Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Numa conferência sobre o tema, Ana Paula Dinis, Hugo Martins, Manuel Lopes Teixeira e Marta Résio destacaram a importância do passaporte digital, da regulação eficaz e do envolvimento do consumidor.

Manuel Lopes Teixeira, Hugo Martins, Marta Résio, Ana Paula Dinis e António Braz Costa

Sob o tema “Têxtil do futuro: Sustentabilidade – Resíduos têxteis, que futuro?”, integrado no programa de conferências da Empack e Logistics & Automation Porto, realizada nos dias 9 e 10 de abril na Exponor, os especialistas debateram a viabilidade da reciclagem têxtil e a sua regulamentação, o papel crucial do consumidor na transição sustentável e a implementação de apoios tecnológicos.

António Braz Costa, diretor-geral do CITEVE, responsável pela moderação da conversa, alertou para o momento desafiante que «quem produz, quem recolhe e quem recicla» enfrenta a nível de «sustentabilidade na perspetiva dos resíduos». O diretor-geral do CITEVE apontou a responsabilidade alargada do produtor (RAP) como solução, «mas para ser solução tem de ser bem pensada, bem divulgada e muito bem implementada, porque ainda estamos muito longe».

Ana Paula Dinis, diretora-geral da ATP, destacou que a indústria têxtil portuguesa tem feito um percurso consistente em direção a «uma economia mais circular», mas que não pode suportar na totalidade a transição. A diretora-geral da ATP enfatizou o peso e a preocupação com os critérios de ecomodulação que, no seu entender, «vão conseguir trazer alguma justiça no mercado, vão conseguir valorizar aquilo que as nossas empresas estão a fazer do ponto de vista da sustentabilidade, pois sempre fomos muito defensores de que isto tem de ser bem pensado. Não é só pôr uma taxa por peça ou por quantidade, não queremos esse modelo que foi pensado no início. Queremos um modelo que traga para dentro desta discussão os critérios da ecomodulação para, de alguma maneira, privilegiar o que a nossa indústria tem estado a fazer no âmbito da sustentabilidade».

Ana Paula Dinis considera também importante o envolvimento e sensibilização dos consumidores nesta matéria. «Temos de envolver todos, não é só regulamentação, não é só indústria, não é só marca, nós precisamos de ter os consumidores disponíveis e sensibilizados para comprarem produtos com mais matéria-prima reciclada», acrescentou.

Manuel Lopes Teixeira, coordenador da estratégia ModaPortugal na ANIVEC/CENIT, descreveu, sobre o poder da sensibilização e da regulação, que «a experiência de reflexão dos últimos anos diz que a regulação é que vai contar». Apesar de haver «muita campanha de sensibilização, que é um instrumento de afirmação de marcas a falar de sustentabilidade», de acordo com o coordenador da estratégia ModaPortugal as marcas continuam a adiar decisões, com um discurso sustentável, mas sem compromisso imediato. «O consumo ainda não está a responder na dimensão que nós precisamos para viabilizar uma indústria na Europa com a ambição que nós queremos. Portanto, a regulação vai fazê-lo», sublinhou.

Além disso, Manuel Lopes Teixeira realçou que o consumidor «tem de se imaginar a pagar muito mais» pelos produtos e que «o vestuário e o têxtil, em geral, vão ter de ser mais caros se quisermos ter uma indústria sustentável».

A escalada das plataformas de comércio eletrónico na Europa, que fazem chegar produtos com valores abaixo de 150 euros «sem pagar taxas aduaneiras e sem pagar IVA», através do sistema de minimis, é um problema apontado pelo coordenador da estratégia ModaPortugal, apesar de estar à vista o seu fim. Por ser um «negócio logístico, de despachar produto, com controlo zero», vai ser necessário «colocar uma sociedade civil em prol de uma visão diferente de consumo e acho que precisamos do financiamento do RAP, que é fundamental para poder funcionar tudo isto», declarou Manuel Lopes Teixeira.

Sobre o futuro, apesar de confiante, o coordenador da estratégia ModaPortugal acredita que a indústria enfrentará um «caminho difícil nos próximos tempos», mas que «com uns pequenos retoques na legislação que está a ser discutida, pode criar-se uma oportunidade para qualificar de uma forma substancial a indústria». Manuel Lopes Teixeira assinalou ainda a necessidade de conter o consumo desregulado e de «travar o nivelamento por baixo do consumo de moda, em qualidade e em preço. Isto é insustentável».

As exigências da reciclabilidade

No caso da Salsa Jeans, para Hugo Martins, CEO da marca portuguesa, «o tema da reciclabilidade tem mais a ver com conseguir as percentagens de monomaterialidade, com a utilização reduzida de elastano», mas esse «não é o principal entrave à reciclabilidade». O maior desafio, para o CEO da Salsa Jeans, está em tornar o processo economicamente viável em escala.

A visão europeia sobre a regulamentação foi criticada por Hugo Martins, considerando que ficou esquecido o que «poderia ser uma oportunidade de negócio» e não só uma necessidade de criar regras. «Ao criar regras, na verdade, pôs todos os seus operadores locais em desvantagem contra os operadores internacionais e não criou condições para eventualmente poder capturar o lado positivo da tendência da transformação», explicou o CEO da Salsa Jeans.

Outro ponto levantado foi o custo associado ao caminho da reciclabilidade. Enquanto «empresa que nasceu com uma matriz industrial», a redução de resíduos e a reciclagem surgiu «por uma questão de responsabilidade, mas também por uma questão de eficiência, porque há vantagem e valor», detalhou Hugo Martins. No entanto, o CEO da Salsa Jeans afirmou que «significa pagar mais» para poder implementar processos de reciclagem.

Questionado sobre se passaporte digital do produto poderia vir a substituir os sistemas de certificação, Hugo Martins acredita ser uma perspetiva «demasiado ambiciosa». O CEO da Salsa Jeans sublinhou a ausência de um olhar estratégico clara sobre o objetivo do passaporte – se é para controlo, informação ou motivação do consumidor e que uma versão base do passaporte poderia funcionar como uma espécie de «certificação nível zero».

Hugo Martins evidenciou ainda que, operando também enquanto produtor para terceiros, sente diretamente a exigência das marcas para cumprir múltiplas certificações e alerta que é «profundamente utópico» pensar numa «certificação internacional única que seja aceite e que cumpra todas as dimensões» do setor.

A importância do passaporte digital do produto

Marta Résio, diretora de sustentabilidade e comunicação da GS1 Portugal, a organização responsável pela introdução do código de barras em território nacional, vê a implementação do passaporte digital do produto «com enorme otimismo», considerando-o um instrumento essencial para «garantir a visibilidade e transparência ao longo da cadeia de valor» têxtil.

A diretora de sustentabilidade e comunicação da GS1 Portugal salientou que o passaporte digital do produto permite agregar dados relevantes de todos os operadores, estes últimos com «uma mobilização genuína e um compromisso em pelo menos atingir aquilo que temos designado como mínimo denominador comum», para conseguir minimizar «ao máximo os resíduos e otimizar os recursos necessários».

Contudo, Marta Résio alertou para as limitações tecnológicas atuais e a falta de apoio tecnológico de «inovação transetorial» para a implementação do passaporte digital do produto, reforçando não ser «justo e adequado que seja colocado do lado dos operadores» a responsabilidade de implementação. «Não seria abusivo dizer que a falta de preparação ao nível institucional é maior do que aquela que se regista junto dos operadores», acrescentou.

Quanto ao futuro, Marta Résio manifestou esperança num caminho mais colaborativo no setor, com os operadores «disponíveis para partilhar dados de qualidade e mobilizados na formação das suas equipas para reportar o que é verdade». A diretora de sustentabilidade e comunicação da GS1 Portugal indicou também a necessidade de uma agilização tecnológica, que permita transformar resíduos em novos produtos, sendo essencial «o contributo dos decisores e das autoridades», garantindo que todos cumpram o seu papel neste processo de transição.

https://portugaltextil.com/o-futuro-dos-residuos-texteis/

Para participar de nossa Rede Têxtil e do Vestuário - CLIQUE AQUI

Exibições: 19

Responder esta

© 2025   Criado por Textile Industry.   Ativado por

Badges  |  Relatar um incidente  |  Termos de serviço