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Indústria da moda debate a importância da maioridade de suas modelos

Insiders da indústria reforçam a importância de se pensar no bem-estar das profissionais, alertando para um cenário que vai muito além da idade.

Modelos na passarela de Christopher Kane (Foto: Getty Images)

Desde que o movimento #metoo estourou na mídia e nas redes sociais, mostrando que o assédio moral e sexual não é problema exclusivo da indústria do cinema instalada em Hollywood, novas iniciativas para assegurar o bem-estar no ambiente de trabalho também chegaram à moda.

Como explicou a top britânica Edie Campbell na última edição do Copenhagen Fashion Summit, "a modelo está em posição vulnerável: em um shooting, ela entrega o corpo, seu instrumento de trabalho, às pessoas em volta, confiando que elas vão respeitá-lo e se comportar da maneira adequada". Ao lado do diretor de casting James Scully, a modelo é uma das vozes que ajuda a promover uma nova (e ética) maneira de olhar para a indústria da moda.

Condé Nast, nome por trás de títulos como o da revista Vogue, já  Anunciou um código de conduta, visando assegurar um ambiente seguro para as modelos que posam para as páginas de suas revistas. Uma iniciativa similar uniu os grupos (rivais) LVMH e Kering, que criaram, juntos, um documento no qual se comprometem a trabalhar prezando pelo tratamento correto dos milhares de profissionais envolvidos em sua cadeia.

Seja qual for a área, um ponto em comum aparece em quase todas as discussões em torno do tema: a maioridade das modelos, que deveriam ter pelo menos 18 anos para trabalhar. "Embora não possamos reescrever o passado, podemos nos comprometer com um futuro melhor", escreveu Maya Singer, em uma matéria sobre o assunto no Vogue RunWay,  que reuniu ponto de vista de diversos playersda indústria da moda sobre a importância da discussão.

Entre estilistas, modelos e donos de agências, o discurso é unificado por uma máxima: a máquina toda precisa mudar o funcionamento, indo além da idade mínima para as modelos.

Com cada vez mais desfiles e castings cada vez maiores (há grifes que recrutam mais de 90 modelos em uma única temporada), a moda nunca demandou tantas new faces. No entanto, será que todas elas têm chance de firmarem uma carreira sólida? "É mais o fato de que o modelo de trabalho se tornou algo do tipo 'vamos jogar um monte de espaguete na parede, e de repente um vai colar e conseguir desfilar na Prada", comenta Angus Munro, diretor de casting.

Modelos na passarela da Dolce & Gabbana (Foto: Getty Images)

David Bonnouvrier, co-fundador e CEO da agência DNA – que, a partir desse mês, não contratará mais modelos menores de idade – leva a discussão adiante: para ele, o tamanho mais enxuto da indústria de outrora dava a oportunidade de estilistas passarem mais tempo com cada modelo, construindo relações fortes e saudáveis. Hoje em dia, segundo ele, modelos são recrutadas para caberem no tamanho de um vestido. "É um jogo de números", completa Chris Gay, CEO da Elite. "As marcas agora querem 40, 50 garotas num desfile, o que dá menos oportunidade para estilistas conhecerem cada talento individualmente. Não há mais tempo para provas demoradas. Mas sabe quem vai caber nos tamanhos de passarela? Adolescentes. Garotas que ainda não terminaram de crescer."

A importância de se ter modelos que já tenham atingido a maioridade tem diversos desdobramentos: Karen Elson, por exemplo, lembra-se de quando estourou na moda mas, por precisar tomar anticoncepcionais para controlar a acne da idade, viu seu corpo mudar, atingindo medidas maiores. No mesmo ano em que ganhou o prêmio de modelo do ano no VH1 Fashion Awards, a ruiva foi colocada de molho por uma temporada por estar "gorda demais": "Por algum motivo isso vazou para a imprensa, e virou notícia. Isso é simplesmente errado", relembra a inglesa.

"São crianças tentando entender e se encaixar num mundo adulto" observa Maria Bruce, psicoterapeuta que conversou com o Vogue Runway sobre o assunto. "O cérebro adolescente é sensível ao sobrecarego. E algumas das consequências psicológicas de lidar com estresses do gênero inclui baixa auto-estima, transtornos obsessivo-compulsivos, ansiedade e depressão", lista, ao falar sobre a pressão que as jovens enfrentam.

"A idade das modelos é apenas um componente de uma conversa maior. Se você tem uma indústria que emprega pessoas, precisa considerar as condições de trabalho, ponto. Não há motivo para a moda achar que está acima disso", opina a estilista Stella McCartney na reportagem.

Karlie Kloss (Foto: Getty/Frazer Harrison)


Encerrando a conversa, Karlie Kloss, que estourou aos 15 anos, fala sobre as mudanças na indústria de forma otimista. Para ela, é possível ver a moda caminhando para uma conversa mais inclusiva, abrindo mais espaço para as modelos terem sua própria voz. "Ao longo dos dez anos em que trabalhei na indústria, eu mudei. Meu corpo se desenvolveu, como o de qualquer mulher, assim como a minha mente", ela conta, apontando justamente este amadurecimento como o que faz dela uma modelo melhor atualmente. "Não é sobre se encaixar num padrão, é sobre o que você pode trazer para a mesa, o tipo de imagem que você projeta para o mundo. Não é só ser vista - é ser ouvida."

Como diria Chris Gay, afinal, nos dias de hoje a habilidade de comunicação, para uma modelo, é a nova "medida do quadril".

https://vogue.globo.com/moda/moda-news/noticia/2018/08/industria-da...

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