Em entrevista exclusiva a estilista paulistana fala sobre moda nacional, criação e desafios do setor.
A criação marcante e madura contrasta com a juventude da estilista de 33 anos que consolida uma carreira meteórica no cenário da moda nacional. A paulistana Fernanda Yamamoto assina um estilo contemporâneo e bem particular que pode ser decifrado nos materiais nobres, nos processos artesanais como as dobraduras que lembram origamis e na modelagem elaborada. Arte e identidade abastecem sua concepção criativa que passa ao largo de tendências para encontrar refúgio nas referências que a emocionam. Logo, o resultado do seu trabalho é uma extensão dos sentimentos que perduram na roupa atemporal.
O reconhecimento da crítica transborda na carreira de curto tempo. Nasce com marca homônima em 2008, depois da formação em Moda pela Parsons de Nova York, e desde então estabelece uma rotina intensa de projetos, coleções e participações em eventos nacionais e internacionais. A agenda de trabalho deste mês de julho traz a designer pela primeira à Paraíba. Fernanda participa nos dias 4 e 5 da comissão julgadora do concurso Fashiontech - Novos Estilistas (promovido pela Estação da Moda, órgão ligado à Prefeitura da capital paraibana). Na ocasião, também realiza palestra no Sebrae-PB sobre o seu processo criativo.
O cenário da moda brasileira, a última coleção inspirada nas obras do brasileiro Hélio Oiticica (1937-1980) e do mexicano Luis Barragán (1902-1988), entre outras abordagens, integram o conteúdo que dá pano pra manga na entrevista exclusiva concedida ao site Nas Entrelinhas.
1.Qual o seu olhar sobre a atualidade da moda brasileira?
Vejo o cenário da moda nacional de duas maneiras. Uma bem otimista, porque a moda no Brasil vem acontecendo de fato. Isso pode ser visto no número de faculdades abertas e nos eventos que integram o calendário. Mas, também percebo com certa preocupação. Sobretudo, para uma marca se estabelecer no mercado, como as menores e mais autorais. Não é nada fácil. Há uma falsa glamourização.
2. Um manifesto reuniu estilistas no final do SPFW pedindo à presidente Dilma diálogo para uma política que acolha o segmento e viabilize um mercado mais competitivo. Qual o maior desafio da moda nacional?
Existe uma dificuldade de competitividade no mercado. Isso implica, por exemplo, no acesso à matéria-prima que é cara. A nossa indústria têxtil está morrendo porque não consegue competir com a produção da China. Daqui a pouco não teremos mais tecidos produzidos aqui. É triste ver a migração do papel da empresa produtora para importadora... Depois, tem toda a questão de tributos. É preciso chegar a alguns termos que concorram para uma competitividade justa. Não se trata de protecionismo.
3. A moda agora integra o Plano Nacional de Cultura, do Ministério da Cultura. Como essa medida fortalece o setor?
Considero uma questão muito importante. A moda nesse contexto é uma vitória e estabelece um canal de identidade, inspira outro olhar. Essa conquista e valorização se deve muito ao Ronaldo Fraga. Tem muito empenho da parte dele.
4. E como pode funcionar enquanto canal de inclusão social?
A moda também pode exercer esse papel com um valor enorme. Um impulso à cultura local, a riqueza dos trabalhos manuais. É uma maneira de aproximar e valorizar esses universos e as pessoas que deles fazem parte.
5. O seu processo criativo valoriza o artesanal, com um estilo bem particular de formas e texturas. Você passa ao largo das tendências?
Tento fugir das tendências... Não pesquiso. Claro que estou inserida dentro do sistema, onde a indústria têxtil realmente trabalha com cores que fazem parte desse cenário. Mas, tento não seguir e não me deixar influenciar.
6. As dobraduras estão presentes nas suas peças e lembram origamis. É uma assinatura da sua descendência japonesa?
Sim. Acho que elas compõem uma assinatura inconsciente. Aparecem praticamente em todas as coleções. Isso também se deve ao fato de eu trabalhar com a modelagem diretamente no manequim. Vou ajustando, fazendo dobras no tecido... Não acontece com a intenção de identificar minha origem.
7. Suas coleções trazem inspirações em temas fortes, carregados de arte, história e identidades culturais. O que motivou o Verão 2013 nas obras dos artistas Helio Oiticica e Luis Barragán?
Sempre tem uma relação pessoal. Nessa última coleção, a inspiração na obra de Barragán surgiu de uma viagem recente que fiz ao México. O trabalho dele mexeu comigo, me tocou, me sensibilizou. Em realidade, comecei com Hélio Oiticica e consegui estabelecer uma unidade com as duas referências. Curiosamente, há uma aproximação na obra deles através de formas, planos, cores, jogo de luz e sombra. A inspiração é sempre o ponto de partida para a criação, mas sempre tem algo muito pessoal, autoral.
8. O design e o artesanato constituem potencialidades na integração socioeconômica. Esse é o caminho da moda?
Esse é um caminho bem brasileiro para uma consolidação da moda. É um desafio enorme unir o contemporâneo com o feito à mão de forma harmoniosa, porque não pode ser só o artesanal pelo artesanal.
9. O conceito de "moda verde" ganha espaço. Você adota alguma prática de produção sustentável?
Na minha visão, a sustentabilidade de uma coleção tem a ver com menos desperdício. É você acompanhar desde o corte à produção final. É observar como a matéria-prima é empregada no processo, em que condições as pessoas envolvidas trabalham. É importante que seja elaborado de forma justa em todos os aspectos.
10. O Brasil é um dos países com o maior número de escolas de moda. Que profissionais estão chegando ao mercado e quais os horizontes possíveis?
Não vejo um cenário muito positivo. São muitos profissionais e poucas oportunidades para quem quer trabalhar com estilo. Não existe espaço para todos. É uma ilusão. As escolas têm que pensar em formar mais técnicos em modelagem, costura... A maioria está focada apenas no estilista. É necessário ampliar outras áreas de atuação no mercado profissional.
fonte:http://www.nasentrelinhas.com.br/noticias/pano-pra-manga/272/fernan...
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