Ambicioso. É o mínimo que podemos dizer do modelo de negócios daTonlé, que se propôs a gerar resíduo zero em todo o processo produtivo de suas roupas. Para tanto, a metodologia de modelagem zero waste não basta, dado que mesmo sendo bem utilizada, ela costuma ter um percentual fixo de excedente de resíduos/retalhos em torno de 3%. Assim, a estratégia da Tonlé foi pegar esse excedente de 3-4% e somá-los como carga na reciclagem de papeis.
Tonlé – Verão 2015
A técnica da modelagem de resíduo zero abrange diversas questões pertinentes ao projeto de produto e à produção. Há um custo alto a ser pago por ela: seu desenvolvimento leva muitas horas a mais para ocorrer – ao contrário da modelagem plana. Enquanto a modelagem plana oferece centenas de moldes gratuitos, de bases prontas, etc. (vide, por ex. uma revista comum como a Manequim), a modelagem de resíduo zero – ou zero waste (pra usar o termo original, no inglês) – tem pouca informação disponível. E torna cada projeto único. Isso envolve muitas horas refletindo o projeto. E, em tempos de moda dinâmica (para não dizer fast fashion, e sim para dizer os prazos de mercado para posicionar o produto), ela se torna inviável nas indústrias já estruturadas. Ao menos, a princípio, é inviável pensar uma coleção inteira com zero waste. Outro ponto é treinar/capacitar a equipe (estilistas, modelistas, cortadores e, principalmente, costureiras pilotistas) para compreenderem esses moldes. Em resumo, é outro raciocínio: mais complexo.
Tonlé – Verão 2015
Sendo assim, quando olhamos para a Tonlé, uma pequena empresa no Camboja (terra em que se produz Nikes e fakes com mão-de-obra hiper barata, inclusive vários casos de trabalho infantil e de condições análogas às de escravidão) toda comprometida em não gerar nenhum tipo de retalho, é de se admirar.
Tonlé – Verão 2015
A propósito, não, ainda não há uma empresa equivalente no Brasil. Por aqui, há pequenos empreendedores, estilistas freelancers e jovens recém-saídos da faculdade de moda que se aventuram pelo tema – mais por paixão, que por viabilidade e aceitação do mercado. Não há uma empresa de moda brasileira de pequeno ou médio porte focada em vestuário com modelagem zero waste. Tampouco há uma empresa de grande porte que faça coleções-cápsulas com modelagem zero waste.
Então, como a Tonlé consegue?
- Com foco no propósito, comprometimento e espírito de equipe, liberdade para a criação de novos modelos, tempo para pensar o projeto e – principalmente – confeccionando um vestuário próximo ao da modelagem plana, fornecendo uma moda casual que o mercado já aceita bem. Ou seja, não é porque se propõem a fazer moldes experimentais que o resultado do estilo deva ser algo como a escola belga ou a escola japonesa na história da moda.
Tonlé – Verão 2015
Por fim, podemos dizer que as soluções para os resíduos têxteis da Tonlé englobam tanto a logística reversa de ciclo fechado, quanto a de ciclo aberto, sendo quatro possibilidades robustas:
- desenvolver toda a coleção utilizando a técnica da modelagem de resíduo zero;
- sobras de retalhos são usadas em viés embutidos, bolsos internos, detalhes estruturais internos das roupas;
- recolher parte dos resíduos têxteis e destiná-los às recicladoras, para que se transformem em fibras, fios e tecidos reciclados;
- utilizar os resíduos têxteis como carga em papeis reciclados.
Papeis com fibras têxteis recicladas da Tonlé
