A ONG Fashion Revolution Brasil lançou, este mês, o 1º Índice de Transparência da Moda, uma versão nacional do Fashion Transparency Index com financiamento do Instituto C&A, parceria técnica do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas (FGVces) e apoio institucional da Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX). Como define a própria ONG, o Índice de Transparência da Moda é uma análise desenvolvida pelo Fashion Revolution CIC e indica em que medida grandes marcas da indústria estão divulgando publicamente suas informações em prol de uma maior prestação de contas.
O projeto existe globalmente desde 2016 e revisa e classifica marcas e varejistas de acordo com a disponibilização de dados públicos em seus canais de comunicação sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais em toda a cadeia de valor. Ou seja, o quanto as marcas sabem e estão dispostas a falar sobre suas práticas e as práticas de seus fornecedores.
O principal objetivo da iniciativa é pressionar marcas para que elas identifiquem, se responsabilizem e resolvam questões inerentes ao funcionamento do negócio, desde trabalho infantil na plantação do algodão ao descarte de toneladas de sobras têxteis de forma irresponsável. Para Carry Sommers, fundadora e diretora global de operações do Fashion Revolution, que marcou presença no lançamendo do índice na última quinta-feira, da mesma forma que as marcas globais tiveram que se adaptar rapidamente a esse ambiente em transformação, as marcas brasileiras farão isso em breve.
Nessa primeira edição, 20 das maiores marcas atuantes em território nacional foram analisadas: Animale, Brooksfiled, C&A, Cia Marítima, Ellus, Farm, Havaianas, Hering, John John, Le Lis Blanc Deux, Malwee, Marisa, Melissa, Moleca, Olympikus, Osklen, Pernambucanas, Renner, Riachuelo e Zara. Dentre elas, 75% pontuaram 30% ou menos, enquanto 40% das marcas ficaram com zero na pontuação. A pontuação média geral é de apenas 17%. Zara, Malwee e C&A estão entre as melhores pontuadas no índice.
O Fashion Revolution surgiu como um movimento que incentiva pessoas a se questionerem e questionarem marcas sobre “quem fez minhas roupas?”. Hoje, produtos de moda são produzidos de forma fragmentada, em centenas de etapas e em dezenas de fábricas com uma diversidade de fornecedores inacreditável se compararmos com o antigo modelo horizontal de produzir roupas, onde tudo acontecia dentro do mesmo prédio e era de total responsabilidade da marca.
Como o relatório explica, o atual sistema produtivo funciona na base da subcontratação: uma marca pode fazer um pedido de produção para um fornecedor, que divide o pedido e subcontrata o trabalho com outras fábricas. Isso acontece regularmente em toda a indústria e torna extremamente difícil monitorar aspectos relacionados aos direitos humanos e impactos ambientais. A subcontratação não autorizada faz com que os trabalhadores se tornem de fato invisíveis na cadeia de fornecimento, e é onde tendem a ocorrer os maiores riscos de violação dos direitos humanos e degradação ambiental.
É nesse momento que a transparência entra em ação. Ao dar mais visibilidade e ser mais transparente sobre as relações e condições comerciais, de trabalho e ambientais nas cadeias de fornecimento, o movimento acredita que os problemas podem ser resolvidos e as soluções podem ser encontradas mais rapidamente. Significa também que exemplos e histórias positivas podem ser ressaltados, compartilhados e potencialmente replicados em outros lugares.
“Quando falamos em maior transparência, estamos buscando a divulgação pública sobre as relações de fornecimento das empresas, bem como de suas políticas, compromissos sociais e ambientais, objetivos, metas, desempenho e progresso”, explica o relatório.
Por esse motivo, a metodologia revisa e classifica somente as informações e dados divulgados publicamente pelas próprias marcas e varejistas dentro de cinco seções: políticas e compromissos; governança; rastreabilidade da cadeia de fornecimento; avaliação e remediação de fornecedores; e tópicos em destaque. Nesta última, foram abordados temas atuais, como salários justos para viver, resíduos e empoderamento feminino.
Os pontos são concedidos apenas com base nas informações divulgadas publicamente através de canais como sites, relatórios anuais e demonstrativos financeiros. A pontuação máxima de uma marca pode ser 250 pontos e a mínima é zero: não respondeu ao questionário complementar e não tem nenhuma informação pública sobre os pontos mencionados acima. Uma observação interessante é que muitas das marcas analisadas publicaram informações novas no próprio site quando souberam que seriam incluídas no Índice.
Entre as mais bem pontuadas estão a varejista holandesa C&A com 53% dentre uma possibilidade de 100% (ou 250 pontos), a brasileira Malwee com 51% e a espanhola Zara com 40%. As outras gigantes do varejo Renner e Riachuelo ficaram na faixa de pontuação 21 – 30%. Das 20 marcas analisadas, 8 ficaram com 0%, ou seja, não disponibilizam nenhum informação sobre suas cadeias de fornecimento. São elas: Brooksfiled, Cia Marítima, Ellus, John John, Le Lis Blanc Deux, Melissa, Moleca e Olympikus.
Gênero e Raça
Uma confirmação do que já estamos falando há um bom tempo por aqui é o fato das marcas não serem sensíveis às desigualdades de gênero e raça: apenas 1 marca publica dados sobre a prevalência de violações trabalhistas baseadas em gênero nas instalações de fornecedores; apenas 1 marca divulga anualmente a diferença de salários entre os gêneros dentro da empresa; apenas 1 marca publica a divisão por cor ou raça, considerando dados de diferentes níveis hierárquicos e apenas 30% das marcas publicam uma estratégia e metas quantitativas relacionadas ao empoderamento das mulheres. Ao olhar para divulgação da lista de fornecedores, nenhuma inclui distribuição por raça ou gênero.
Questões Ambientais
Somente 2 marcas (10%) divulgam políticas direcionadas aos fornecedores sobre emissões de carbono e redução de energia, 3 (15%) revelam políticas sobre proteção da biodiversidade, 6 (30%) publicam políticas sobre o tratamento de efluentes e apenas 3 (15%) publicam políticas sobre o consumo de água nas instalações dos fornecedores e, por fim, 6 (30%) divulgam uma política sobre o gerenciamento de resíduos têxteis e reciclagem.
Somente 15% das marcas e varejistas publicam um relatório anual de sustentabilidade ou de responsabilidade social corporativa (RSC), no qual as informações não financeiras são auditadas ou verificadas por um terceiro independente.
Fundadora do Modefica interessada em movimentos sociais, é formada em Design de Moda, mas sempre teve um caso sério com o jornalismo. Escreve desde matérias e textos mais sérios, normalmente sobre sustentabilidade na moda, sua área de pesquisa, até artigos descontraídos. Às vezes compartilha suas receitas preferidas também. Você pode segui-la no Instagram e Facebook.
https://www.modefica.com.br/transparencia-moda-indice-fashion-revol...
Tags:
Bem-vindo a
Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI
© 2024 Criado por Textile Industry. Ativado por