A política fitossanitária do Brasil, considerando sermos uma potência na agricultura, é no mínimo pífia. Está basedada em conceitos antiquados de proteção contra pragas hipotéticas em barreiras internacionais e pouco se preocupa com nossos problemas reais.
Mas o que se pode esperar de um sistema ancorado (literalmente) em um Decreto-Lei do início do século passado?
E em algumas migalhas repassadas por convênios de um déspota (MAPA) desestruturado, coronelista e incompetente?
Com algumas poucas e isoladas iniciativas de maior sucesso, como o caso da ferrugem da soja no início da década passada, a política fitossanitária do Brasil não passa de um rascunho mal acabado.
É uma questão de tempo para que todo este sistema desmorone quando um problema fitiossanitário real aparece pela frente como no caso recente da Helicoverpa zea, cantado em prosa e verso por pesquisadores, agricultores e fitossanitaristas da Bahia e de todo o Brasil.
A fitossanidade no Brasil está ligada basicamente em estratégias de controle de pragas e não a gestão de seus riscos. Estamos na dependência do mercado com suas soluções tecnológicas como agrotóxicos ou transgênicos. O MAPA se comporta como uma agência de promoção destas tecnologias e não de regulação e gestão estratégica da política fitossanitaria. Por isso estamos vivendo crises seguidas e ouvindo sistematicamente que a nossa agricultura é um fenômeno apesar do governo e suas políticas. Apesar do MAPA e sua anti-política fitossanitária.
Que a estrutura do Ministério é uma piada, todos já sabem. Mas no ranking publicado pela revista Veja de 13 de março, vimos o MAPA como 7o colocado na quantidade de servidores. Mais de 24.000 funcionários para fazer esse trabalho? Que desperdício de dinheiro.
O caso da Helicoverpa, que ainda se cerca de dúvidas se de fato é zea, é o triste retrato recente de tudo isso.
A negação:
A primeira reação em instituições públicas com este tipo de autoridade e sem competências instaladas é negar o problema ou minimiza-lo. O MAPA não participou da discussão sobre a praga desde o início. Até por que os diversos segmentos públicos e privados não crêem na contribuição significativa do órgão nestas discussões. E estavam certos. Ao se deparar com o problema, devidamente contextualizado pela ADAB, órgão de defesa da Bahia que diga-se de passagem, que cresceu em importância e relevância nos últimos 10 anos, o MAPA, através de seu Departamento de Sanidade Vegetal - DSV, minimizou o problema, questionando se de fato estaríamos diante de uma emergência fitossanitária. Só com a pressão política assumiu-se a emergência.
O comodismo:
Como é de praxe nestas ocasiões surgem as soluções mágicas e cômodas. Autorize-se um agrotóxico para resolver o problema e pronto. Como se já não existissem dezenas de produtos registrados e que devido ao uso sistemático de maneira leviana e calendarizada, se tornam obsoletos. E ai, abre-se oportunidade para a conveniência. Registremos então um produto que vem sendo utilizado em outros países com eficácia para este problema: o Benzoato de emamectin.
Talvez poucas pessoas saibam, mas este produto foi indeferido no Brasil mesmo tendo sido pleiteado por uma grande multinacional, devido a suas características toxicológicas. Está no Diário Oficial da União.
O comodismo e a inércia do sistema de defesa fitossanitário, somado a inépcia de seus gestores transferem a pressão para a área de registro de produtos, para a ANVISA, para o IBAMA e para outra área do próprio MAPA.
A procura de um culpado:
A procura de um culpado é sempre uma saída interessante para tentar minimizar nossa culpa. Os ambientalistas estavam rezando para que isso acontecesse: os transgênicos são os culpados pelo aparecimento da praga. Da cartase coletiva sobre os transgênicos ao orgasmo fundamentalista dos ecoxiitas!
É claro que isso poderia acontecer. E aconteceu com a buva (Coniza bonariensis) no Rio Grande do Sul e sua resistência ao glifosato e agora novamente com o escape da Helicoverpa ao BT e aos novos ativos como as diaminas. Isso se deve a uma acomodação do agricultor às benécies da tecnologia. Nada mais natural, todos nós somos assim. E se houvesse uma política fitossanitária no Brasil, qualquer uma, talvez parte deste problema tivesse sido estratégicamente antecipado e quem sabe até evitado. Isso é matéria básica de agronomia, mas os gestores da fitossanidade do MAPA parecem ter gazetado esta aula.
O retorno a posição inercial:
Há de se esperar que com estas crises aprendamos a lidar com estes problemas. Até por que eles retornarão com outros nomes e outras ocasiões. Mas não é isso que veremos, não por enquanto. Veremos o sistema voltar a posição inicial, inerte e inoperante.
Não podemos dizer que isso é culpa de um Decreto atrasado. Ou de uma negligência das autoridades para a estrutura técnica do MAPA. Isso é culpa do gestor atrasado e preguiçoso, incompetente e descompromissado. Política pública se faz com boas e modernas regulamentações mas se faz principalmente por gestores inteligentes, pró-ativos e inovadores. E isso é pedra rara, raríssima, no MAPA e em boa parte do serviço público.
ALGODÃO
- Lagarta devora lavouras e provoca prejuízos de R$ 2 bilhões na Bahia.
A matéria abaixo mostra o desequilíbrio ecológico causado pela expansão das lavouras transgênicas. São efeitos previstos para os quais foram feitos alertas insistentes e fudamentados dentro e fora da CTNBio. Como manda a lógica mercantil e não a da ciência independente nem a da precaução, os prejuízos se multiplicam. Quem assumirá o prejuízo? Não é possível culpabilizar o produtor.
Problema semelhante já havia sido detectado na soja em 2012.
O aumento da incidência da lagarta Helicoverpa zea, mais conhecida como lagarta da espiga do milho, deve provocar prejuízos estimados em R$ 2 bilhões. Somente no oeste da Bahia, onde é maior a incidência da praga, as perdas devem chegar a R$ 1 bilhão, de acordo com a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa). Os prejuízos incluem o aumento dos gastos com inseticidas para controle da praga e as perdas de produtividade em lavouras de soja e algodão.
O presidente do Grupo Brasileiro de Consultores de Algodão, Celito Eduardo Breda, que também é diretor da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), calcula que as lagartas já dizimaram 2% da área cultivada com algodão no oeste baiano e prevê que, se não houver controle, as perdas nos próximos 30 dias podem alcançar 4% da produção esperada.
O alerta dos produtores baianos levou o Ministério da Agricultura a decretar emergência fitossanitária para controle da lagarta Helicoverpa zea. Breda, que é especialista no assunto, afirmou que não se trata apenas da lagarta da espiga do milho, também conhecida em outros países como lagarta da maçã do algodão, mas de várias espécies da helicoverpa, o que dificulta o controle das pragas que atacam as lavouras com voracidade. – Ainda não foi feito um trabalho científico para identificar as espécies – aponta.
Celito Breda explicou que o aumento da incidência das lagartas nesta safra se deve a uma série de fatores. Ele conta que um deles foi a ampliação do cultivo do milho transgênico resistente às lagartas, cuja toxina elimina 100% da espécie spodoptera (lagarta do cartucho) e apenas 10% da helicoverpa. Breda relata que antes, nos plantios do milho convencional, a lagarta spodoptera, que é canibal, contribuía para o controle da helicoverpa. Sem o inimigo natural, a população da lagarta da espiga do milho se multiplicou.
Segundo ele, a estiagem do ano passado e o cultivo sucessivo de várias culturas ao longo do ano contribuíram para a sobrevivência da espécie e o aumento da população da praga, que agora ameaça as lavouras. Uma das propostas apresentadas ao governo é o estabelecimento de um vazio sanitário entre agosto e outubro, pois a helicoverpa se hospeda nos mais variados tipos de lavouras, como feijão, trigo, cevada, braquiária, milheto, sorgo, melancia, laranja, abóbora e adubação verde (crotalária, guandu etc.).
Importação de inseticida
Os produtores de algodão estão pedindo ao governo a liberação emergencial da importação de inseticidas do grupo “emamectin benzoato”, que é proibido no Brasil, mas utilizado em países que têm controle rígido sobre agrotóxicos, como Estados Unidos, Austrália e Japão. Breda diz que a liberação é necessária para diversificar a gama de produtos utilizados no controle das lagartas e evitar que as pragas se tornem resistentes a determinado princípio ativo. Ele cita como exemplo o caso do inseticida Premio (Clorantraniliprole), da DuPont, um dos mais utilizados no controle da helicoverpa.
– Na safra passada utilizamos 70 ml do produto para controlar 90% da população da lagarta. Nesta safra com 150 ml controlamos apenas 70%.
Os produtores também defendem que o governo federal torne lei a obrigatoriedade de plantar áreas de lavouras convencionais, chamadas de refúgio, nas bordas das lavouras de transgênicos, para permitir a multiplicação dos inimigos naturais das pragas. Breda afirmou que a Austrália, após perder 75% da produção de algodão em 1997, por causa da incidência de pragas, tornou obrigatório o refúgio em 50% das lavouras de algodão. Ele diz que no Brasil o refúgio é feito de acordo com a indicação das empresas que produzem as sementes.
Fonte: pesticidebrazil.blogspot.com.br
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