Fonte:|Valoronline|
Às vésperas de mais uma rodada de discussões bilaterais, empresários argentinos reforçaram o lobby para pedir a manutenção das barreiras que frearam a importação de produtos brasileiros no ano passado. Setores como o têxtil, a indústria de couro e o de material eletrônico levaram ao Ministério da Produção da Argentina seus pedidos para que as licenças não automáticas de importação sejam mantidas, apesar da pressão contrária do governo brasileiro.
"Manifestamos as nossas preocupações sobre a possibilidade de o Brasil insistir com o pedido de liberar licenças. Não queremos que se fechem as importações, mas que se administre o comércio", disse o presidente da Câmara de Manufaturas de Couro, Raúl Zylbersztein, depois de encontro com a ministra Débora Giorgi. O representante da indústria de vestuário para bebês e crianças, Hugo Benyakar, adotou um tom mais dramático. "Graças a esse mecanismo, pudemos manter os postos de trabalho. É devido à política comercial deste governo. Se tivéssemos continuado como nos anos 90, ninguém existiria."
O lobby parece ter surtido efeito. A ministra Débora Giorgi, em entrevista ao jornal "Página/12", defendeu a aplicação da medida e sinalizou que o governo argentino não pretende abrir mão das licenças neste ano. Segundo ela, no entanto, a "situação melhorou" e a emissão das licenças está ocorrendo em prazo inferior a 60 dias, como informou o Valor no mês passado.
Uma das principais reclamações da indústria brasileira era que a análise dos pedidos de licenças vinha superando esse prazo - o máximo permitido pela Organização Mundial do Comércio (OMC) - e chegando a 240 dias, como no caso de calçados. Por causa dos atrasos, o Brasil resolver dar o troco e incluiu produtos argentinos no mesmo mecanismo de licenciamento, em outubro de 2009.
"Pudemos reduzir as tensões", afirmou Débora Giorgi, comentando as medidas adotadas pelos dois lados depois da última reunião entre os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Cristina Kirchner, em novembro. Nesta quinta e sexta-feiras, uma delegação brasileira composta pelos ministros Celso Amorim (Relações Exteriores), Miguel Jorge (Desenvolvimento) e Guido Mantega (Fazenda) dará continuidade às negociações comerciais, em Buenos Aires.
Se confirmou a normalização dos procedimentos de análise das licenças, Débora Giorgi defendeu os acordos "voluntários" de exportações, pelos quais fabricantes brasileiros concordam em restringir seus embarques à Argentina para não enfrentar uma barreira oficial. Setores como o de calçados e de têxteis têm entendimentos válidos até o fim de 2010 e as declarações da ministra soaram como uma tomada de posição a favor da renovação dos acordos entre empresários.
"Há setores onde a necessidade de acordos é a ferramenta fundamental para eliminar a assimetria. Há outros que não precisam de acordos, mas da aplicação de licenças como [uma forma de] monitoramento, que estarão [liberadas] em menos de 60 dias", afirmou Giorgi. Para ela, o objetivo das políticas implementadas pelo governo é construir "uma indústria mais forte e mais integrada". "Quando isso ocorrer, o déficit [para a Argentina], que é a manifestação dessa situação, tenderá ao equilíbrio", completou.
Para o economista Dante Sica, diretor da Abeceb.com e ex-secretário de Indústria, o déficit da Argentina com o Brasil voltará a crescer este ano e estimulará a manutenção do mecanismo das licenças não automáticas. "O governo está liberando as licenças e cumprindo os prazos, mas a minha sensação é de que não vai mudar essencialmente a forma de administrar o comércio exterior", disse Sica, lembrando uma regra tácita entre os sócios do Mercosul, segundo a qual um não complica a vida do outro em período de eleições. Por isso, ele acredita que a Argentina não atrasará mais a emissão das licenças, o que criaria um constrangimento para o governo Lula, mas também não reduzirá substancialmente a lista de produtos sujeitos ao mecanismo.
Levantamento feito pela consultoria do ex-secretário revela que, a partir do segundo semestre, o Brasil voltou a recuperar a fatia do mercado argentino perdida para a China, nos setores atingidos pelas licenças. De janeiro a junho, quando elas começaram a ser aplicadas, o recuo das importações argentinas de calçados brasileiros foi de 32% e de calçados chineses foi de apenas 9%. Depois das represálias do Brasil, a situação se inverteu.
Embora tenha continuado a haver queda das importações, devido à contração da economia, a queda foi bem maior no caso da China (54%) do que no do Brasil (21%). O mesmo movimento se repetiu nos setores de móveis, têxteis, freios e na linha branca. "Quando o Brasil levantou a voz e começou a protestar mais, o principal alvo da Argentina passou a ser a China e houve liberação mais rápida das licenças ao Brasil", afirmou Sica.
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