CNI participou do Brazil Offshore Wind Summit, no Rio de Janeiro, e debateu o potencial da tecnologia para o país, que está aprendendo a nadar nas águas da energia em alto mar.
Grandes turbinas de energia eólicas já fazem parte da paisagem da região Nordeste do Brasil. A partir da força do vento, essas estruturas, que lembram “ventiladores enormes”, geram energia elétrica. E podem gerar ainda mais, caso sejam construídas em alto mar – as chamadas usinas eólicas offshore.
Um estudo da Confederação Nacional Indústria (CNI) mostrou que essa forma de produção de energia pode fazer o Brasil aumentar em 3,6 vezes a capacidade total de produção de energia elétrica, alcançando o patamar de 700 GW, e turbinar a descarbonização da economia. Mas o que falta para o Brasil mergulhar nas águas da energia em alto mar?
Ao longo de terça (26) e quarta-feira (27), representantes do governo federal, dos estados brasileiros, da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica), de empresas nacionais e estrangeiras que desenvolvem projetos offshore, da Plataforma de Ação pelo Clima da ONU e especialistas participaram do Brazil Offshore Wind Summit, no Rio de Janeiro.
O evento, promovido pelo Global Wind Energy Council (GWEC) e a ABEEólica, e apoiado pela CNI, debateu os entraves para que o país avance nessa agenda e possa, quem sabe, liderar a produção mundial. Segundo os painelistas, há ao menos 5 desafios a serem superados. Veja os principais:
Para todos os participantes das discussões, a aprovação do marco regulatório da energia eólica offshore é o primeiro passo. Com isso, os fabricantes terão segurança para investir no país e ampliar a capacidade de fornecimento local para o desenvolvimento dessa indústria.
“São investimentos grandes, e as empresas somente vão fazê-los se houver um arcabouço regulatório seguro”, afirmou a gerente de Desenvolvimento de Negócios Renováveis da TotalEnergies, Fernanda Scoponi.
A empresa apresentou quatro pedidos de licenciamento de parques eólicos offshore na costa brasileira. Juntos, os projetos no Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Piauí, somam 12,1 GW em capacidade instalada. A petroleira já possuía outros 9 GW em três projetos de eólicas offshore em licenciamento.
Durante o evento, o diretor-executivo de transição energética da Petrobras, Maurício Tolmasquim, anunciou que a empresa vai instalar dois projetos-piloto até 2029 para testar a geração eólica offshore na costa do Rio Grande do Norte e do Rio de Janeiro como parte das iniciativas de pesquisa e desenvolvimento (P&D).
No fim do ano passado, a Câmara dos Deputados aprovou o marco legal das eólicas offshore (PL 11247/2018). O projeto de lei, que ainda precisa ser analisado pelo Senado, permite a outorga das áreas offshore por meio de autorização ou concessão do governo federal.
O secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Rodrigo Rollemberg, disse que tem a expectativa de que o PL receba o aval do Congresso Nacional no segundo semestre deste ano, assim como outras propostas que integram a agenda verde, a exemplo do hidrogênio verde.
Rollemberg também aproveitou o evento para propor a criação de um grupo de trabalho para ajudar na estruturação do quinto grupo de missões do Nova Indústria Brasil (NIB), focado na bioeconomia, descarbonização e transição e segurança energética.
“Temos condições de acelerar o processo de descarbonização das empresas de todo o mundo atraindo as plantas industriais para cá, o chamado powershoring. Não haverá uma transição energética justa se não houver uma transição de parte da produção industrial para os países em desenvolvimento”, concluiu o secretário.
O superintendente de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bomtempo, jogou luz para o projeto de lei de regulamentação do mercado de carbono que também aguarda apreciação no Congresso Nacional e que poderá incentivar ainda mais o desenvolvimento da energia eólica offshore no Brasil.
“Além de contribuir para as metas de redução de emissões, o mercado regulado de carbono tem potencial para atrair investimentos, criando oportunidades de negócios em âmbito nacional e internacional”, destacou.
O secretário de Transição Energética e Planejamento do ministério de Minas e Energia (MME), Thiago Barral, afirmou que a pasta vai começar a avaliar a regulamentação dos parâmetros para a seleção de áreas destinadas aos projetos de geração eólica offshore.
Embora o marco legal do setor ainda necessite da aprovação do Senado, Barral disse que os debates em relação a critérios para seleção de áreas e aspectos de planejamento, como transmissão e infraestrutura portuária já podem ser adiantados. A competição pelas áreas, de acordo com ele, vai considerar parâmetros além das propostas financeiras.
“Neste momento, a prioridade é aprofundar os parâmetros para priorização das áreas a serem destinadas para estudos de viabilidade dos projetos. Isso é fundamental para dar previsibilidade e mobilizar os atores”, apontou.
Para a presidente da ABEEólica, Elbia Gannoum, o anúncio da Petrobras sobre os projetos-piloto no Rio Grande do Norte e no Rio de Janeiro “vai ajudar muito no processo da regulamentação”.
“Ter uma empresa do governo do nosso lado, caminhando na mesma direção, traz o que chamo de efeito catalisador, para que a gente ajuste toda essa legislação necessária.”
Relatório do Global Wind Energy Council (GWEC), conselho global de energia eólica, apontou que os projetos instalados em alto mar acrescentaram 8,8 GW em nova capacidade em 2022, mantendo uma tendência de alta que bateu recorde no ano anterior, quando 21,1 GW foram ligados à rede em 2021. O GWEC prevê ainda que mais de 380 GW de capacidade eólica offshore sejam adicionados nos próximos dez anos. Para isso, estão previstos investimentos de até US$ 1 trilhão.
No Brasil, segundo levantamento do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), de janeiro de 2024, havia junto ao órgão 96 pedidos de licenciamento de projetos de eólica offshore, que somam 234,2 GW. Para que essas iniciativas sejam desenvolvidas, a cifra investida por aqui também será elevada.
De olho nesse desafio, a diretora de Infraestrutura, Transição Energética e Clima do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciana Costa, afirmou que a instituição vem trabalhando em algumas frentes para auxiliar no financiamento do setor. Enquanto aguarda a aprovação do PL, o banco mantém diálogos com os desenvolvedores.
“Uma das vantagens é que o setor conta com empresas muito robustas da área de energia e óleo e gás, o que traz maior confiabilidade na hora da concessão de crédito”, disse Luciana. "Desejamos que as mesmas regras feitas para a energia onshore, sejam feitas na offshore. A gente tem uma vantagem em relação aos outros países, porque a gente já fez no onshore e tem bagagem”, destacou o CEO Aeris Energy, Alexandre Negrão.
Os painelistas destacaram a importância de o país dar sinais de demanda por mão-de-obra e equipamentos para evitar ficar para trás na corrida por acesso aos componentes necessários para a geração de energia éolica offshore.
Eles ponderaram que o Brasil já demonstrou, no desenvolvimento da tecnologia onshore, ter expertise de integrar, de forma sinérgica e complementar, as cadeias de fornecimento com o setor de petróleo e gás instalada no Brasil.
Nesse ponto, Elbia Gannoum voltou a destacar o papel da Petrobras, além da regulamentação, no desenvolvimento de tecnologia e do mercado de fornecedores. A estatal fechou acordo com a empresa WEG para a construção de um aerogerador com capacidade de 7 MW. Será a maior turbina eólica fabricada no Brasil.
Elbia reforçou que o Brasil vai necessariamente desenvolver uma indústria nacional de eólica offshore pelas características da atividade, que tem equipamentos de porte gigantes que trazem desafios logísticos se não forem fabricados perto do local de instalação.
O Diretor-Geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Luiz Carlos Ciocchi, apontou que, ainda que a eólica offshore seja um projeto de futuro, é preciso “pensar no agora”.“A eólica offshore ainda não está no escopo do ONS, mas temos que nos preparar para esse futuro. Isso significa investir em capacidade técnica”, disse.
Pensando nisso, o Centro de Tecnologias do Gás e Energias Renováveis, sediado no Rio Grande do Norte e principal referência do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) no Brasil em educação profissional para as indústrias de energia e gás, informou que investirá quase R$ 500 mil na formação de profissionais na área de eletromobilidade e nas primeiras investidas em segurança do trabalho voltadas à qualificação nos futuros parques eólicos offshore.
Sob a óptica ambiental, o coordenador de Licenciamento Ambiental de Dutos e Sistemas de Transmissão de Energia do Ibama, Felipe Nabuco, apontou que, desde 2019, os servidores do órgão têm sido capacitados para trabalharem com essa nova tecnologia.
Apesar disso, ele contou que o Ibama ainda não tem servidores suficientes e estrutura para analisar todos os projetos de exploração de energia em alto mar que chegam ao órgão. De acordo com ele, é fundamental que o quadro de funcionários seja recomposto.
Por: Letícia Carvalho
Foto: Shutterstock e Letícia Carvalho
Da Agência de Notícias da Indústria
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