Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Profissionais negros se unem para revolucionar o protagonismo da moda

Após protestos nos EUA, mobilização que ganhava força nos bastidores gera alianças que prometem abalar o conservadorismo do universo fashion.

Campanha da diaspora009DIASPORA009/DIVULGAÇÃO
Grandes grifes do mercado de luxo tem apoiado o movimento #BlackLivesMatter e, com isso, os stylists Jason Bolden, Law Roach e Kollin Carter foram a público denunciar o cinismo de algumas etiquetas. Segundo eles, muitas marcas que se manifestaram contra o racismo se negavam a vestir personalidades negras, algo que não seria mais tolerado pelos profissionais. Agora, duas semanas após as críticas, os consultores anunciaram uma aliança poderosa para reaver o protagonismo da moda, em uma movimentação já sentida no mercado brasileiro.

Vem comigo saber mais!

@SOFIANEWHOKNOCKS/GIPHY/REPRODUÇÃO@sofianewhoknocks/Giphy/Reprodução

The Black in Fashion

O coletivo The Black in Fashion surge como uma organização sem fins lucrativos que reúne estilistas, stylists, maquiadores e cabeleireiros, no intuito de apoiar os profissionais negros da indústria criativa que atuam nos bastidores da moda e do entretenimento. Mudar a atual estrutura significa contratar mais pessoas negras tanto nas passarelas quanto nos bastidores da moda.

“É um espaço seguro para compartilhar experiências negativas e defender a igualdade de remuneração. É uma espécie de sindicato black glam“, brincou Jason Bolden, um dos fundadores do projeto, em entrevista ao Business of Fashion.

O profissional, à frente do reality show Styling Hollywood, da Netflix, é um dos mais concorridos da indústria, assinando os visuais de Alicia Keys, Serena Williams, Taraji P. Henson, Vanessa Hudgens, Queen Latifah, Cythia Erivo e Yara Shadidi.

NETFLIX/DIVULGAÇÃOStyling Hollywood
Jason Bolden, do reality show Styling Hollywood, é um dos líderes da nova associação

@JASONBOLDEN/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOJason Bolden
Com a ação, o stylist espera alavancar os profissionais negros filiados ao grupo

ETHAN JAMES GREEN/STUART WEITZMAN/DIVULGAÇÃOSerena Williams em campanha da Serena Williams - campanha da Stuart Weitzman
Serena Williams é uma das clintes de Bolden e deve apoiar a causa

Law Roach, responsável por colocar Zendaya, Celine Dion, Ariana Grande, Demi Lovato, Kerry Washington e Anya Tarlor Joy nas listas de celebridades mais bem vestidas da moda, também usará sua influência para ajudar os criativos do coletivo. Desenvolvendo coleções para a Tommy Hilfiger e em destaque na mídia por participar dos programas Legendary, da HBO, e America’s Next Top Model, da VH1, Roach está em um patamar que poucas figuras do segmento conseguiram alcançar.

Além da poderosa dupla, integram o projeto o designer Jason Rembert, da Aliétte, a cabeleireira das estrelas Lacy Redway, a stylist da NBA Rachel Johnson, o responsável pelas produções das atrizes Tessa Thompson e Regina King, Micah McDonald, a maquiadora da cantora Janelle Monae, Jessica Smalls, e nomes em ascensão, como Kesha McLeod, Apuje Kalu, Ashunta Sheriff-Kendricks e Nai’vasha. No entanto, o processo de associação ainda está em andamento e mais figuras da cena fashion devem embarcar no projeto.

@LUXURYLAW/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOLaw Roach
Law Roach, jurado dos programas Legendary e America’s Next Top Model, também encabeça o coletivo

@LUXURYLAW/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOLaw Roach
Stylist é um dos responsáveis pelo sucesso da cantora e atriz Zendaya

@JASONREMBERT/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOJason Rembert
O colega Jason Rembert integra o grupo

@LACYREDWAY/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOLacy Redway
Assim como a cabeleireira Lacy Redway…

@LOVINGRACHEL/INSTAGRAM/REPRODUÇÃORachel Johnson
… e a stylist das estralas da NBA Rachel Johnson

O The Black in Fashion ainda não deixou claro como irá criar espaço para estes profissionais, mas já adiantou uma parceria com o fundo de assistência a pequenas empresas My Block, My Hood, My City, que tem ajudado empresários negros a se reerguerem em meio à crise relacionada à Covid-19.

“Nossos colegas brancos sempre tiveram experiências muito diferentes de nós, seja na maneira como são pagos e tratados ou nas facilidades nos departamentos de relações públicas e agências de gerenciamentos de carreira. Já tivemos o suficiente. Tudo será diferente a partir de agora”, defendeu Bolden, ao enfatizar que o coletivo não irá apenas identificar comportamentos discriminatórios, mas conseguir relações mais positivas com as grandes marcas.

De acordo com o idealizador do coletivo, os profissionais negros da indústria têxtil, em grande parte, só conseguem trabalhos como freelancers, mesmo após as revistas e grifes começarem a investir em ações voltadas à comunidade.

“Os produtores e fotógrafos negros geralmente são contratados apenas para campanhas de diversidade ou trabalhos relacionados às celebridades negras. Ainda assim, eles são frequentemente desrespeitados e mal pagos”, relatou Jason ao BoF.

@JASONBOLDEN/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOJason Bolden
Jason Bolden garantiu ao Business of Fashion que as coisas serão diferentes a partir de agora

VINICIUS SANTA ROSA/METRÓPOLESMaquiadora negra trabalha no backstage do Brasília Trends
Ele espera que os profissionais negros consigam mais do que trabalhos freelancers em ações de diversidade

Reação em cadeia

Outros profissionais que integram o mercado do vestuário têm respondido ao assassinato de George Floyd de maneira semelhante, formando associações ou pressionando os gigantes do mercado a fazerem mais do que doações simbólicas e declarações de apoio.

Kerby Jean-Raymond, da Pyer Moss, contou ao site Highsnobiety que ele, Virgil Abloh, Prabal Gurung e Dao-Yi Chow entregaram uma lista de exigências aos Conselho de Estilistas da América (CFDA), com o objetivo reduzir o preconceito e impulsionar o avanço dos negros na moda estadunidense.

Jason Campbell, Henrietta Gallina e Kibwe Chase-Marshall também enviaram uma petição à instituição, pedindo mais empenho na promoção da contratação de profissionais negros nas etiquetas filiadas.

A estilista Aurora James, da Brother Vellies, tenta negociar um tratado entre grupos varejistas e fornecedores negros. Caso ela consiga levar o acordo adiante, as companhias envolvidas se comprometerão a dedicar pelo menos 15% de suas compras às empresas lideradas por pessoas de cor.

DANIEL ZUCHNIK/GETTY IMAGESKerby Jean-Raymond
Kerby Jean-Raymond é o diretor criativo das marcas Pyer Moss e Reebok

DIMITRIOS KAMBOURIS/GETTY IMAGESVirgil Abloh
Virgil Abloh direciona os trabalhos masculinos da Louis Vuitton e a Off-White

DONATO SARDELLA/GETTY IMAGES FOR CFDA/VOGUETom Ford e Anna Wintour
Tom Ford e Anna Wintour, que comandam o CFDA, agora analisam o que podem fazer pelos empresários da comunidade

@AURORAJAMES/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOAurora James
Aurora James tenta negociar um tratado de cotas

Uma década à frente

Em Brasília, a união de pessoas negras em nome do avanço da comunidade no mercado de moda é sentida há pelo menos uma década. Cansada de ver o desprestígio da indústria local com os modelos negros, a empresária Dai Schmidt resolveu investir em um desfile e em uma agência completamente voltados aos profissionais afrodescendentes.

“Senti o preconceito desde cedo. Tanto nas agências quanto nas grandes marcas, que muitas vezes associavam nossa imagem à pobreza, situação de inferioridade ou deboche. A Bombril, por exemplo, foi super racista ao relançar um produto chamado Crespinha”, relata à coluna.

Atualmente, segundo ela, muitas empresas recorrem aos profissionais negros não por vontade própria, mas por uma lei de publicidade que exige a inclusão étnica nas campanhas. “Minha luta, e de toda a comunidade, é pelo fim desse sentimento de obrigação”, ressalta Dai.

CORTESIA DE DAI SCHM️️IDTDai Schm️️idt
Dai Schm️️idt, criadora do Desfile da Beleza Negra

VINÍCIUS SANTA ROSA/METRÓPOLES
Empresária espera que o setor não seja movido apenas pela obrigatoriedade

Desde a primeira edição do Desfile da Beleza Negra, em 2012, até os dias de hoje, a empresária relata que poucas mudanças podem ser sentidas na moda brasiliense. “Muitos empresários apoiam, mas não são engajados com a causa. Fazem apenas para figurar como uma marca amigável. Muito precisa ser feito para melhorar o cenário, desde políticas públicas que dão visibilidade à comunidade ao incentivo em campanhas federais. Até mesmo a posição do presidente em relação às minorias precisa mudar”, reflete ela.

Para a produtora, a onda de protestos que invadiu as cidades norte-americanas deve iniciar uma revolução mais significativa no universo fashion. “Sete anos depois, vimos o Black Lives Matter ganhar mais repercussão e adesão da mídia, em um momento onde a exposição do racismo foi mais intensa na industria têxtil. Faz pouquíssimo tempo que um perfil do Instagram expôs as atitudes preconceituosas de nomes muito conhecidos no mercado. Meu desejo, e de todo o movimento, sem dúvida, é que a moda reconheça e valorize a presença e beleza negra”, deseja Schmidt.

NINA QUINTANA/DESFILE DA BELEZA NEGRA/DIVULGAÇÃODesfile da Beleza Negra
O Desfile da Beleza Negra foi criado em 2012, para incentivar os profissionais da comunidade

NINA QUINTANA/DESFILE DA BELEZA NEGRA/DIVULGAÇÃODesfile da Beleza Negra
Evento caminha para sua 13ª edição

GABRIEL OLIVEIRA/DESFILE DA BELEZA NEGRA/DIVULGAÇÃODesfile da Beleza Negra
Dai também criou uma agência voltada aos modelos negros

No intuito de ajudar jovens pretas a conquistarem um lugar no mercado, Dai compõe o time de professores da terceira edição da Caravana da Juventude, iniciativa do Instituto Blaise Pascal que oferece oportunidades gratuitas de capacitação aos profissionais negros do mercado cultural e artístico.

Além das expertises da empresária, o projeto traz cursos de maquiagem, fotografia e produção de vídeos para internet. As inscrições podem ser feitas por meio de um formulário disponibilizado no site da ação. No endereço, ainda é possível conhecer a programação de cada oficina.

“Sempre digo que uma pessoa não precisa ser negra, indígena ou homossexual para apoiar as minorias. Percebi que empatia é algo que falta em muitas pessoas. O maior auxílio que alguém pode dar ao movimento negro é reconhecer, respeitar e divulgar a nossa luta. Pequenas ações fazem uma enorme diferença no combate ao racismo”, comenta Schmidt, que prepara a primeira edição digital do Desfile da Beleza Negra.

Programado para 20 de novembro, o evento reunirá apenas estilistas independentes, como Luan Oliveira, Nicolly Primo, Sophia Dinis e Mike Bryant. “Acho importante essa união, porque nossas marcas são bem representativas. Ainda mais nesse cenário onde as pessoas sempre associam a imagem do negro ao lugar subalterno, como se nós não pudéssemos ter nosso próprio negócio ou chegar a um lugar no qual o branco sempre ocupa. Então, acho importante ter projetos que tenham pessoas pretas falando sobre pessoas pretas”, afirma Nicolly Primo.

NINA QUINTANA/DESFILE DA BELEZA NEGRA/DIVULGAÇÃODesfile da Beleza Negra
O Desfile da Beleza Negra terá sua primeira edição virtual em 20 de novembro

@NICOLLY.PRIMO/INSTAGRAM/REPRODUÇÃONicolly Primo
Nicolly Primo é uma das designers que se apresentarão

NANÃ/DIVULGAÇÃONanã
Sua marca Nanã empodera as mulheres com roupas cheias de personalidade

@SOPHIADINIS/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOSophia Dinis
Sophia Dinis também está confirmada no evento

DS AFRO CONCEPT/DIVULGAÇÃODS Afro Concept
Assim como as estampas coloridas da DS Afro Concept

Dupla dinâmica

Envolvidos nos principais eventos de moda na capital federal, o produtor Fernando Lackman e a presidente do Sindicato das Indústrias do Vestuário do DF, Walquiria Aires, não poupam esforços para levantar a bandeira da inclusão no mercado brasiliense.

Depois de viabilizar o evento Moda Connect, voltado aos profissionais com deficiência, em novembro passado, a dupla agora planeja uma iniciativa focada nas minorias: o Fashion For All.

“A moda não veste mais apenas o consumo. É muito claro que, hoje, as pessoas criam roupas, também, pensando nas questões sociais. Temos roupas feitas para transexuais, para plus sizes e para quem tem algum tipo de deficiência física. Há, ainda, quem não queira seguir um gênero”, destrinchou Fernando no início deste ano.

MYKE SENA/ ESPECIAL PARA O METRÓPOLES
Fernando Lackman e Walquiria Aires, dupla responsável por movimentar a moda de Brasília

MYKE SENA/ESPECIAL PARA O METRÓPOLES
Walquiria é presidente do Sindiveste-DF

JACQUELINE LISBOA/ESPECIAL PARA O METRÓPOLES
O Moda Connect, viabilizado pelos entusiastas da indústria têxtil, propôs a inclusão de deficientes físicos no setor.

A luta pela inclusão dos negros no mercado data de muito antes. Como produtor, Lackman sempre fez o possível para inserir modelos e estilistas negros nos eventos onde trabalhava e, graças a ele, hoje as passarelas da capital federal exalam diversidade.

“Até uns 8 anos atrás, era uma regra ter, ao menos, 30% de negritude nos castings, mas na época era difícil encontrar modelos qualificados. Hoje não faço mais cálculos. As agências investiram em treinamentos, o público negro assumiu a beleza que tem e a quantidade de modelos só cresce. Nos eventos que produzo, estão presentes todas as classes e raças. Em 2019, aconteceu de termos maioria negra em alguns desfiles e o público sempre vibrou ao ver um cabelo com volume ou uma mulher negra e careca andando sob os holofotes”, revela à coluna.

Porém, se nas luzes da passarelas o clamor eleva o empoderamento dos negros, nos bastidores eles ainda são preteridos. “Temos produtores que escolhem equipe por individualidades e não por currículo. Eu adoro trabalhar com pessoas. Não escolho por cor ou gênero. Eu quero é formar mais pessoas de movimentos considerados minoritários. Quando se treina, propõe formação, ensina e investe, talentos nunca imaginados são descobertos. Quero ver cada vez mais transgêneros, negros e refugiados no mercado”, destaca ele.

Pelas experiências do especialista, os consumidores são peças fundamentais para eliminar a resistência que resta no setor. “Sempre que vejo alguém usando roupas com características da moda negra, pergunto de onde é. Descobrir de onde vem a moda é o primeiro passo pra valorizá-la. Não temos muito destaque, mas temos muitas marcas e criadores negros investindo no setor atualmente. Ainda é pouco perto do mundo de possibilidades que temos”, conclui Lackman.

@FERNANDOLACKMAN/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOFernando Lackman
Lackman sempre privilegiou profissionais negros em seus trabalhos

@FERNANDOLACKMAN/INSTAGRAM/REPRODUÇÃOFernando Lackman
Produtor afirma que não faz mais cálculos na hora de fechar os castings: “Em 2019, aconteceu de termos maioria negra em alguns desfiles e eventos”

Marcia Lima e Fernando Lackman
Fernando era um dos organizadores do Capital Fashion Week, ao lado da idealizadora da semana de moda, Marcia Lima

Apoie a moda negra!

De olho nas recomendações do produtor Fernando Lackman, preparamos uma galeria com estilistas e marcas negras para você apoiar. Afinal, como bem lembrou Lia Maria dos Santos, da diaspora009, em entrevista à Vogue, “quando ouvimos, conhecemos e consumimos uma marca de empreendedora negra, estamos reconhecendo uma luta ancestral pelo direito à vida”. Confira:

Colaborou Danillo Costa

https://www.metropoles.com/colunas-blogs/ilca-maria-estevao/profiss...

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