Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Verão 2025: os desfiles trazem a conexão entre mensagens e alertas

A diretora editorial de L'OFFICIEL Silvana Holzmeister aponta a conexão entre mensagens e alertas que saltaram da temporada internacional com o zeitgeist.

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Peças com ar-condicionado da Anrealage - Foto: Divulgação / Getty Images.

A passarela fala! E o que ela diz sobre o contemporâneo a partir das coleções para o verão 2025? A diretora editorial de L'OFFICIEL Silvana Holzmeister aponta a conexão entre mensagens e alertas que saltaram da temporada internacional com o zeitgeist. 

Moda como processo criativo consistente é reflexo do tempo em que vivemos. Essa é uma leitura que salta principalmente da passarela. Daí a importância do desfile e motivo pelo qual não pode acabar, ainda que levar a coleção para o reino da arte seja uma saída eficiente. Nesta temporada internacional, passarelas de Nova York, Londres, Milão e, principalmente, Paris desenharam o espírito do tempo presente. E o que ele diz? Bem, nada do que quem acompanha notícias sobre o mundo não saiba. O grande lance é ver como cada marca dialoga com o contemporâneo. Reforçar a própria identidade, pensar as crises climática e econômica e buscar a verdade foram temas ressaltados em alguns shows.

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Fila final da Chanel - Foto: Divulgação / Getty Images.

Segundo a Organização das Nações Unidas  (ONU), os últimos quatro anos foram os mais quentes já registrados. Relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM) de setembro de 2019 apontava àquela altura cerca de 1 grau Celsius acima dos níveis pré-industriais e perto do que os cientistas alertam que seria “um risco inaceitável”. O aumento das temperaturas alimenta a degradação ambiental, as catástrofes naturais, as condições climáticas extremas, a insegurança alimentar e hídrica, as perturbações econômicas e, até mesmo segundo a ONU, os conflitos e o terrorismo. O nível do mar está subindo, o Ártico está derretendo, os recifes de coral estão morrendo, os oceanos estão mais ácidos e as florestas estão em chamas. Bilhões de toneladas de CO2 são liberados na atmosfera todos os anos como resultado da produção de carvão, petróleo e gás. Tudo isso no mundo inteiro. Além de ser espelho da realidade, a moda é uma das indústrias mais poluentes, mas, como salientou o secretário-geral da ONU, António Guterres, “a emergência climática é uma corrida que estamos perdendo; entretanto, é uma corrida que podemos vencer”.

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Look Vetements - Foto: Divulgação / Getty Images.

Enquanto a situação não está sob controle, Kunihiko Morinaga, da Anrealage, busca um meio-termo para o conforto térmico. O estilista lançou a pergunta: “Com a crise climática aumentando as temperaturas em todo o planeta, como sobreviver ao calor?”. Para ele, a saída pode estar em suas roupas “cool-wear”, que têm a missão de refrescar o usuário. Lembrando paraquedas infláveis, as peças foram desenvolvidas em parceria com a Kuchofuku, empresa japonesa pioneira em roupas utilitárias providas de ar-condicionado – recurso já empregado nas jaquetas de guardas municipais de Tóquio, por exemplo. 

O estilista utilizou náilon hermético com não mais que 23 gramas por metro de tecido, feito de fios tão finos que medem cerca de um terço da espessura de um fio de cabelo. Na passarela, a resposta tecnológica foi evidenciada por meio de performances em que as roupas inflavam assim que as modelos acionavam um pequeno botão acoplado nas peças, fazendo surgir, também, modelagens esculturais divertidas. Outra proposta foi a impressão a jato de tinta sustentável Forearth da Kyocera, que não utiliza água, para criar motivos abstratos vibrantes que formam padrões mutáveis.

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Look de Issey Miyake - Foto: Divulgação / Getty Images.

É caminhando por práticas de baixo impacto ambiental que marcas comprometidas com ações sustentáveis ganham protagonismo. A pioneira Stella McCartney bradou: “Salve o que você ama”. Sua coleção foi 91% produzida com materiais sustentáveis. As jaquetas Bomber Puffball, por exemplo, foram feitas a partir de garrafas plásticas recicladas. Indignada com o uso de plumas, tendência que vem se renovando nos últimos anos, a estilista disse ao WWD. “Para mim, já era f-king time de pararmos de matar animais por moda. Cerca de 1 bilhão e meio de pássaros são mortos por causa da moda todos os anos.” 

O jeans azul, item básico, é um dos vilões do meio ambiente. Além de normalmente consumir muita água, desde a plantação até o beneficiamento, os produtores contam com o corante índigo, a única molécula conhecida por fornecer a cor específica. Embora o índigo em si seja naturalmente derivado de uma planta, a crescente demanda deu origem à popular versão sintética. Como não se dissolve na água, precisa ser alterada com produtos químicos agressivos para então tingir a roupa. Pesquisadores na Dinamarca divulgaram, no início deste ano, uma alternativa amigável: enzima. Ainda assim, é só o começo. Outro problema sério são as sobras e o descarte.

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Valentino - Foto: Divulgação / Getty Images.

Desde que assumiu a direção criativa da marca, há quatro anos, Glenn Martens vem se concentrando em práticas sustentáveis na Diesel. Além de utilizar cada vez menos água nos processos de lavagem e tingimento e do foco no jeans regenerativo e reciclado, para o verão 2025 ele criou para o cenário um casulo azul feito de quase 15 mil quilos de resíduos de denim triturados, material que no pós-desfile será reutilizado e ressignificado, como para o segmento automotivo. Em vez de trilha sonora convencional, uma narração contava a história do denim. Na coleção, peças artesanais feitas de sobras de fios de jeans ganharam destaque.

Na Issey Miyake, o diretor criativo Satoshi Kondo fez release e roupas da série kamiko modeladas em alfaiataria com fibras de hemp, que não exige pesticidas nem herbicidas para crescer saudável e forte. Fios de cânhamo também vieram misturados com lã e mohair, além de peças feitas em 100% hemp. O cenário montado no Parc Floral de Paris teve assentos feitos de cilindros de folhas de papel reciclado comprimidas, subproduto da plissagem do icônico tecido do projeto Pleats, Please!. Já para Rei Kawakubo, mente brilhante por trás da Comme des Garçons, uma única frase é capaz de descrever seu verão 2025, intitulado Futuro Incerto. Ela diz: “Confrontar um mundo cheio de incertezas com ar e transparência pode significar um tipo de esperança”. Fica o convite para cada um tirar suas conclusões, a partir da própria vivência, experiências e valores. O que pode significar se esconder ou se cercar de um escudo. É uma coleção abstrata, muito próxima da arte contemporânea.

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Diesel - Foto: Divulgação / Getty Images.

Sustentabilidade e crise econômica se cruzaram na passarela da Vetements. Abordando a necessidade de repensar o que a moda significa em um mundo em que os sistemas antigos estão desmoronando, Guram Gvasalia propôs uma coleção baseada no ethos de “fazer o novo a partir do velho”, retrabalhando peças existentes. A coleção fala de um futuro em que os consumidores não têm mais o desejo, ou os meios, para participar do consumo de luxo. Em vez disso, eles adotam uma mentalidade DIY, criando peças únicas e conceituais a partir do que resta.

Bottega Veneta e Miu Miu abordaram outra crise contemporânea: fake news. O diretor criativo da primeira, Matthieu Blazy, optou pelo lado lúdico – como uma criança olha o mundo – para falar do poder da sinceridade sobre o da estratégia. “Quando criança, existe a aventura do dia a dia – há uma sensação de que tudo pode acontecer, por mais fantástico que seja, e não estamos tão limitados por expectativas e convenções. A porta está aberta para a possibilidade de realidades estranhas e maravilhosas, cenários impossíveis que afastam a desilusão”, explicou sobre a coleção repleta de silhuetas desproporcionais, destruídas, amassadas e refeitas. O tecido parece couro, o couro parece tecido. A lã merino foi tecida como um jacquard imitando o denim lavado, enquanto a camisa listrada apresenta texturas irregulares e descontinuadas. Nos acessórios, o descartável se torna precioso. Sacolas de supermercado viram bolsa.

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Louis Vuitton - Foto: Divulgação / Getty Images.

Já Miuccia Prada, na Miu Miu, deu a deixa para a sua mensagem já no convite: dois torrões – açúcar e sal levando para o projeto Salt Looks like Sugar, desenvolvido pela artista Goshka Macuga. Na cenografia da sala de desfile exibia um filme com imagens de uma gráfica imprimindo exemplares de jornal que rodavam em um varal pelo teto do espaço. Era o The Truthless Times. A proposta foi trabalhar o conceito de verdade e representação convidando o espectador a entender o que é real no mundo de hoje. E essa verdade tem que ser encontrada por investigação individual em vez do caminho mais fácil: o que está disponível em fontes comumente distribuídas e acessíveis em vários canais. O texto sobre a coleção encoraja os convidados a refletirem de maneira crítica, argumentando que, no contexto da era pós-verdade, em que os limites entre fato e ficção estão cada vez mais confusos, entender quem controla as narrativas relacionadas aos acontecimentos se torna mais crítico. Questões de verdade, desinformação e manipulação estão intrinsecamente ligadas a questões de poder, liberdade de expressão e representação. 

Fendi, Moschino, Chanel, Louis Vuitton e Mugler – que está celebrando seu 50º aniversário – e Valentino com Alessandro Michele – a grande estreia da temporada – reforçaram seu DNA, revigorando a própria história e seus símbolos. Na Louis Vuitton, uma passarela de baús que emergiu do chão. Michele enfatizou códigos tradicionais da Valentino. Patrocinadora única de longa data e quem deu suporte para o projeto de restauração e remodelação do Grand Palais, Chanel retornou ao icônico espaço construído para a Exposição Universal de 1900. Ali, a equipe interna de estilo trabalhou em cima dos códigos da marca, buscando acrescentar jovialidade, diversidade e delicadeza.



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