Boliviano é encontrado trabalhando sob condições de escravidão em oficina de costura em Americana (SP) (Foto: PRT-15 / Divulgação)
POR RODRIGO RODRIGUES
Depois de vários casos flagrantes de uso de trabalho escravo na cadeia produtiva de marcas da indústria têxtil como M.Officer, Zara, Marisa, Pernambucanas, C&A, Collins, Gregory e Ellus, o Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT-SP) resolveu criar um trabalho coletivo com as 70 grandes marcas do País, com o objetivo de tentar criar um pólo têxtil de trabalhadores imigrantes financiado pelas próprias empresas.
Chamado por hora de “Projeto Confecções” dentro do MPT-SP, o programa quer tentar criar um pólo de produção de roupas na região de Itaquaquecetuba ou Carapicuíba, onde os empresários pudessem contratar mão de obra estrangeira de bolivianos, haitianos, peruanos, entre outros imigrantes, mas sob a supervisão do MPT e obedecendo rigorosamente as leis trabalhistas brasileiras.
O projeto está em fase de discussão entre os procuradores do Trabalho e quer canalizar todo o dinheiro de aplicação de multas oriundas dessas práticas para a manutenção do pólo têxtil.
O embrião do programa deve ser lançado até o final de julho, segundo o procurador Luiz Fabre, do MPT-SP 2ª Região.
“A intenção é que o setor se una, a fim de erradicar o trabalho escravo de vez. Quem cumpre rigorosamente a lei tem muito interesse em combater aquele que agride a legislação. Então, nós vamos lançar um programa envolvendo as 70 grandes marcas que estão no topo da cadeia produtiva no setor de costura, com o objetivo de isolar economicamente aqueles que exploram o trabalho escravo”, comenta Fabre.
O procurador do Trabalho, Luiz Fabre, do Ministério Público do Trabalho de SP - 2ª Região (Foto: Alesp)
Segundo o Ministério Público do Trabalho, só em São Paulo há 200 mil bolivianos vivendo de forma irregular em São Paulo, na sua maioria em condições irregulares de trabalho.
Luiz Fabre explica que a superexploração dos trabalhadores imigrantes gera uma vantagem mensal de R$ 2.300,00 por mês por cada trabalhador explorado às empresas de costura clandestinas. Se uma oficina conta com dez trabalhadores, por exemplo, é como se ela tivesse R$ 23 mil de vantagem competitiva todos os meses.
“É uma prática generalizada. Todo mundo faz assim. Porque ou você fecha o seu negócio, ou segue esse modelo lesivo. Então, nossa ideia com o programa tem um sentido de aprimoramento do compliance das empresas – a auditoria interna da cadeia produtiva – e também estimular para que as grifes eliminem as confecções intermediárias, onde as oficinas passem a fornecer diretamente para as grifes, estimulando também o cooperativismo”, explica o procurador Luiz Fabre.
A ideia do pólo têxtil surgiu depois que a Zara – flagrada no uso de trabalho escravo na cadeia produtiva numa empresa terceirizada – resolveu financiar a construção de uma espécie de “Poupatempo do Imigrante”, com o objetivo de auxiliar na integração dos imigrantes e oferecer capacitação, documentos e ajuda jurídica.
Para erguer o chamado “Centro de Integração à Cidadania do Imigrante”, na região da Barra Funda, a Zara está fazendo investimentos de cerca de R$ 6,2 milhões.
O local terá a capacidade de atender mil imigrantes por dia, ajudando na regularização migratória e na formação profissional, segundo a grife espanhola.
“Existe uma convergência entre todas as empresas e nos órgãos públicos de que o setor está danificado. A prática do trabalho escravo está generalizada no setor de costura. Se a gente quiser uma agenda pró-ativa, daqui pra frente precisamos pensar cada vez mais no desenvolvimento desses pólos têxteis, atração da coletividade peruana, boliviana e paraguaia, atração dessas pessoas para cidades mais baratas e desenvolvimento de um modelo de eliminação de intermediários na cadeia produtiva”, argumenta o procurador. “Pra isso é necessário que todos os agentes do setor estejam envolvidos”, completa Luiz Fabre.