz se de um grande grupo italiano ou de um grande grupo francês. Para estar no luxo há requisitos fundamentais. Altíssima qualidade. Ser seletivo e ter atendimento top nas lojas. E, finalmente, ter sensibilidade e percepção para apostar e investir no design e em produtos novos. Isso é particularmente importante no Brasil e na China, países com público mais jovem, que têm muito interesse em novidades.

Valor: Os brasileiros preferem a moda mais casual?

Zegna: Sim. Certamente a temperatura tem algo a ver com isso. O problema do Brasil é que é o país onde nossos produtos são os mais caros do mundo. É uma lástima, porque, após o pagamento das tarifas alfandegárias e dos impostos, nossa roupa fica caríssima, o que limita seu consumo. E reduz também a venda de artigos mais caros. Muitos brasileiros compram nossa marca fora, mas gostaríamos que eles comprassem mais no Brasil. Outro desafio é o fato de não termos a mesma estação, o que complica na elaboração do mix de produtos nas lojas.

Valor: Como definiria o estilo brasileiro?

Zegna: Comparado com o México, o Brasil é bem mais informal, mais casual. É um pouco como a diferença entre a China e a Rússia. Os russos gostam de roupa mais informal; na China, são mais tradicionais. Os mexicanos também são mais formais que os brasileiros. Gostam do terno, da gravata.

Valor: A Zegna foi a primeira marca de luxo a chegar à China, numa época em que a economia era muito mais fechada. Que visão norteou essa aposta?

Zegna: Agora, completam-se 21 anos que estamos lá. Sabíamos apenas que era uma aposta que deveria ser feita: poderíamos nos dar bem ou mal. Na verdade, era um risco. Não sabíamos se as pessoas iriam se interessar em comprar artigos de luxo. Começamos com uma loja bem pequena. Vendíamos ternos, camisas e gravatas. Nada mais. Depois, começamos a conhecer o tipo de cliente, o que queriam e foi uma forma de educá-los no nosso estilo, dentro dos nossos valores. Foi um processo lento, mas muito importante para nós. Antes da crise de 2008, compramos todas as franquias que tínhamos lá. Foi um processo que nos permitiu dar um salto quantitativo importante. Temos mais de 80 lojas lá e, como há 60 milhões de chineses que viajam costumeiramente pelo mundo - o mesmo número de habitantes da Itália, é incrível! -, eles também compram Zegna em outras partes.

Valor: Esse fato trouxe alguma mudança nas lojas?

Zegna: Sim. Na China tínhamos lojas mais novas e mais modernas do que na Itália. Então, depois da crise que tivemos aqui em 2010, decidimos ir mais rápido no processo de renovação das lojas europeias para manter a imagem da marca. Na Ásia, em geral, as lojas eram mais novas, maiores. A verdade é que nossa grande clientela aqui, em Roma, ou em Paris são os chineses, russos e brasileiros. Assim como nos anos 1980-1990 havia norte-americanos e japoneses comprando, agora é vez deles. Então, é importante saber o que esses clientes querem, falar o idioma deles. Praticamente em todas as flagships temos vendedores chineses e russos.

Valor: E gente que fala português, não há?

Zegna: Não tanto. Os brasileiros falam bem inglês. Mais do que os chineses ou russos. E há sempre um vendedor que fala espanhol ou italiano. Entre esses idiomas, os brasileiros se encontram.

Valor: A crise europeia trouxe que tipo de problemas para a marca? Desemprego?

Zegna: A última crise passou, espero que não venha a próxima. Tivemos a crise de 2008 e, depois, a de 2010. De qual está falando?

Valor: Desta agora, que envolve a Grécia. Temos a impressão de que a Europa como um todo está em crise.

Zegna: Ah, sim. Claramente temos que compensar em parte a queda do consumo aqui com vendas em outros países. Os países emergentes, dos quais o Brasil é um, fazem parte da nossa aposta para o crescimento. Conseguimos nos manter e preservar nossa fábrica por conta desses países. Pensar em crescer na Europa agora é difícil. Neste momento, vemos de forma positiva o mercado dos Estados Unidos. Em termos relativos, o mercado americano está crescendo mais neste ano. Talvez mais do que a América Latina.

Valor: Quais são os planos para o Brasil nos próximos anos?

Zegna: Já estamos bem consolidados no território brasileiro, temos até loja em Brasília.

Valor: Por conta dos políticos.

Zegna: Sim, é como ter loja em Washington. Mas, em São Paulo, renovamos a loja do Iguatemi e vamos abrir no JK. Essa é nossa estratégia no curto prazo. Uma nova loja, só mais pra frente. Seguramente é um mercado importante. Precisamos sempre saber onde o brasileiro vai comprar quando viaja para podermos acompanhá-lo e oferecer-lhe um serviço melhor.

Valor: Qual é a sua definição para "elegância"?

Zegna: É algo que seguramente tem que vir da pessoa, fazer parte dela. É uma forma de romper os esquemas de vestir, de saber combinar os itens de uma maneira interessante e conseguir harmonizá-los bem. Mas ela tem muito a ver e depende da qualidade intrínseca dos produtos que se veste. É difícil julgar.

Valor: O sr. só veste Zegna?

Zegna: Sim, porque temos uma linha completa. E usá-la até faz parte do processo criativo dos produtos para melhor os avaliar. Às vezes também uso produtos da concorrência, para ver como são e testá-los. Aí uso coisas de marcas diferentes.

Valor: Apenas italianas?

Zegna: A maioria são marcas italianas ou produzidas aqui. Mas também outras. Há marcas novas e é preciso saber como o mercado se desenvolve.

Valor: Quantos ternos um homem deve ter no guarda-roupa?

Zegna: Depende de seu poder aquisitivo, se ele gosta ou não de se vestir. Mas um terno não é como um carro que dá pra usar o mesmo todos os dias. É como os sapatos, há que dar-lhes um descanso. Então, é preciso mais de dois.

Valor: Por que a Zegna, a exemplo de outras marcas de luxo, não seguiu para a moda feminina, não investiu em móveis ou hotéis?

Zegna: [sacudindo os ombros e rindo] Olha, ainda bem, porque há muitos problemas entre aqueles que seguiram esse caminho. A verdade é que temos um interesse muito concreto e focado nos homens. Buscamos uma especialização nisso. Seja na roupa formal ou casual. Creio que estamos em 90 países, chegando perto de 100. Preciso sempre ver as listas atualizadas. Tudo isso sem contar Nigéria, Angola, Mongólia... Há ainda muitas realidades para explorar. Temos uma trajetória positiva vestindo o homem e pretendemos ficar nisso. Até porque há uma quantidade enorme de produtos para desenvolver e uma grande capacidade de crescimento. Estamos nos divertindo com uma pequena experiência, a Agnona (marca feminina italiana de luxo, para a qual a Zegna fornece os tecidos), mas é só. O resto - hotéis, móveis, vinhos - não nos interessa.

Fonte:|http://www.valor.com.br/cultura/2616706/se-europa-nao-dita-mais-reg...

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