O economista britânico Jim O’Neill, do Goldman Sachs, foi o criador da sigla Brics, que uniu no mesmo bloco Brasil, Rússia, China e Índia. Alguns suspeitaram, à época, que a inclusão do Brasil era só para tornar a sigla mais interessante, fazendo uma analogia com “tijolos” em inglês. Mas o fato é que o mundo viveu um período de euforia com o Brasil e o analista do banco de investimentos americano virou uma espécie de guru.
Nunca me convenceu. Seu otimismo para com o Brasil sempre me pareceu um tanto infundado. Cheguei a ler seu livro e vi ali uma ingenuidade impressionante, uma crença de que o governo petista faria as coisas certas para deslanchar os investimentos. O’Neill ignorava a essência do PT, a arrogância ideológica de Dilma, e a verdade de que nossa prosperidade era ilusória e insustentável, calcada apenas nas commodities e no crédito sem lastro.
Antes tarde do que nunca. Em entrevista à Folha, O’Neill reconhece que errou, atitude nobre, e aponta justamente para a falha: o governo Dilma se mostrou intervencionista demais, dirigista demais, usando o estado como alavanca do progresso e fomentando o consumo com base no crédito. Diz ele:
Um problema real é que o governo brasileiro se tornou muito chinês, ao tentar direcionar demais a economia. O famoso efeito crowding-out (queda do investimento privado diante de uma política fiscal expansionista do Estado) ocorre no Brasil. Uma consequência disso se vê na situação fiscal do país. Se o governo continuar tentando controlar tudo, gastar mais e mais, e não usar o dinheiro de forma eficiente, o déficit nas contas [como o registrado em setembro, o primeiro em nove anos] será o novo normal para o Brasil.
[...]
O papel do BNDES na concessão de empréstimos é algo muito chinês, e é também um grande problema. Junte-se a isso o fato de que ela não fez nada para tornar o Brasil mais competitivo globalmente, fora do negócio de commodities. O que o Brasil tem para oferecer ao mundo, além de matéria-primas? Qual seu diferencial? Não há apoio a um ambiente de tomada de risco, à inovação de alto impacto. Só commodities não é suficiente.
Ou seja, copiamos o que há de pior no modelo chinês, seu calcanhar de Aquiles, o setor financeiro totalmente concentrado no estado, com decisões políticas em vez de econômicas. É preciso, afirma, dar mais espaço à iniciativa privada, permitir o funcionamento mais dinâmico dos mercados, estimulando novos negócios. O Banco Central deveria ter mais independência também.
Ele não está confiante de que tais mudanças ocorrerão. Quem já foi mordido por cobra tem medo até de linguiça. Mas muitos investidores estão apostando em uma guinada pragmática de Dilma no segundo mandato. Doce ilusão. É colocar o desejo acima da razão, o sonho acima da experiência, e ignorar novamente o fator ideológico da presidente.
Quem insistir no otimismo infundado irá quebrar a cara uma vez mais. Os mesmos fatores que justificavam meu “pessimismo” (realismo) lá atrás, no auge da euforia com o Brasil, continuam válidos. No fundo, pioraram. Agora teremos uma situação externa bem mais difícil, e Dilma não resistirá à tentação de insistir nos mesmos equívocos, quiçá dobrar a aposta. Quem viver, verá…
Rodrigo Constantino
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Agora teremos uma situação externa bem mais difícil, e Dilma não resistirá à tentação de insistir nos mesmos equívocos, quiçá dobrar a aposta. Quem viver, verá…
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