Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Você é o que veste: Moda sustentável reflete valores dos consumidores

Para Thomás Benite, CEO e fundador da Narooma, vestir é uma forma de expressão e de se posicionar com relação aos nossos valores

O que faz as pessoas pagarem mais caro por um produto quando há um equivalente mais barato no mercado? Para Thomás Benite, CEO e fundador da Narooma, a resposta é simples: identificar-se com o valor da marca. Mas qual valor pode fazer o consumidor ver a compra como um investimento? E como se constrói esse valor?

Essas são perguntas complexas que só podem ser respondidas quando entendemos o que os consumidores querem: um propósito. Benite acredita que foi isso que construiu ao criar a Narooma, há 5 anos. Trata-se de uma loja online que aposta e vende sustentabilidade em forma de moda e escolha de vida. Entre as apostas da marca estão os tecidos à base de fibra de banana e tingimentos naturais feitos de elementos biodegradáveis.


Divulgação Narooma

De acordo com uma pesquisa divulgada pelo Cupom Válido em 2021, o Brasil é o nono país que mais gasta com roupas no mundo. Para comprar tanto assim, o consumidor brasileiro ainda é muito sensível ao preço, o que muitas vezes vai na contramão da sustentabilidade. Para vender mais barato, muitas marcas abrem mão da procedência e da qualidade dos materiais usados na confecção, bem como as condições de mão de obra empregadas na fabricação das roupas.

É nesse cenário em que aumenta a preocupação por uma indústria da moda mais consciente e preocupada com o impacto das roupas no meio ambiente e nos hábitos de consumo dos brasileiros.

A luz no fim do túnel é que além do preço baixo, que motiva 38% dos brasileiros a realizarem uma compra, outros dois fatores também são determinantes: variedade (33%) e qualidade (30%).

É justamente na qualidade que a Narooma coloca suas fichas. Para o fundador da marca, oferecer alternativas sustentáveis e de qualidade é um fator decisivo para conquistar novos consumidores no e-commerce, porém não é o único. Benite acredita que, além de vender moda sustentável, ele vende também um ideal: tornar o mundo um lugar melhor. E o mundo precisa urgentemente de ajuda para isso.

A indústria da moda emite, em escala global mundialmente, quase a mesma quantidade de gases responsáveis pelo efeito estufa que as economias da França, Reino Unido e Alemanha combinadas, segundo o relatório Fashion on Climate, publicado em 2020 pela McKinsey. A quantia corresponde a 4% das emissões de gases danosos em um ano.

A moda como posicionamento


Divulgação Narooma

A ideia de criar uma loja de roupas responsável e com um valor diferenciado surgiu enquanto Thomás trabalhava como Gerente de Marketing na Dafiti. Neste período, o executivo acreditava que seria interessante investir em um negócio próprio baseando-se em propósitos que combinassem com o ambiente da moda, que sempre foi sua paixão, porém de maneira mais sustentável do que é proposto pelas fast fashions do mercado.

Por ter trabalhado na Dafiti, o executivo se aproximou de um segmento de mercado em ascensão no e-commerce, com um potencial de crescimento e engajamento muito grande. Estando ele mesmo já engajado com o tema e adquirindo experiência, foi natural que o nascimento da Narooma se desse no ambiente digital.

O executivo até iniciou projetos de venda física, inclusive participando de feiras, mas foi no e-commerce que começou a ver a mágica acontecer. Um levantamento do Statista Digital Market Outlook, realizado em 2021, posiciona Moda como uma das categorias com mais de um terço da receita gerada de maneira digital ao redor do mundo (34% das vendas).

Chegar em uma estrutura funcional no ambiente digital falando sobre sustentabilidade e competindo com preços baixos não foi uma tarefa fácil. Benite partiu para o mundo dos estudos com uma visão de economia colaborativa e de upcycling – que envolve ressignificar itens que seriam descartados pela indústria, sobretudo da moda, tornando-os produtos de interesse popular através de uma abordagem artística e sustentável.

O ramo da moda é um dos mais tradicionais do varejo por um motivo óbvio: todos precisam vestir para conseguir participar do nosso modelo de sociedade, independente da classe, idade ou gênero. Mas mais do que uma necessidade básica, a moda é também uma representação artística e se apresenta como um posicionamento do indivíduo na sociedade.

O posicionamento buscado por Benite foi construir pilares que sustentassem uma visão pessoal de uma moda menos agressiva ao meio ambiente, evitando o desperdício e valorizando materiais sustentáveis. Além disso, a moda sustentável busca atingir pessoas que compartilham desses mesmos ideais. Assim nasce um e-commerce com propósito.

“Essa vontade de empreender com um propósito é o que define toda a experiência da marca”, explica Benite. “Não é só sobre vestir e ter um estilo, é sobre vestir de uma maneira melhor, mais sustentável, com uma visão de futuro que tenha envolvimento social”, ele completa.

Benite acredita que “uma das maneiras mais efetivas de mudar o mundo é repensar o jeito como consumimos”.

A venda de um estilo de vida

Um dos grandes diferenciais de sustentabilidade da Narooma é a curiosa escolha de material para a fabricação de uma das linhas da marca: fibras têxteis produzidas a partir da banana.

Benite promete que a fibra de banana não deve gerar impactos no apetite do consumidor, nem deixar qualquer cheiro característico da fruta nas roupas, uma vez que toda a produção é realizada de forma industrial e leva como matéria prima o caule da bananeira para a construção do tecido.

A ideia de usar fibras de banana para a confecção de roupas surgiu da própria indústria têxtil, que vem se modernizando e cada vez mais abraça a causa sustentável – embora ainda tenha um longo caminho pela frente. A partir da existência dessa possibilidade já no mercado, a Narooma aproveitou a oportunidade para desenvolver peças com essas fibras.

Ele destaca ainda que a produção sustentável é feita em cadeia, que passa da pesquisa para o desenvolvimento, e então para confecção, de maneira que nenhuma etapa é realizada somente pela loja.

“Muitas vezes olhamos para uma marca e achamos que ela sozinha está sendo responsável por toda aquela criação de produto sustentável”, explica. “Na Narooma, temos um trabalho muito legal em conjunto com a cadeia, que passa por fabricantes, tecidos, confecções e tudo isso está embutido na criação de uma peça que leva fibras de banana”.

“A fibra de banana é só mais uma inovação entre tantas no segmento têxtil, que tem despontado no mercado nos últimos anos. E esse sempre foi o nosso objetivo: ser uma marca que trabalha com essas inovações sustentáveis, sejam fibras novas ou certificações”, completa.

“Quando se tem uma grande gama de tecidos para escolher para fazer as roupas, acaba que muita gente escolhe pelo preço ou pela distância e disponibilidade de fornecedores, e nós não. Nós olhamos para o tecido se ele é gostoso de vestir e bom, além de ser o mais sustentável possível, seja algodão orgânico, viscose certificada e se a poliamida contida no tecido é biodegradável. São atributos que fazem da Narooma uma marca diferenciada”.

“Ninguém faz revolução sozinho”


Divulgação Narooma

Benite acredita também que a marca faz parte de um ecossistema e que a revolução no mundo da moda, e no da sustentabilidade como um todo, tem que ser feita por um conjunto de iniciativas.

A Narooma trabalha alinhada a grandes produtores de tecidos sustentáveis do Brasil, buscando colocar no mercado produtos que as pessoas gostem e, acima de tudo, vejam valor. A fibra de banana, inclusive, não é exclusividade da Narooma, mas uma sacada de mestre de quem está atento às inovações do ramo: “Estamos sempre procurando novas tecnologias de tecido, principalmente que sejam naturais e renováveis, tentando substituir o poliéster, principalmente. A banana você planta, colhe e planta de novo. A ideia é entrar em um ciclo mais sustentável com menos poluição”.

Além de pensar na produção com menor impacto para a natureza, uma iniciativa sustentável também deve pensar na vida útil do produto, seu tempo de utilidade para o consumidor e o que será feito desse material depois de descartado.

O executivo disse ainda que aposta nas novas tecnologias e acredita que em breve teremos ainda mais alternativas no mercado para a produção de tecidos sustentáveis, entre eles o cânhamo.

Muito além da fibra de banana

Depois de ter pensado na cultura, nas inspirações, em todo o processo produtivo com um viés diferenciado e sustentável e até mesmo no que vai acontecer com a roupa depois descartada, a empresa não poderia deixar de se preocupar com a entrega das encomendas.

Como Benite explicou, a sustentabilidade precisa ser aplicada a todas as etapas de desenvolvimento do e-commerce, o que se entende também às embalagens da marca. “Nós não usamos plástico em nossas embalagens, contrariando o que é muito comum no e-commerce, por ser mais barato. Nós usamos kraft e papelão”, ele explica.

A preocupação humana também entrou na equação. Lembra da pesquisa da Fashion Revolution? Cada vez mais também os consumidores se preocupam com o trabalho justo nas confecções (33%) e em não usar trabalho infantil (45%).

“Assim que entramos no mercado percebemos que ele é bem informal, mas conseguimos contornar isso com muito trabalho e pesquisa. Não está fácil no Google, ao procurar ‘confecção’, mas pouco a pouco, falando com as pessoas certas, achamos as confecções corretas. Você testa, visita, com algumas frustrações, mas tem muita gente boa, com muito talento nesse ramo no Brasil”.

O empresário acredita ainda que o ramo de confecções de roupas apresenta um grande potencial de crescimento e investimento que poderia beneficiar de diversas formas o mercado de moda. Um dos caminhos para isso é a conscientização da qualidade e do potencial das marcas brasileiras por parte dos consumidores, que podem encontrar peças boas, de qualidade e a um preço acessível sem precisar recorrer ao mercado externo.

“Mesmo quando falamos em trabalho informal, a culpa maior é da estrutura brasileira, e mesmo lá existem pessoas muito sérias com trabalhos muito bons”, argumenta Benite.

A principal iniciativa da empresa, no entanto, não é nem a fibra de banana, nem as entregas menos poluentes, e sim a parceria com a ONG SOS Amazônia, localizada no Acre, que recebe 1% do faturamento da Narooma. “É um dos nossos maiores acertos: conectar diretamente as nossas vendas às doações”, explica Benite. “Desde o começo da marca eu quis atribuir as vendas para alguma causa ambiental e, por termos um vínculo com a Amazônia, obviamente por ser brasileiro, me pareceu o lugar certo, vital para o planeta, para se investir e cuidar”.

A cereja do bolo da produção sustentável da Narooma é o tingimento natural, que soluciona um dos grandes fatores poluentes da indústria da moda. Na grande maioria das vezes, as roupas são tingidas com corantes artificiais, que vão parar no meio ambiente ou acabam se misturando à água usada na lavagem das peças, gerando prejuízos imensuráveis à fauna e à flora do planeta.

Como não poderia ser diferente, esta também se tornou uma preocupação da loja, que prioriza os ingredientes naturais para os corantes, sejam de frutas ou plantas, mas que não deixem partículas artificiais na lavagem. “Estamos tentando trazer esse conhecimento sobre corantes naturais para um mercado cada vez maior, para que mais pessoas saibam dessa possibilidade”, diz Benite.

O caminho das pedras

Uma das principais dificuldades encontradas no ramo da moda sustentável é se manter fiel às suas escolhas. Segundo Benite, é uma dificuldade que será encontrada por qualquer empresa em qualquer ramo de atividade que tente produzir de maneira mais sustentável. Isso porque as escolhas certas serão mais caras, mas a recompensa é um futuro melhor.

“Normalmente esse tipo de solução é inovadora, mas também mais escassa e cara. E às vezes o empreendedor tem ideias legais quando abre uma empresa, mas as contas chegam, a realidade bate na porta e é muito fácil se perder no caminho, na missão e no conceito”.

O executivo diz entender que nem sempre é possível continuar com a abordagem mais sustentável, mas uma das estratégias que podem ajudar é sempre ter em mente a motivação por trás da iniciativa e se apegar aos seus ideais. Além disso, se construída com diferenciais aderentes, o público consumidor que concorda com a missão da empresa estará ao lado do empreendedor, querendo compartilhar essa mensagem.

Para quem deseja seguir os passos da Narooma e investir em moda sustentável, o conselho do executivo é claro: tenha paixão. “É muito desafiador, as coisas são muito incertas, os cenários mudam muito rápido, mas isso acho que devemos perseguir aquilo que acreditamos. Gostaria que houvesse mais empresas nesse mercado, para ajudar a crescer o segmento de moda sustentável, pois quanto mais empreendedores nessa área mais temos a ganhar”.

Além de paixão, Benite defende que é preciso também ter resiliência, pesquisa e trabalho para fazer a moda sustentável dar certo: “as pessoas estão abertas para para novas marcas, para novas experiências, mas é preciso entregar um produto muito bom e é preciso dedicação total”.

“É importante sempre compartilhar a mensagem da empresa com o público e explicar o porquê de cada coisa, pois quanto mais você faz as coisas da maneira certa, com convicção, com paixão e acreditando nisso, mais as pessoas vão reconhecer seu trabalho, fazendo as coisas girarem e acontecerem”, conclui Benite.

Este conteúdo foi publicado originalmente na edição 70 da Revista E-Commerce Brasil.

https://www.ecommercebrasil.com.br/noticias/voce-e-o-que-voce-veste...

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