O apoio das varejistas Reserva e Renner e o uso de blockchain, tecnologia de dados criptografados, foram essenciais para a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa) e o Movimento Sou Algodão atraírem, além de produtores e algodoeiros já certificados com o selo SouABR (Algodão Brasileiro Responsável), fiações, tecelagens, confecções e lojas para o primeiro programa de rastreabilidade da indústria têxtil brasileira.
O projeto permite ao consumidor fazer uma verdadeira radiografia de uma peça de roupa. Pela etiqueta do vestuário certificado, pode-se conhecer desde a fazenda em que o algodão foi cultivado, passando pela fiação, a tecelagem ou malharia que desenvolveu o tecido até a empresa que o confeccionou. Todas as peças rastreáveis têm no mínimo 70% de algodão em sua composição e possuem certificação socioambiental.
— Quando vestir uma camisa assim produzida, o consumidor fará parte dessa história de sustentabilidade e rastreabilidade — diz o presidente da Abrapa, Júlio Busato, ressaltando que esse é o primeiro programa do tipo em nível mundial e que, a partir deste mês, está disponível para todas as marcas nacionais interessadas em aderir.
Há dez anos, a Abrapa instituiu o selo SouABR, certificando que o fazendeiro segue os padrões de sustentabilidade exigidos pela instituição, ao se enquadrar em 183 itens do questionário montado pela entidade com base na NR31, que estabelece regras relacionadas à saúde e segurança no trabalho na agricultura.
O selo também se baseia em iniciativas como a Better Cotton Initiative (BCI), organização sem fins lucrativos, criada em 2005, e com sede na Suíça.
Dados auditáveis
De acordo com a Abrapa, até agora, não era possível garantir que uma roupa havia sido feita com o algodão certificado. Uma plataforma desenvolvida ao longo de 15 meses e a adesão das duas marcas tornaram possível assegurar que somente o algodão atestado foi usado em todas as etapas do processo de produção. A fase piloto, encerrada neste mês, foi iniciada em outubro de 2021 com o lançamento da coleção de 25 mil camisetas rastreáveis pela Reserva.
A certificação da fazendo ao varejo é assegurada pelo uso do blockchain. A roupa chega à vitrine com o QR Code na etiqueta pelo qual se rastreiam todos os passos da produção. As informações sobre o caminho percorrido pelo algodão ficam digitalizadas, acessíveis e auditáveis.
Segundo Busato, o processo não permite, por exemplo, a mistura de fios com e sem selo, bem como de tecidos com e sem certificação. Atualmente, a Abrapa tem 900 marcas parceiras e Busato diz que pretende chegar a 1.200 até o fim do ano.
— Estamos abrindo o programa para nossas parceiras. Elas é que vão exigir isso (sustentabilidade e rastreabilidade) do mercado (de fornecedores). Por isso é que o programa vai funcionar — avalia.
Na fase inicial do projeto-piloto, Reserva e Renner tiveram esse papel em relação a seus próprios fornecedores, convocando-os a se engajarem no processo. Alan Abreu, coordenador do comitê de diversidade do Grupo AR&C e especialista em sustentabilidade da Reserva, conta que a varejista já buscava transparência no processo quando fechou parceria com a Abrapa.
— Era uma forma de desenvolvermos mais nossa cadeia de fornecimento e conseguir levar essas informações com mais transparência para os clientes.
A empresa possui 60 lojas próprias e 62 franqueadas, além de mais dez Reserva Mini e duas Reserva Go.
— Antes mesmo de chegar ao guarda-roupa das pessoas, as peças já têm sua própria história — afirma o gerente geral de sustentabilidade da Renner, Eduardo Ferlauto.
A previsão é que a empresa lance neste semestre uma coleção reduzida de jeans feminino feito inteiramente com algodão rastreável. A rede tem 404 unidades no país.
Blockchain registra 'DNA' da produção
A tecnologia blockchain que permite a rastreabilidade do processo produtivo do algodão funciona como um banco de dados seguro e criptografado, onde os registros são permanentes e imutáveis. A integração e a tradução desses dados são possíveis apenas ao acessar a plataforma de interface ao consumidor, com informações do programa SouABR, da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa).
— Por oferecer segurança e autenticidade das informações, escolhemos essa tecnologia para entregar ao consumidor a transparência e a veracidade dos dados de rastreabilidade do algodão certificado — afirma Manami Kawaguchi Torres, gestora de relações institucionais do Movimento Sou de Algodão e consultora da Markestrat.
As empresas da cadeia produtiva de algodão investiram em conexão de APIs, que são adaptações capazes de permitir a conexão e comunicação dos dados requeridos ao sistema blockchain, e em adequações de processos.
De acordo com a Abrapa, cada parceiro envolveu fornecedores de suas soluções internas de controle de produção para desenvolver essas APIs.
Segundo o CEO da Dalila Têxtil, André Klein, a tecelagem parceira da Reserva gastou cerca de R$ 30 mil nas mudanças de processos internos e em TI, para se adaptar ao blockchain. Já para a Abrapa, o custo do projeto se restringiu às viagens feitas às empresas e ao gasto com tecnologia com o blockchain, conta, sem revelar valores, o presidente da entidade, Julio Busato.
Ele diz que 85% da produção de algodão nacional já possui o selo SouABR. Por isso, diz, não haverá escassez de produto certificado para as empresas que quiserem aderir ao programa.
— Acredito que abra mais mercados, porque se as pessoas querem tanto sustentabilidade e rastreabilidade, agora há um programa que faz isso de ponta a ponta, desde a semente até o cabide da loja.
Cerca de 70% da produção são exportadas, quase tudo para a Ásia. No ciclo 2021/22, a previsão é de alta de 19% dos embarques.
Requisitos para obter o selo SouABR
O Globo
https://www.abrapa.com.br/Paginas/Not%C3%ADcias%20Abrapa.aspx?notic...
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