Quando me convidaram para participar da edição de abril da revista, coestrelando ao lado da Gucci Zumi, a nova bolsa-desejo da Gucci, e também para falar de mim, me veio isto: colocar meu ego em contação da minha rotina, eis algo difícil de fazer. Uma das perguntas que faço dia sim dia não é: quem sou eu nessa bola azul? Rotular-me sempre foi algo desconfortável. Apresentar-me era, para mim, como me limitar. Mas como disse certo palhaço que virou deputado no Brasil: “Eu tentei fugir de mim, mas, aonde eu ia, eu estava lá”. Seja no check-in do hotel, seja no formulário de imigração, o que eu coloco no espacinho em branco? As pessoas, o mundo, os estranhos nele e até gente que eu amo definem o que sou por aquilo com que trabalho. Mesmo quando 90% do meu dia era tomado por castings e afazeres da vida de modelo, eu não me definia como algo que o dicionário classifica assim: “Substantivo de dois gêneros: indivíduo contratado por agência ou casa de modas para desfilar com as roupas que devem ser exibidas à clientela; manequim”.
Na minha carteira de trabalho, a nomenclatura do meu ofício é artista. Mas precisei dar um respiro fora das passarelas, uns 13 anos depois, para entender o porquê de modelo se encaixar aí. Na hora em que fui entender, já não vivia só dessa fonte. Tinha publicado meu primeiro livro, Preciso Rodar o Mundo – Aventuras Surreais de uma Modelo Real (veja bem, digo primeiro, pois acredito parir um segundo), e as revistas me chamavam de modelo-escritora.
Escrevi um livro para me livrar das histórias dentro de mim. Porque ninguém entendia o que era minha profissão direito. Porque meu pai precisava explicar que eu não tinha os milhões da Gisele. E, como não sei desenhar, ou me refreei a pensar que não esboço um traço além de um bonequinho de cinco palitos e um balãozinho na cabeça, resolvi abrir o coração e desengaiolar o que estava dentro.
Se existisse uma ordem hierárquica no canivete suíço, minha lâmina grande é modelo, o abridor de latas escreve e minha lâmina saca-rolhas é DJ.
A soma das emoções e histórias vividas se simplifica em música. Tocar é costurar ideias alheias – contos de Glasgow com poesia do Sumaré, sem pedir licença prévia ao artista. A nossa consciência limitada precisa dar nome. Não me chamaria de DJ ou sound designer – apesar de achar o último muito chique –, pois prefiro costureira. Eu costuro uma música na outra.
Quando era adolescente, meu sonho era ser VJ da MTV e não é à toa que o presente vem mais do passado, muito mais do que a gente especula. Aquela coisa de se ver num lugar e 15 anos depois seu entorno é todo qual pintado antes. A materialização dos desejos nunca é no tempo que prevemos ou idealizamos. A gente pensa, pensa, pede, pede, e logo afasta ou desiste. Sente, almeja e esquece, e logo se apresenta.
Foram quase dois anos à frente do MTV News, na zona de conforto de quem tem um salário. Meu contrato terminou no começo do ano e, do sofá interno do meu conforto, me peguei no escuro das incertezas. A partir do momento que eu acendo a luz, percebo. Daí começo a me relacionar com as coisas. O lugar no qual estou interagindo com o mundo não é necessariamente a correspondência do que estou vendo. É correspondente ao que estou sentindo. São meus instintos. E agora, vida de freela, me surpreenda!
Se estou em casa, sem emprego fixo, e recebo presente e o posto no Insta, logo me etiquetam de influenciadora. Tudo é meme. Todo alguém influencia outrem.
Prefiro ser mais inspirada do que influenciada. Logo, almejo o mesmo. Quando alguém está inspirando, está trazendo uma fala da alma. E, quanto mais profunda, mais universal ela é. Ela passa a falar de todos, do coletivo, e não só de si mesma. Quando você enxerga como uma expressão, as formas ou as personas são conhecidas, elas simplesmente serão falas da alma. A Michi modelo, ela nem existe. Quem existe é o meu coração. Eu me expresso pela forma de modelo, escritora, DJ, petsitter, alquebrada, que tem virtudes e defeitos, e procuro ser a perfeita imperfeição de mim mesma.
Se você tivesse que escolher entre virar nome de elevado, ponte, túnel ou samba -enredo, o que elegeria? A multi-task Zumi Rosow virou a Gucci Zumi. Eu fico pega entre samba-enredo e bolsa, afinal tenho a manha de colocar um universo dentro dela.
Ficha técnica
por Michelli Provensi
Modelo: Michelli Provensi
Fotos: Marcio Simnch
Beleza: Juliana Alcantara
Styling: Morgana Ludwig
Tratamento de imagem: RG Imagem
https://www.revistalofficiel.com.br/moda/show-me-your-gucci-side
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