Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Colombia Cria Fundo para Recompensar Informações sobre Contrabando de Têxteis

Fonte:|wharton.universia.net|

Um fundo de US$ 4 milhões criado pelo governo colombiano em janeiro deixou claro até que ponto a indústria têxtil e de vestuário da Colômbia foi afetada pelas importações ilegais. O dinheiro não será usado para a concessão de bolsas de estudo, de estímulo ao desenvolvimento tecnológico ou para a concessão de incentivos fiscais, e sim para recompensar quem der alguma informação que conduza a equipe de investigadores colombianos aos contrabandistas de roupas e tecidos.

O fundo foi divulgado com pouco alarde durante a Colombiatex, a feira anual de Medellín em que os fabricantes de fios, tecidos e roupas expõem suas mercadorias aos compradores estrangeiros. Foi, no entanto, uma notícia bem recebida num evento que, fora isso, caracterizou-se pelo tom sombrio das queixas dos expositores empenhados na luta contra a concorrência das importações de têxteis e vestuário da Ásia, sendo 50% delas fruto de contrabando ou de imitação de marcas cujos preços correspondem a uma fração apenas dos produtos similares feitos na Colômbia. Grande parte desses produtos ilegais viria da China, segundo informações da principal associação de empresas colombianas (ANDI).

Embora represente um fator de peso, não foi só a ameaça asiática que fez desandar o setor têxtil da Colômbia. Paula Trujillo, diretora de competitividade da InExModa, associação comercial da indústria que patrocina a Colombiatex, diz que a indústria da Colômbia também tem sua parcela de culpa, porque se acomodou sob a proteção de um sistema internacional de cotas e de um regime cambial favorável ao peso colombiano que durou vários anos, tendo investido muito pouco em novas tecnologias e mercados. "Não caminhamos na mesma velocidade e nem com a mesma agilidade de alguns outros países", diz ela. "Perdemos o pique e agora temos de nos reinventar."

O desfecho do embate entre essas forças é doloroso. As vendas de tecidos e de vestuário no país estagnaram em cerca de US$ 5 bilhões ao ano nos últimos anos, embora a economia de modo geral tenha crescido de forma sólida. O que mais preocupa é o fato de que as exportações de têxteis e de vestuário caíram 45%, ou US$ 1,1 bilhão no ano passado, ante US$ 2 bilhões em 2008, diz Carlos Eduardo Botero, diretor executivo da InExModa. Poucas empresas saíram incólumes, não escapou nem mesmo a Coltejer, fabricante de enorme prestígio no país cujo nome é também o do edifício mais alto de Medellín. A empresa conseguiu evitar a falência em anos recentes e agora, com enorme esforço, tenta novamente se consolidar. Os trabalhadores também estão pagando um preço alto. O setor de tecidos e vestuário da Colômbia fechou 35.000 postos de trabalho, ou 15% do total, no decorrer dos últimos dois anos, segundo informações da ANDI.

Uma década de extrema depressão

Será que a indústria colombiana de têxteis e vestuário, tão cheia de problemas, conseguirá voltar à rotina depois do que Álvaro Hincapie, presidente da Enka, de Medellín, maior fabricante de fios da Colômbia, chamou de "uma década de extrema depressão"? A exemplo de muitos outros profissionais do setor, ele diz que sua empresa está "sob ataque" das empresas asiáticas, tanto legal quanto ilegalmente, e que ela vem sendo expulsa dos mercados pela onda de produtos mais baratos desses fabricantes.

Fundada em 1966, quando diversas empresas colombianas somaram forças juntando-se a uma unidade local da dinamarquesa Akzo Nobel, a Enka experimentou em primeira mão os muitos altos e baixos resultantes da globalização do setor. No início da década de 1990, a empresa era a principal fabricante de fios de náilon e poliéster da região andina, uma estrela numa constelação de companhias colombianas bem-sucedidas no setor de têxtil e vestuário, a maioria das quais com sede em Medellín. Ajudadas então pela desvalorização da moeda nacional, o peso, e por um processo inovador de fabricação de resina, a Enka prosperou sob o sistema de cotas do Acordo de Têxteis e Vestuário passando a exportar para diversos novos mercados, dos EUA ao Brasil, abastecendo também os fabricantes locais.

Sua sorte, porém, começou a mudar, em parte, mas não só, por causa do término, em 2005, do sistema de cotas que durante um bom tempo deu a empresas como a Enka acesso irrestrito aos mercados dos EUA e da Europa. Em 2008, a Colômbia já estava inundada de fios de poliéster e de tecidos do Sudeste Asiático vendidos por um terço do custo de produção da Enka, lembra Hincapie. Parte deles chegou à Colômbia ilegalmente; outros entraram no país acompanhados da documentação exigida pela alfândega. O ponto mais baixo ocorreu em 2008, quando a Enka teve prejuízos em seu faturamento da ordem de 40% e foi forçada a interromper a produção de diversas linhas de poliéster. No final daquele ano, a empresa havia demitido 1.000 funcionários, ou 15% de sua força de trabalho.

De acordo com Hincapie, foram os fabricantes chineses, principalmente, que estiveram por trás da mudança da composição de forças. "Os chineses aproveitaram que a patente do poliéster havia expirado e aliaram esse fato à mão de obra barata do país para produzir enormes quantidades do produto. Os subsídios do governo permitiram erguer uma capacidade instalada muito maior do que era necessário para suprir o mercado chinês. Portanto, o que não conseguiam vender, eles despejavam no mercado internacional a uma fração do custo de fabricação", diz Hincapie.

Irrompendo em cena

Os especialistas em comércio consideram a entrada da China na Organização Mundial do Comércio (OMC), em 2001, um divisor de águas. Em 2000, a China exportava 7% dos bens produzidos no mundo; hoje, o país responde por 20% de todas as exportações mundiais. Têxteis e vestuário estão entre os setores mais afetados, observa Gary Hufbauer, especialista em comércio do Instituto Peterson de Economia Internacional de Washington, D.C., e ex-negociador de comércio do Departamento do Tesouro dos EUA. "Ninguém que participou da Rodada Uruguai, concluída em 1995, e que fixou os termos de ingresso da China na OMC, esperava que os chineses entrassem com tamanho furor no setor de têxteis e vestuário conforme fizeram", diz ele. "Foi muito além da expectativa geral e as regras até agora não conseguiram dar conta do fenômeno."

Conforme diz Hufbauer, a China administra um superávit comercial global de cerca de US$ 300 bilhões ao ano, ante US$ 20 bilhões há dez anos. "A Colômbia está sentindo a fisgada, mas não está só", diz.

Os efeitos de longo prazo dos prejuízos para a produção fabril e a perda de empregos na América Latina podem se tornar mais sérios do ponto de vista do desenvolvimento do que os desequilíbrios comerciais de curto prazo, observa Ariel Armony, diretor do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Miami. A perda, diz ele, da "vantagem competitiva" no setor de fabricação amplia a dependência dos países da América Latina das exportações de seus recursos naturais e de commodities necessárias ao equilíbrio de suas balanças comerciais. Contudo, privilegiar as commodities rouba a economia do "efeito multiplicador" benéfico da educação, da tecnologia e do emprego que a produção fabril proporciona, diz Armony.

"A América Latina pode ser empurrada para uma estratégia de desenvolvimento que remete a algo parecido com a dependência que havia no século 19 das exportações agrícolas", diz Armony. "Trata-se de um modelo anacrônico, uma vez que a economia deveria ser estimulada à diversificação nos segmentos de alta tecnologia e de inovação."

Amigos e inimigos

As ameaças que pairam sobre a indústria de têxteis e de vestuário da Colômbia estão mais próximas de casa por diversas razões. O país perdeu o cliente mais importante de suas exportações, a Venezuela, depois de um entrevero diplomático no ano passado entre os presidentes dos dois países. Em reprimenda, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, fechou a fronteira do país para a maior parte das importações colombianas e congelou US$ 800 milhões em dívidas de companhias venezuelanas a fornecedores colombianos, cerca de 1/4 desse total é devido a empresas têxteis e de vestuário. Embora o novo presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, esteja procurando melhorar as relações com seu vizinho volúvel, o comércio continua praticamente congelado e as dívidas pendentes.

A onda de contrabando asiático é também consequência de lavagem de dinheiro colombiano, que caminha de mãos dadas com o negócio multibilionário da cocaína. Para repatriar os lucros da droga, os traficantes colombianos compram mercadorias na Ásia e as embarcam de volta para casa. Chegadas à Colômbia, as mercadorias são vendidas com grandes descontos em relação aos preços pagos no exterior, o que representa um custo aceitável num negócio de margens elevadas. A prática conta com o apoio e com a cumplicidade de funcionários do setor portuário da Colômbia e com a frouxa vigilância da zona de livre comércio do Panamá, em Colon, por onde passa boa parte do contrabando. Armony, da Universidade de Miami, diz que 2/3 de algumas das mercadorias importadas pela Colômbia, entre elas têxteis e malas, perfumes, bebidas e sapatos, provavelmente chegam sob marcas falsas ou via contrabando.

Salvação ou inovação?

Armony, porém, diz que há esperança para o setor de têxteis e de vestuário da Colômbia graças, sobretudo, à ênfase que hoje se dá à inovação. "É bom ver que algumas pessoas reconhecem que não é só culpa da China, e que a discussão na Colômbia também está trazendo à tona questões de design, criatividade e a descoberta de nichos", diz.

Algumas empresas colombianas estão se voltando para linhas de nicho e estão também se aproveitando do fato de estarem mais próximas geograficamente dos EUA e dos mercados europeus do que a China. O Grupo Crystal, de Medellín, uma empresa de estrutura vertical integrada que administra todas as etapas do produto, do insumo ao varejo, está tirando partido do aumento do poder aquisitivo do consumidor latino-americano para ampliar sua rede de lingerie top de linha Punto Blanco em diversos países, inclusive no Chile e no Peru. Apesar da desvantagem cambial — o fortalecimento do peso diante do dólar encareceu em 30% os produtos colombianos para o consumidor americano desde 2006 —, o setor de vestuário está exportando roupas esportivas de linha jovem para a Target, Macy's e outros. Um dos motivos para priorizar esses mercados se deve à "resposta mais rápida" dessas empresas em relação às asiáticas, diz Luis Fernando Restrepo, presidente da Crystal. Ele diz que a empresa consegue atender a pedidos de grande porte dos varejistas americanos em 15 dias ou menos, o que corresponde a 1/3 do tempo de entrega normal para os pedidos feitos aos fabricantes chineses.

Outra vantagem, diz ele, é que a Crystal aprendeu a administrar seus pontos fortes. "Hoje somos uma empresa que valoriza sua marca. Os produtos que vendemos têm história", diz Restrepo. "Não tentamos mais simplesmente jogar no mercado uma montanha de produtos indiferenciados. Se fizermos isso, a China nos comerá vivos."

Há também o caso da Enka. Na tentativa de sobreviver, a empresa lançou uma campanha de revisão estratégica com o objetivo de criar 100 produtos novos e diferenciados. O resultado desse esforço se transformou na estrela da Colombiatex deste ano: um brim feito com 32% de fibra sintética produzida com garrafas plásticas recicladas e 68% de algodão, que a empresa fabrica através de uma joint venture com a Fabricato, também de Medellín.

Feito com garrafas PET (tereftalato de etileno) recicladas que são trituradas e transformadas em fibra sintética, o tecido tem o toque agradável e macio do jeans tradicional, com a diferença de que é feito com 32% de garrafas plásticas recicladas e 68% de algodão. A Enka investiu US$ 36 milhões na montagem de uma rede nacional de reciclagem em 19 cidades e na compra de maquinário antes do lançamento do produto. O setor de revestimento também é um grande mercado em potencial para o novo tecido, acrescenta Hincapie, da Enka.

De acordo com Oscar Zuluaga, presidente da Fabricato, a joint venture fez recentemente sua primeira venda: um negócio de US$ 160.000 com a fabricante de jeans Werner-Eickelmann, da Alemanha. A empresa está priorizando primeiramente a Europa devido ao mercado já consolidado de tecidos reciclados da região, mas pretende em breve negociar com a Levi's, de São Francisco, que já compra brim da Fabricato.

"As pessoas não apenas gostam do produto; elas apreciam também o fato de ser ele produzido com garrafas recicladas que, do contrário, levariam 100 anos para entrar em decomposição", diz Zuluaga. Embora o custo de fabricação do tecido seja 10% mais caro do que o brim 100% de algodão, Zuluaga diz que o consumidor ecologicamente consciente não recua diante dos preços mais elevados.

Como o tema deste ano da Colombiatex foi "Natureza convertida em tecnologia", o "Ekodenim", brim da Enka, não poderia estar em melhor ambiente. Muitos expositores mostraram novos produtos de fios e tecidos naturais, nativos ou reciclados dentro da ênfase "verde" dada aos tecidos e ao vestuário para atrair o consumidor preocupado com o meio ambiente.

De volta à moda

Hincapie, da Enka, diz que a empresa está a caminho da recuperação, e acrescenta que até a primavera todos os 1.000 postos de trabalho cortados no início da década serão restituídos em parte devido ao sucesso de mercado do novo fio Eko feito de garrafas recicladas.

A empresa hoje recicla um milhão de garrafas por dia e produz 800 toneladas de fibra sintética todo mês. Na primavera, a empresa abrirá uma segunda fábrica de reciclagem. Hincapie assinala que a crise dos anos recentes ajudou a plasmar um novo tipo de empresa que valoriza o "compromisso social e a consciência ecológica".

"A reciclagem é a base da nossa estratégia de longo prazo", diz Hincapie. "Ela abriu todo um novo portfólio de produtos para nós."

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