Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

A "precificação" do luxo é hoje o maior desafio do setor, segundo estudo da Bain & Co, em parceria com a Fundação Altagamma, divulgado na última semana.

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Nas últimas semanas, a butique da IWC, no shopping JK Iguatemi, em São Paulo, recebeu ligações de consumidores americanos. Colecionadores estavam interessados em comprar relógios na loja daqui. Oi? “O mundo da alta relojoaria é muito pequeno e quando surge uma oportunidade com preços mais atraentes um comprador avisa o outro”, diz Stephanie Aubry, gerente regional da IWC. Ela não confirma, mas a diferença chegou a ser 30% menor em relação aos EUA. Desde junho, Fernando Dryzun, diretor da rede de joalherias Dryzun, também notou um movimento surpreendente. “Nunca imaginei que fosse ver clientes internacionais comprando relógios por aqui. Foi a primeira vez que isso aconteceu na Dryzun. Ao mesmo tempo, nossa venda para brasileiros cresceu 50% de junho até outubro”, diz ele, que trabalha com as marcas Bulgari, Cartier e Jaeger-LeCoultre.

Ok, trata-se de uma “distorção”, um “gap” antes da remarcação, uma oportunidade. Mas aconteceu no início do ano e se repetiu agora. A “precificação” do luxo é hoje o maior desafio do setor, segundo estudo da Bain & Co, em parceria com a Fundação Altagamma, divulgado na última semana. “A ascensão do ‘e-commerce’ e o crescimento do turismo mundial criaram maior transparência em torno de diferenças de preços internacionais. Além disso, os compradores de luxo estão se esforçando para conciliar o preço dos produtos de luxo com o seu valor real”, destaca o estudo.

O setor de luxo como um todo superou US$ 1 trilhão, crescendo em termos reais 5% em relação a 2014. Os bens pessoais devem responder por US$ 253 bilhões neste ano, um crescimento de 13% no câmbio atual, mas, em termos reais, trata-se de uma desaceleração de 2%. Pois é. Por mais que a indústria sofra menos, ela também está suscetível ao novo cenário econômico, às flutuações cambiais, às mudanças nos modelos de varejo e à nova escala de valores dos consumidores. “Agora estamos sentindo esse impacto da desaceleração do mercado de bens pessoais de luxo”, diz Claudia D’Arpizio, sócia da Bain em Milão, que comandou o estudo. “O maior desafio para as marcas de luxo é navegar de maneira bem-sucedida em um ambiente volátil e difícil de prever.”

O estudo chama atenção, por exemplo, para a tendência positiva de “repatriação de gastos” dos brasileiros, com a desvalorização do real. “De uma forma geral, devemos crescer 2% neste ano na butique. O consumidor brasileiro já percebeu que é vantajoso comprar por aqui. Nosso desempenho é um resultado muito positivo diante da economia, principalmente se compararmos a outros mercados, como a China, por exemplo”, diz Paulo Cavazotti, diretor da Panerai para América Latina e Caribe. Os chineses, mostra o estudo, pararam de comprar em Hong Kong (-25%), Macau (-10%) e China continental (-1%). E o setor de relógios foi o que mais sofreu por lá, com lojas superestocadas. Hoje, só 20% dos chineses adquirem luxo localmente também em função das restrições impostas pelo governo. Em compensação, a desvalorização do euro e do yen os levaram para “mercados maduros”, como a Europa e o Japão.

Assim como dos chineses, a Europa se beneficiou da volta dos americanos empoderados com o “superdólar”, enquanto os russos desapareceram do cenário. Na contramão, o fluxo de turistas diminuiu nos Estados Unidos (como os brasileiros, por exemplo). As lojas de departamento americanas estão sofrendo, enquanto os outlets têm se saído melhor, com cada vez mais “tours” de compras organizadas pelas agências de viagem. Mesmo assim, a maior cidade de faturamento do luxo no mundo é Nova York, que sozinha superou o Japão, com €27 bilhões.

Em meio ao turbilhão, duas categorias de produtos se destacaram. Joias, por se apresentarem como um investimento seguro (cresceu 6% em termos reais), e sapatos (+ 4%), que ganham cada vez mais “o reconhecimento de status”, devido ao seu posicionamento com preços mais “simpáticos”.

O ritmo de abertura de lojas diminuiu (foram 750 em 2014 e serão 600 neste ano). O atacado ainda responde por 66% das vendas dos bens pessoais, ainda que em processo de desaceleração. O estudo deste ano mostra que o “e-commerce” já responde por 7% do mercado (o dobro em relação a 2012), assim como o varejo nos aeroportos chegou a 6% do total. “As grifes precisam repensar o papel de suas lojas em um mundo de crescente digitalização, bem como descobrir como encantar os clientes locais, mesmo quando massas de turistas lotam lojas em mercados maduros”, destaca o estudo da Bain e da fundação Altagamma.

Os canais de venda com desconto dobraram em três anos. De uma forma geral, as marcas estão fazendo coleções específicas e lojas focadas em “off-price” para atender a esse movimento. Dos € 253 milhões alcançados em 2015 com bens pessoais, 35% vieram de roupas, produtos de beleza, acessórios, relojoaria e joalheria com descontos. Ou seja, um terço do faturamento já vem das liquidações e outlets físicos e virtuais. Por isso, o estudo destaca a relevância da conscientização dos consumidores e a necessidade de equalizar preços. “Mesmo com o aumento que fizemos no início do mês, ainda vamos estar 5% mais barato que nos Estados Unidos. Conquistamos a confiança do consumidor brasileiro e não podemos mudar isso em função de uma conjuntura momentânea”, diz Cavazotti. “Nossa proposta é alinhar os preços com Estados Unidos e já vamos fazer um reajuste nesse sentido a partir do dia 15”, diz Stephanie.

A pesquisa contemplou dez segmentos do mercado. Carros de luxo, por exemplo, cresceram 8%, hotelaria, 7% e artes plásticas, 6%. As fabricantes top criaram novos produtos de entrada como as SUV e apresentaram possibilidades de customização como forma de segmentação dos preços. A hotelaria europeia, por sua vez, se beneficiou com o fluxo de turistas americanos e chineses. E o setor de arte ganhou corpo com os leilões que dobraram de frequência nos últimos dez anos, além de colecionadores nova-iorquinos, ingleses e chineses mais “refinados”. Obras do pós-guerra e contemporâneas são as que mais atraem investidores.

O setor que sempre se beneficiou do intangível e do sonho para trabalhar com margens invejáveis se vê diante dos desafios da precificação e da mudança de percepção por parte dos consumidores. Por isso, o estudo da Bain propõe para os “players” duas questões sobre valores: 1) Como reconstruir a aspiração, a credibilidade e a confiança por (e nos) produtos de luxo?; 2) Como tornar mais atraente a plataforma e o território da marca para se conectar com o consumidor do futuro? Ou seja, o setor está diante dos mesmos desafios de muitas outras indústrias. Perdeu a exclusividade até nos dilemas.

Fonte: Valor Econômico

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