Os últimos desdobramentos da crise europeia têm abalado a confiança do exportador brasileiro. O termômetro desse temor é a procura por seguro de crédito à exportação, que aumentou nas últimas semanas, conforme as empresas brasileiras buscam se proteger de um eventual calote de seus clientes europeus. O crescimento da demanda vem se refletindo principalmente nas coberturas de risco político, depois que a crise da dívida passou a influir nos rumos de eleições na Europa.
Segundo as duas maiores seguradoras que atuam no ramo, a francesa Coface e a espanhola Cesce, a demanda por seguros para cobertura de transações comerciais com países europeus cresceu, em média, 20% nos últimos 30 dias. Ainda que a demanda suba, as seguradoras enfrentam o desafio de não repetir o que aconteceu na crise de 2009. Na época, elas pisaram no freio na concessão de coberturas justamente quando a procura por proteção crescia, temendo que o contágio da crise causasse perdas sistêmicas.
Ainda pouco popular no Brasil, o seguro de crédito cobre uma empresa contra o risco de inadimplência ou atrasos de pagamentos da venda de produtos e serviços realizada a prazo, tanto no mercado local como para exportação. Além da proteção comercial, o seguro pode vir com cobertura para riscos políticos, como o de um país decretar moratória, inconversibilidade da moeda ou bloqueio do câmbio, impedindo o cliente de pagar.
"Com a oposição ganhando todas as eleições na Europa, cresceu o temor das empresas de que haja uma guinada política forte na região", diz Daniel Nobre, diretor comercial da Cesce Brasil.
As exportações para países da União Europeia respondem por 20% das vendas brasileiras ao exterior, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. De janeiro a abril, as exportações brasileiras somaram US$ 74,646 bilhões, dos quais US$ 15,763 bilhões para países da União Europeia.
O desafio é equilibrar a demanda das empresas com a prudência das seguradoras. "Estamos sendo mais criteriosos na análise dos riscos", diz Marcele Lemos, presidente da Coface. Ela afirma que a seguradora reduziu seus limites de exposição à Grécia e que tem sido mais "conservadora" nos limites de cobertura para Itália, Espanha, França e Portugal.
Na Cesce, o único corte foi nas coberturas para a Grécia desde o ano passado. Já para os outros países da região, a seguradora tem procurado dar proteção parcial a alguns riscos, em vez de coberturas integrais.
Marcele lista os setores europeus que pedem atenção especial. Na França, na Espanha e na Itália, por exemplo, os setores com maior risco de inadimplência são os de agronegócios, têxtil, e de transportes. Na França e na Itália, preocupa também o segmento de construção e na França e Espanha, o setor químico. Em Portugal, nenhum setor escapa do crivo.
A sangria dos bancos europeus é outro fator importante para entender a procura maior pelo seguro de crédito. Com o aperto de crédito dos bancos europeus, que estão tentando se recapitalizar, as empresas locais têm menos acesso a capital de giro e mais chances de ficarem inadimplentes. Já para as empresas exportadoras brasileiras, há menor oferta de carta de crédito, um instrumento de proteção contra inadimplência, concorrente do seguro de crédito.
Mesmo com o recente aquecimento da demanda, o mercado de crédito à exportação tropeçou no primeiro trimestre. O faturamento foi de R$ 2,8 milhões de janeiro a março, queda de 15,5% ante igual período do ano passado, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep). Em 2011, a receita do segmento foi de R$ 32,7 milhões, avanço de 12,2% sobre 2010.
"O problema na Europa despertou a percepção de risco em várias empresas e responde por uma parte do crescimento do mercado no ano passado", diz Eduardo Marques, diretor técnico da corretora de seguros Marsh. O primeiro trimestre de 2012 foi o quinto período consecutivo de aumento na frequência de pagamento de indenizações de seguro de crédito na zona do euro, segundo estudo da Marsh.
"Acompanhando o aumento das indenizações, as aprovações de limite de seguro de crédito se deterioram significativamente, especialmente na zona do euro", aponta o relatório da corretora.
Mas não é só a Europa a responsável pela maior demanda por seguro de crédito. A vizinha Argentina também tem contribuído. "A demanda de seguro para exportação ao país tem crescido nitidamente", conta Marcele. Com as recentes medidas de restrição à importação tomadas pelos "hermanos", a Coface tem oferecido cobertura para riscos comerciais, mas tem pensado duas vezes antes de cobrir risco político. "Não se sabe se pode vir medida nova que possa prejudicar os negócios", diz Marcele.
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