Bens de Orestes Quércia estão no centro da partilha de herança, que põe a viúva contra os dois primogênitos do político, nascidos quando ele ainda era solteiro.
Quércia, morto em 2010: divisão sem acordo (Foto: ILUSTRAÇÃO SATTU COM FOTO DE SÉRGIO
O complexo onde fica o Novotel Jaraguá, no centro, com 415 quartos, 25 salas para eventos, dois restaurantes e um teatro: 100 milhões de reais. A sede do Octavio Café, construída em um terreno de 1 600 metros quadrados na Avenida Faria Lima: 50 milhões de reais. A torre do bloco A do condomínio comercial Millenium Office Park, na Vila Olímpia, com sete pisos de 650 metros quadrados cada um: 55 milhões de reais. O prédio de treze pavimentos e 5 600 metros quadrados de área útil na esquina da Avenida Paulista com a Rua Frei Caneca, alugado para a Universidade Anhembi Morumbi: 70 milhões de reais. A retransmissora da Record em Campinas: 60 milhões de reais. A afiliada da Band em Santos: 36 milhões de reais. Catorze fazendas em Pedregulho, no total de cerca de 3 000 hectares, com plantações de cafés especiais, cana-de-açúcar, soja e banana: 200 milhões de reais. Uma mansão na Chácara Flora com piscina e academia de ginástica em um terreno de 4 300 metros quadrados: 7,5 milhões de reais. Uma casa com seis suítes de frente para o mar no condomínio mais sofisticado da Praia da Baleia: 6 milhões de reais. Quatro shoppings e galerias da rede Jaraguá, com unidades em São Paulo, Campinas, Araraquara e Indaiatuba e um total de 32 348 metros quadrados de área bruta locável: ao menos 300 milhões de reais.
Na lista acima, estão alguns dos principais bens de Orestes Quércia e quanto valem hoje, conforme estimativas de mercado. Ao morrer, em decorrência de câncer de próstata, na véspera do Natal de 2010, aos 72 anos, o paulista natural de Pedregulho (a 455 quilômetros da capital), que governou o estado de 1987 a 1991, deixou para trás uma fabulosa riqueza, hoje no centro de uma disputa entre herdeiros que parece longe de se encerrar. De um lado, estão a viúva, a médica oftalmologista Alaíde, de 55 anos, e os quatro filhos que teve com ele: Cristiane, 27, Andreia, 26, Rodrigo, 22, e Pedro, 20. De outro, figuramos irmãos Sidney, 47, e Fernando, 46, ambos frutos de relacionamentos com mulheres diferentes, vividos antes de seu casamento.
Na terça-feira (14), um encontro dos dois últimos com os advogados representantes de Alaíde terminou sem acordo para a divisão do patrimônio, avaliado pelas partes, nos bastidores, em 1,5 bilhão de reais. No fim da conversa, depois de meses em busca de uma solução não litigiosa, os primogênitos decidiram que não querem mais esperar: vão entrar com uma ação para pleitear seu quinhão nessa fortuna.
A proximidade das duas frentes de batalha praticamente inexistia antes da morte de Quércia, que pouco via os dois mais velhos. Sidney, 47 anos, só foi reconhecido em 2002, após exame de DNA. Apesar de o pai continuar distante, recebeu seu apoio financeiro para cursar direito na Unip de Campinas — antes, ganhava a vida como motorista. Ele atua na área trabalhista e mora provisoriamente com o filho e a mulher em uma das dezenas de apartamentos da herança.
Fernando, 46, também estudou direito, mas na PUC-Campinas. É bem-sucedido na área tributária, com escritórios em São Paulo e no interior. Casado e pai de três filhas, foi reconhecido oficialmente em1993, aos 27 anos, quando era delegado de polícia. Sua história, porém, difere da vivida por Sidney. “Tive algum contato com meu pai na infância”, lembra ele, batizado Orestes Fernando Corssini. Quando pequeno, morava em uma residência simples dada por Quércia à sua mãe, a cabeleireira Santa, em Mogi Mirim, e muito raramente recebia a visita paterna. O registro aconteceu quando a paternidade veio à tona na troca de farpas da campanha à Presidência da República em 1994. “A partir disso, passamos a nos falar um pouquinho mais.”
Quércia foi ao casamento do rapaz, em 1996, acompanhado de Alaíde. Quércia, que era considerado um solteirão convicto, casou-se com Alaíde em 1985, no regime de comunhão parcial de bens. Ele tinha 48 anos e era vice do então governador, Franco Montoro. Ela, 21 anos mais nova, terminava a residência médica.
Nascida em família rica de Araras, Alaíde é a inventariante no processo. Tem, portanto, o compromisso de administrar o patrimônio enquanto não há o rateio. Nada pode ser vendido nem doado até que tudo esteja acertado. Estima-se que já tenha movimentado 200 milhões de reais do faturamento das empresas desde o início de 2011.
Suas duas filhas estão bastante presentes à frente dos negócios. Formada em direito pela Faap, Cristiane nutria o sonho de virar cantora de jazz. Chegou a se lançar com o nome artístico de Cris Oak (“carvalho”, em inglês) e se apresentou em bares como o Baretto, do Grupo Fasano. Com a graduação em administração pelo Ibmec no currículo, Andreia herdou certa aptidão política quercista. É filiada ao PMDB e fez campanha para o senador tucano Aloysio Nunes em 2010. Ela recebeu um convite do governador Geraldo Alckmin para integrar a Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude, mas não aceitou. Rodrigo e Pedro por ora estão menos engajados nas empresas da família.
Os primogênitos Sidney e Fernando, que estavam cada vez mais próximos nos últimos anos, se uniram para ganhar força no embate pelo espólio— ambos advogam por si próprios na causa. Eles não comentam valores, mas confirmam que o primeiro passo foi começar a investigar qual é, afinal, o tamanho da montanha de dinheiro deixada pelo pai. A declaração de Quércia ao Tribunal Superior Eleitoral no ano de sua morte, quando concorreria ao Senado, não serviu para resolver a questão. Como é comum nesses casos, são registrados ali os valores presentes nas escrituras, muito inferiores à realidade de mercado.
O patrimônio declarado de 117 milhões de reais parece ficção. Só a Fazenda Nossa Senhora Aparecida, em Pedregulho, com 1 000 hectares, uma estrutura industrial de processamento de café e casa reformada por Oscar Niemeyer, vale, por baixo, 100 milhões de reais. “Não é que eles (Alaíde e seus filhos) tenham escondido parte do patrimônio”, diz Fernando. “Mas tivemos de apurar exatamente a função e o valor das empresas para chegarmos a um consenso”, complementa o irmão Sidney, que consultou cartórios de imóveis e especialistas em precificação.
Para encerrar logo as negociações, eles propõem ficar com 50 milhões de reais em propriedades cada um, valor inferior ao que, por seus cálculos, teriam direito. Parece pouco perto da cifra bilionária, mas essa aritmética não é simples. Como Alaíde se casou em comunhão parcial de bens, é dona de 50% do que Quércia amealhou após o enlace. O governador fez um testamento. Metade do que é seu, como diz a lei, tem de ser repartida pelos seis filhos, mas o restante, que poderia ser deixado para quem bem entendesse, ficou restrito aos quatro reconhecidos de berço.
Para incendiar ainda mais a história, Fernando e Sidney contestam aportes feitos, em vida, por Quércia diretamente para os quatro caçulas. Ele repassou a cada um deles uma cota generosa (hoje, avaliada em 10,8 milhões de reais) da empresa Sol Panamby Agroempresarial LTDA.“Toda doação precisa constar no espólio”, explica Álvaro Villaça Azevedo, titular da USP e diretor do curso de direito da Faap. “O Código Civil diz que a herança é considerada um bem indivisível e imóvel até a partilha.” Outro questionamento envolve a viúva, que depositou por alguns meses em sua conta particular o aluguel de 300 000 reais proveniente de um campo gráfico de 76 000 metros quadrados localizado em Osasco. Os reclamantes querem prestações detalhadas dessas operações.
O mesmo vale para o dinheiro oriundo da liquidação das mais de 1 000 cabeças de gado neloredo tipo PO (pura origem), que também não aparece na lista de bens. “Depois que ele morreu, foram feitos leilões para liquidar todo o gado”, confirma Paulo Horto, o principal leiloeiro do ramo no Brasil. Os valores desses animais podem ser vultosos, como mostra uma aquisição feita pelo próprio Quércia: ele pagou 1,5 milhão de reais pela vaca Açucena, em 2007.
O retorno foi certeiro. No mesmo ano, vendeu um embrião do animal por 173 000 reais. Seus investimentos eram bastante diversificados.“Tentei comprar dele a Rede Nova BrasilFM”, relata o apresentador Carlos Massa, o Ratinho, do SBT. “Ofereci 22 milhões, meses antes de sua morte.” Outra paixão era o ramo imobiliário. “Não conheci político que comprasse tantos imóveis”, afirma a corretora Valentina Caran.
Ela fez a transação de um edifício na Avenida Paulista em 2007, que ele comprou sem nunca ter visitado. “Quércia era do tipo que chorava para pagar menos, pedia descontos.” Os negócios continuam em expansão. O grupo é responsável pelo bairro planejado Primetown, em Campinas, cujo atrativo serão 600 unidades residenciais, entre casas e apartamentos.
Mesmo com muitas divergências, as partes envolvidas vinham evitando o litígio a todo custonos últimos meses. Alaíde chegou a oferecer 20 milhões de reais para cada um dos reclamantes, ou 40% do que eles desejam, proposta prontamente recusada. “Estamos em tratativas para uma composição amigável, mas é imprevisível quando isso vai acontecer”, afirma o advogado Sérgio Marques da Cruz Filho, representante da viúva. Ele trabalha no caso em parceria com Priscila Corrêa da Fonseca em defesa dos interesses de Alaíde, que colocou algumas condições para um possível acordo. Seja qual for a divisão, ela não abre mão da mansão na praia da Baleia, onde é vizinha de Abilio Diniz, da participação de 29% no Centro Empresarial de São Paulo, às margens do Rio Pinheiros, na Zona Sul, do Octavio Café e de outros negócios envolvendo o grão. Há um consenso entre as partes: não querem terminar o processo como sócios em nada. O imbróglio da herança, cheio de pontos a ser esclarecidos, faz eco à polêmica biografia política de Quércia.
Nascido numa família modesta, filho de uma lavradora e um pedreiro, e morto riquíssimo, colecionou insinuações de corrupção de adversários e processos por improbidade administrativa. A relação de suspeitas inclui de superfaturamento na compra de armas israelenses a irregularidades na impressão da Loteria Instantânea. Em 2009, foi condenado pelo Superior Tribunal de Justiça a ressarcir 69 000 reais aos cofres públicos por usar, quando governador, verba do estado na pavimentação de 10 quilômetros de asfalto em uma de suas fazendas de Pedregulho.“Ele era um homem muito honesto”, contesta o cunhado Rogério Ulson, irmão de Alaíde e prefeito de Analândia, no interior do estado.
Logo que se mudou para Campinas, aos 17 anos, Quércia ajudou o pai em uma pequena venda. Habilidoso, comunicativo e determinado, chegou a ter três empregos simultâneos: repórter policial do jornal Última Hora, locutor do programa Tangos na Madrugada, da Rádio Cultura, e encarregado no Departamento de Estradas de Rodagem (DER). Elegeu-se vereador em 1963, com 497 votos, a maioria de colegas da faculdade e familiares. Na época, ainda usava costeleta, fumava cigarro de palha e pertencia ao Partido Libertador. Pegou gosto por esse universo e não parou. Filiou-se mais tarde ao MDB, o único partido de oposição durante o regime militar, e participou de sua transformação no PMDB. Atraía aliados supostamente de ideologias opostas com habilidade singular. À revista PLAYBOY, em 1991, Fernando Henrique Cardoso, seu ex-colega de MDB, declarou: “É um limpa-trilhos. Passa seu trem e leva o que encontra pela frente: esquerda, direita, centro. Sua política não tem segredos. Dá empregos e consegue aliados”.
Apesar do engajamento eleitoral da filha Andreia, apenas Fernando tentou perpetuar o legado como candidato. Disputou eleições para a prefeitura de Campinas e para o cargo de deputado estadual, sem o apoio de peso de Orestes Quércia. Perdeu nas duas ocasiões.
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Tudo isso pra vender revista. Como disse o José, o cara ja morreu e já partiu dessa para melhor. Se o dinheiro é da família e ela esta se entendendo na justiça, pra que escrever isso?
Nasceu nu.....morreu nu ñ levou nada, deixou sim briga na família mundo podre.
Nasceu pobre e tornou-se bilionário na política.
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