O que esperar do mercado de luxo em 2023?

[Romildo de Paula Leite]

Mesmo o setor de luxo, com sua notável resiliência, não é imune à turbulência econômica e a efervescência desse champanhe parece estar fenecendo.

Às vésperas de 2022, o mercado de produtos de luxo, que movimenta US$ 353 bilhões de euros, tinha motivos para comemorar. As restrições ligadas à covid-19 tinham, em grande medida, sido abrandadas fora da China, as ações das empresas de artigos de luxo superavam pelo segundo ano consecutivo a média do desempenho das bolsas como um todo e grandes contingentes de consumidores, munidos das poupanças acumuladas nos períodos de lockdown, estavam ansiosos por viajar — e por se vestir bem para isso. E fizeram isso, efetivamente: após se recuperarem plenamente dos níveis pré-pandemia, até o fim de 2021, as vendas de artigos de luxo cresceram mais 15%, em bases constantes, segundo analistas do Citi e da Bain.

Mas mesmo o setor de luxo, com sua notável resiliência, não é imune à turbulência econômica e, em meio à guerra na Ucrânia, às altas dos preços da energia e das taxas de juros e à ameaça de recessão nos EUA e na Europa, a efervescência desse champanhe parece estar fenecendo.

Desaceleração nas vendas

Embora o setor de moda se prepare para uma pequena retração das vendas em 2023, de acordo com a McKinsey, os analistas preveem que o setor de produtos de luxo continuará crescendo — embora mais lentamente do que no ano passado.

A taxa com que esse crescimento se dará depende do sucesso da retomada da economia da China e da resiliência do mercado dos EUA. A decisão de Pequim, desta semana, de afrouxar os controles sobre as viagens à China e da China para o exterior, poderão levar a um aumento de 6% a 8% das vendas no ano que vem, segundo Claudia D’Arpizio, sócia da Bain, comparativamente a uma projeção anterior, mais conservadora, de 3% a 5%. O Japão, em especial, tende a se beneficiar, já que os consumidores chineses aproveitarão as vantagens do iene depreciado, embora o país tenha dito que todos os viajantes procedentes da China terão de apresentar um teste de covid negativo ao chegar, ou fazer quarentena de sete dias, diante da disparada dos números de novos casos na China.

Foco nos ultrarricos

Embora os “cobiçados” compradores de produtos de luxo já estejam diminuindo as compras nos EUA, os gastos entre a faixa de 2% dos consumidores mundiais mais ricos — que, juntos, respondem por 40% das compras de produtos de luxo — continuam sólidos, segundo avaliação das marcas e varejistas. A competição por esses consumidores vai se aquecer em 2023, com as marcas tendo aumentado seus investimentos em desfiles, viagens e experiências exclusivas. No começo deste ano a Balenciaga abriu uma loja em Paris para seus maiores consumidores, enquanto a Chanel planeja fazer o mesmo na Ásia em 2023.

Prepare-se para aumento de preços

Embora os preços das bolsas “principais” de marcas como a Chanel e a Louis Vuitton já venham praticando um aumento de 20% ou mais nos últimos dois anos, prevê-se que as marcas aumentarão ainda mais os preços desses produtos no ano que vem — especialmente na Europa, onde a desvalorização do euro tornou os artigos de luxo comparativamente baratos. Os preços poderão aumentar 15% no continente europeu no ano que vem, e em percentuais intermediários da casa de um dígito nos EUA na China, diz Thomas Chauvet, analista de luxo do Citi.

Num momento em que vem encolhendo o diferencial de preços entre os artigos de luxo e relógios e as joias, os consumidores podem considerar vantajoso canalizar parte maior de seus gastos para estas últimas categorias, acrescenta.

Um retorno a formalidade

A retomada da vida social, das viagens e da ida ao escritório marcou o início da volta aos cuidados com o bem-vestir — embora categorias como os tênis continuem a ser importantes, principalmente para consumidores mais jovens que veem esses itens como colecionáveis. Haverá também crescente foco em pré-adolescentes (também conhecidos como geração Alpha) que realizam suas primeiras compras de luxo já aos 13 anos — em contraste com a Geração Z, que fizeram suas primeiras aquisições de produtos de luxo na faixa dos 18 aos 19 anos. Para alcançar esses potenciais jovens consumidores, as marcas continuarão a investir nas oportunidades de marketing em jogos e no metaverso, apesar do colapso dos criptoativos.

Logotipos e outros símbolos vistosos de riqueza desapareceram durante a última recessão econômica de 2009. O mesmo pode acontecer nos EUA e na Europa em 2023, com o arrefecimento da euforia pós-covid e a resistência dos jovens consumidores às celebridades que ostentam sua riqueza nas redes sociais (vide a árvore de Natal de Kylie Jenner).

Sucessão toma forma

O ano de 2023 assistirá também à ascensão de novas caras ao primeiro plano, com anúncios de novos diretores de criação previstos na Gucci, na Louis Vuitton masculina e na Tom Ford, enquanto empresas de controle familiar repassam maiores responsabilidades à próxima geração. Em dezembro, Antoine Arnault, filho de Bernard Arnault, presidente do conselho e CEO da LVMH, acumulou o cargo de CEO da Christian Dior SE a suas funções. Por seu lado, a Prada nomeou Andrea Guerra como CEO do grupo para ajudar na transição de Lorenzo Bertelli, filho de Miuccia Prada e Patrizio Bertelli, ao futuro cargo de CEO. A nova direção da Burberry começará a se concretizar com a primeira coleção de Daniel Lee para a marca britânica em fevereiro.

Perspectivas de longo prazo permanecem vivas

Embora 2023 deva ser um ano mais lento para o setor de luxo, suas perspectivas de longo prazo são sólidas. Segundo a Bain, prevê-se que as vendas aumentarão em 60% entre 2022 e 2030, estimuladas pelo crescente número de consumidores de artigos de luxo em mercados como Índia, México, Coreia do Sul e Sudeste Asiático. (Tradução de Rachel Warszawski)

Por Lauren Indvik e Leila Abboud, Financial Times

Fonte: Valor Econômico

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