Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Fraudes generalizadas ameaçam ascensão econômica chinesa

Fonte:|g1.globo.com|

Falsificação em pesquisa científica prejudica escalada econômica do país.
Pressão sobre pesquisadores produziu avalanche de teses plagiadas.




Fang Shimin, escritor também conhecido pelo codinome Fang Zhouzi, dirige o site New Threads, que expôs mais de 900 pesquisas falsas em Pequim
Fang Shimin, escritor também conhecido pelo
codinome Fang Zhouzi, dirige o site New Threads,
que expôs mais de 900 pesquisas falsas em
Pequim (Foto: Du Bin / The New York Times)

O talento de Zhang Wuben como vendedor é inquestionável. Através de programas de televisão, DVDs e um livro best-seller, ele convenceu
milhões de pessoas de que berinjela crua e feijão verde em grande
quantidade podem curar lúpus, diabetes, depressão ou câncer.

Na China, os pacientes com doenças graves pagam US$ 450 por uma
consulta de 10 minutos e recebem uma receita. Mas com Zhang isto não é
possível, pois ele é um dos profissionais mais populares da tradicional
medicina chinesa e sua agenda está lotada até 2012.

No entanto, quando o preço do feijão verde disparou nesta primavera, os
jornalistas chineses começaram a ir mais fundo. Eles descobriram que,
ao contrário do que dizia, Zhang, 47, não pertence a uma família de
médicos (o pai era tecelão). Ele tampouco se formou pela Universidade de
Medicina de Pequim (sua única educação formal foi o curso por
correspondência feito depois que ele perdeu o emprego em uma indústria
têxtil).

A revelação das credenciais falsas de Zhang provocou discussões sobre
as práticas desonestas que permeiam a sociedade chinesa, criticadas por
estudiosos e por seus próprios cidadãos.

Tais práticas incluem trapaças de alunos nos vestibulares, intelectuais que promovem pesquisas falsas ou plagiadas e indústrias de laticínios
que vendem leite envenenado para crianças.

As últimas revelações são ainda mais chocantes. Após um acidente de
avião, que matou 42 pessoas no nordeste da China em agosto, foi
descoberto que 100 pilotos da companhia áerea haviam falsificado seus
históricos de vôo. Em seguida, houve o escândalo de Tang Jun, o
milionário ex-chefe da Microsoft na China e uma espécie de herói
nacional, que falsamente afirmou possuir doutorado do Instituto de
Tecnologia da Califórnia.

s países estão imunes a fraudes de alta repercussão. O doping nos esportes e a corrupção em Wall Street são os escândalos do momento nos
Estados Unidos. Mas na China, a falsificação em uma área em particular -
a educação e investigação científica – já se alastrou a ponto de
prejudicar a escalada econômica do país.

A China investe recursos significativos na construção de um sistema de
ensino de nível internacional e pesquisas pioneiras em ciências e
mercados competitivos. Além disso, o país tem alcançado notável sucesso
em redes de computadores, energia limpa e tecnologia militar.

Mas a falta de integridade entre os pesquisadores está atrapalhando seu
potencial e prejudicando a colaboração entre pesquisadores chineses e
seus colegas de outros países.

"Se não mudarmos nossas maneiras, seremos excluídos da comunidade
acadêmica global", declara Zhang Ming, professor de relações
internacionais na Universidade Renmin, em Pequim. "Precisamos nos
concentrar em buscar a verdade, em vez de seguir a agenda de algum
burocrata ou satisfazer o desejo de lucro pessoal".

A pressão feita sobre os pesquisadores pelos administradores das
universidades públicas para que publiquem artigos em revistas
científicas - uma medida de inovação - produziu uma avalanche de
pesquisas plagiadas ou fabricadas. Em dezembro, um jornal britânico
especializado em formações de cristais anunciou a retirada de mais de 70
trabalhos de autores chineses, cuja originalidade e rigor estavam sendo
questionados.

Em um editorial publicado no início deste ano, a revista médica
britânica “The Lancet” advertiu que pesquisas falsas ou plagiadas
representavam uma ameaça à promessa do presidente Hu Jintao de
transformar a China em uma "superpotência em pesquisas" até 2020. "Está
claro que o governo chinês deve pegar este episódio como exemplo para
revigorar os padrões de ensino de ética em pesquisa e para a realização
das pesquisas em si", relatou o editorial.

Destroços do aviçao fabricado pela Embraer que se acidentouna China. Destroços do avião que se acidentouna China em agosto: investigação revelou que
100 pilotos da companhia aérea haviam falsificado seus históricos de voo
(Foto: Reuters)

Software detecta plágios
Em setembro, uma coletânea de periódicos científicos publicados pela
Universidade de Zhejiang, em Hangzhou, reacendeu a fogueira ao divulgar
os resultados de uma experiência de 20 meses com um software que detecta
plágios.

O software, chamado de “CrossCheck”, rejeitou quase um terço de todos
os trabalhos, sob suspeita de que os conteúdos tenham sido pirateados a
partir de pesquisas anteriormente publicadas. Em alguns casos, mais de
80 por cento do conteúdo foi considerado cópia.

A editora das publicações, Zhang Yuehong, enfatizou que nem todos os
artigos plagiados eram originários da China, mas se recusou a revelar
mais detalhes."Alguns eram da Coreia do Sul, Índia e Irã", disse ela.

Os artigos especializados em medicina, física, engenharia e ciência da
computação, foram os primeiros na China a utilizar o software. “No
momento, eles são os únicos que o utilizam”, acrescentou ela.

As descobertas não surpreendem se considerarmos os resultados de um
estudo recente do governo, em que um terço dos 6.000 cientistas de seis
das maiores instituições do país admitiram que haviam se envolvido com
plágio ou com a invenção de dados para pesquisas. Em outro estudo com 32
mil cientistas, feito no verão passado pela Associação Chinesa para
Ciência e Tecnologia, mais de 55% disseram que conheciam alguém que já
tenha cometido fraude acadêmica.

Fang Shimin, um escritor sensacionalista que se tornou um famoso
defensor da integridade acadêmica, diz que o problema começou com o
sistema universitário estatal, no qual burocratas nomeados politicamente
têm pouca experiência nas áreas que supervisionam. Devido à grande
concorrência para bolsas de estudos, auxílio moradia e aperfeiçoamento
de carreira, os funcionários baseiam suas decisões no número de artigos
publicados.

"Mesmo os artigos falsos contam, pois ninguém realmente os lê", afirma
Fang, que é mais conhecido pelo pseudônimo Fang Zhouzi. Seu site “New
Threads” já desvelou mais de 900 casos de falsificação, alguns
envolvendo reitores de universidades e pesquisadores de renome.

Quando o plágio é exposto, colegas e líderes estudantis geralmente
defendem o acusado. Fang explica que isso acontece em parte com o
objetivo de preservar as relações e proteger a reputação da instituição.
Mas o outro motivo, segundo ele, é mais preocupante: são poucos os
acadêmicos idôneos, que podem apontar o dedo para acusar os outros.

O resultado é que muitas vezes os plagiadores não são punidos, o que
acaba incentivando esta prática, afirma Zeng Guoping, diretor do
Instituto de Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade de
Tsinghua, em Pequim, que ajudou na pesquisa feita com 6.000 acadêmicos.

Ele cita o caso de Chen Jin, um cientista da computação que já foi
célebre por ter inventado um microprocessador sofisticado, mas que na
verdade utilizou um chip fabricado pela Motorola, riscou o nome da
empresa e alegou ser invenção sua. A revelação da fraude, em 2006,
causou constrangimento na comunidade científica que o apoiava.

Chen perdeu seu cargo na universidade, mas nunca foi processado."Quando
as pessoas vêem que os acusados continuam dirigindo seus carros
vistosos, o mau exemplo está dado", declara Zeng.

5 mil revistas acadêmicas
O governo chinês prometeu resolver o problema. Editoriais de jornais
estatais têm condenado frequentemente o plágio. No mês passado, Liu
Dongdong, membro do Politburo que supervisiona as publicações, prometeu
fechar algumas das cerca de 5.000 revistas acadêmicas, cujo motivo único
para existir, segundo dizem os estudiosos, é proporcionar uma saída
para professores e doutorandos que queiram inflar suas credenciais de
publicação.

Os jornalistas Fang Shimin e Fang Xuanchang já ouviram promessas e
ameaças antes. Em 2004 e 2006, o Ministério da Educação anunciou
campanhas contra fraudes, mas os dois grupos responsáveis pela solução
do problema ainda não aplicaram nenhuma punição.

Nos últimos anos, os dois jornalistas investigaram Xiao Chuanguo,
urologista inventor de um procedimento cirúrgico que visa restaurar a
função da bexiga em crianças com espinha bífida, uma deformação
congênita da coluna vertebral, que pode levar à incontinência e,
insuficiência renal e até à morte.

Em uma série de reportagens e postagens em blog, os jornalistas
revelaram discrepâncias no site de Xiao, incluindo alegações de que ele
havia publicado 26 artigos em revistas de língua inglesa (eles
encontraram apenas quatro) e que havia recebido um prêmio pelo conjunto
de sua obra da Associação Americana de Urologia (o prêmio foi dado para
um ensaio que ele escreveu).
Mas ainda mais preocupante, segundo eles, foram as afirmações de que a
cirurgia apresentava uma taxa de sucesso de 85 por cento. Dos mais de
100 pacientes

entrevistados, nenhum relatou ter sido curado de incontinência, e 40
por cento disseram que sua saúde havia piorado após o procedimento, que
incluia a mudança de itinerário de um nervo da perna para a bexiga.

Independente do que tenha ocorrido, Xiao ficou furioso. Ele entrou com uma série de processos por difamação contra Fang Shimin e anunciou que
iria se vingar.

Recentemente, os dois jornalistas foram brutalmente atacados nas ruas de Pequim - Fang Xuanchang por bandidos com uma barra de ferro e Fang
Shimin por dois homens armados de spray de pimenta e um martelo.

Quando a polícia prendeu Xiao, em 21 de setembro, ele confessou a contratação de homens para realizar o ataque. A razão, disse ele, foi a
vingança contra as revelações que impediram sua nomeação para a
prestigiada Academia Chinesa de Ciências.

Apesar da confissão, a Universidade de Ciência e Tecnologia de Huazhong, onde Xiao atua, não pareceu disposta a tomar qualquer ação
contra ele. Em um comunicado, os administradores disseram que ficaram
chocados com a notícia de sua prisão, mas que iriam aguardar o desfecho
dos processos judiciais antes de romper os laços com ele.

Tradução: Claudia Lindenmeyer

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