Advogadas especializadas em direito digital esclarecem sobre as discussões em todo o mundo sobre Inteligência Artificial.
No próximo dia 28 (domingo), é comemorado o Dia Internacional da Proteção de Dados. E, com o rápido avanço da Inteligência Artificial (IA) e suas aplicações nos negócios, a necessidade de regulamentação para lidar com questões éticas e legais relacionadas ao seu uso torna-se premente. Patricia Peck, advogada e especialista em direito digital, considerada uma das maiores autoridades do Brasil nesse campo, acredita ser fundamental o debate do tema.
Para ela, a complexidade na regulamentação da IA no Brasil reside na necessidade de estabelecer regras comuns e diretrizes de uso em meio à diversidade social e cultural do País. “A missão é complexa devido aos diversos tópicos envolvidos, como questões éticas, transparência dos sistemas e a redução de riscos relacionados ao mau uso e aplicação maléfica, especialmente no contexto da criminalidade”, lista.
A especialista destaca a importância, no entanto, de fomentar a inovação sem sufocar a evolução da IA, tal qual aconteceu com tantas outras tecnologias de consumo disruptivas como Uber e Spotify. Ao mesmo tempo, alerta, a ética necessita de regras específicas e rígidas para evitar discriminação. “A realidade social do Brasil, marcada por desigualdades, impõe a necessidade de uma abordagem única para a classificação de risco dos sistemas”, pontua.
A evolução constante da IA também se torna um desafio adicional. Com o surgimento das IAs generativas e a complexidade das redes neurais, a criação de leis modernas que não caiam em obsolescência é uma tarefa complexa. A velocidade do desenvolvimento da tecnologia impõe a dificuldade de criar uma legislação que se mantenha relevante ao longo do tempo, alerta.
Segundo Patricia, a propagação da IA em atividades nocivas, como deepfakes, golpes e crimes virtuais, destaca a urgência de uma regulamentação eficaz. A falta de regulamentação, reitera, pode levar a ações irresponsáveis, ignorando aspectos cruciais como privacidade e proteção de dados pessoais.
A especialista aponta para a necessidade de um “sandbox regulatório”, permitindo o aprimoramento da IA por meio de seu uso, mas destacando a importância de requisitos pré-estabelecidos, como princípios de ética, privacidade e segurança.
Gisele Truzzi, CEO da Truzzi Advogados, complementa ao dizer que as discussões sobre a regulação da IA no Brasil começaram em 2020, com o Projeto de Lei (PL) nº 21-A. Contudo, esse projeto teve baixa participação social e recebeu muitas críticas. Três anos depois, surgiu o PL 2338/2023, que propõe melhorias significativas no cenário da IA no país.
“Este novo projeto de lei visa aperfeiçoar o desenvolvimento, a implementação e o uso responsável de sistemas de IA. O objetivo é proteger os direitos fundamentais e assegurar a implementação de sistemas seguros e confiáveis, beneficiando a sociedade, o regime democrático e o progresso científico e tecnológico”, comenta.
Além disso, ela explica que existem diferenças entre “Regular a IA x Regular o Uso da IA”. Ao falar em regulamentação da IA, é importante entender que não estamos regulamentando a própria IA, mas sim o uso dessa tecnologia. É fundamental garantir o uso ético e responsável da IA, com mecanismos de governança adequados. “As principais áreas de incidência legislativa são: tutela de direitos, mecanismos de governança e autoridade competente. No Brasil, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) se colocou à disposição como órgão competente para atuar à frente da regulação de IA.”
As discussões em torno da regulamentação têm seus prós e contras. Gisele cita alguns deles:
Patricia menciona que poucos países têm leis específicas para IA, citando China, EUA, União Europeia e Japão. Ela destaca o modelo setorizado adotado pelos EUA, aproveitando agências reguladoras existentes, como uma abordagem promissora para o Brasil. Recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE), além de experiências internacionais e pesquisas acadêmicas, podem servir de base para a criação de uma legislação nacional.
A especialista ressalta a velocidade de desenvolvimento da IA como um desafio na aplicação prática das regulamentações propostas. A constante evolução das ferramentas de IA exige emendas e atualizações frequentes da legislação. Ela também destaca a necessidade de uma lei eficaz e territorialmente abrangente, acompanhando a dinâmica internacional da IA e adaptando-se ao seu constante desenvolvimento.
Diferenças da regulação de IA nos países. Fonte: Gisele Truzzi
*Com colaboração de Laura Martins
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