É como dizem: “nasce uma mãe, nasce uma culpa”. Pesquisa realizada pelo Ipsos mostra que 46,4% das mães se sentem culpadas por viver sob a pressão das ideias, o imaginário e o ideal da maternidade criados ao longo de décadas. Quando os filhos chegam, colocamos a meta de que precisamos ser boas mães a todo custo, altamente produtivas no trabalho e em casa.
Resultado? As cargas mental e física são enormes.
A verdade é que quando a maternidade começa, apesar de ser uma jornada única e incrível, respaldada por resiliência e altruísmo, nenhuma literatura, curso ou conversa com familiares e amigos é capaz de preparar a mulher. A maternidade, devo reconhecer, é bonita, mas, muitas vezes, solitária, dura e invisível.
Um dia longe dos filhos, seja para trabalhar ou tirar uma folga, é, muitas vezes, um martírio. Nos culpamos, nos sentimos menos mães, uma responsabilidade que foi jogada sobre nós e que a carregamos até hoje. Diversos vieses inconscientes rodam a mente materna. Maternidade e trabalho ainda são vistos como incompatíveis. Existe o mito de que é impossível conciliar carreira e maternidade e que para ter sucesso na carreira é preciso terceirizar por completo a criação dos filhos.
É por isso que, cada vez mais, as mulheres esticam o desejo de serem mães em prol da carreira, mesmo que isso signifique chegar ao incontrolável limite do relógio biológico, abdicam por completo o desejo de aumentar a família ou deixam de lado suas profissões para se dedicar exclusivamente à missão mãe maravilha.
Em tecnologia, o cenário é bem comum. Um estudo da Women Who Tech descobriu que 50% das mulheres da área deixam seus empregos por razões relacionadas à gênero, incluindo a dificuldade de conciliar trabalho e vida familiar.
Outra pesquisa, esta do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-IBRE), apontou que, desde 2012, a taxa de desemprego das mulheres é superior à dos homens. Em 2021, o índice de desempregadas era de 16,45%, o equivalente a mais de 7,5 milhões de mulheres. No total, o índice médio anual de desemprego na economia foi de 13,20% em 2021, de acordo com o levantamento. Com a pandemia, em 2020, a situação ficou ainda pior e o índice recuou para 49,45% e ficou inferior ao início da série histórica, em 2012, quando registrou 51,58%.
Soma-se a esse cenário a quantidade de empresas que ainda enxerga a maternidade como um problema para a carreira: questionam de forma indevida quando mulheres querem ser mães, perguntam com quem os filhos ficam quando doentes e deixam de contratá-las ao menor sinal de que a maternidade está batendo à porta. Elas carregam o claro estigma de que mães têm impacto negativo na rotina do negócio ou ainda de suas vidas.
Levantamento da FGV indica que após 24 meses, quase metade das mulheres que tira licença-maternidade é demitida e 27% das mulheres têm medo da demissão por serem mães, segundo dados da Famivita. É a materialização do ‘paredão da maternidade’, ou diferentes tipos de discriminação que mães enfrentam em seus trabalhos ou ao procurar oportunidades.
Felizmente, essa não é a realidade de outras tantas companhias que entendem que as mulheres – e mães – são fundamentais em suas estruturas e identificam nelas potencial para gerar resultados ainda mais expressivos de negócios. Apesar de não ser tão recente, um estudo de 2018 da McKinsey revela que organizações com mulheres na liderança lucram, em média, 21% a mais e têm resultados operacionais 48% maiores em comparação com a média da indústria. Elas são mais estudiosas, dedicadas e comprometida com resultados.
Para acomodar as mães e tornar o desafio de trabalhar e maternar menos complexo, algumas companhias de tecnologia adotam políticas flexíveis de trabalho, como o home office, licença parental estendida, creche dentro da estrutura da empresa e possibilidade de congelar óvulos, podendo, ainda, realizar fertilização in vitro financiada pela empresa. Ações essas permitem que elas permaneçam ativas em suas carreiras em tecnologia, ao mesmo tempo em que estreitam os laços com os filhos e acompanham de perto a evolução deles.
O Mercado Livre, empresa latino-americana de comércio eletrônico, é uma delas. Com uma população de 50% de mulheres e 50% homens, a companhia não tem uma estatística de mães, mas revela que 38% das posições de liderança são ocupadas por mulheres. “Temos uma proposta integrada que se conecta ao momento de vida das pessoas. Para mães, contamos com um pacote de suporte para essa jornada da mulher, seja no momento que ela vira mãe, ou quando ela precisa organizar a vida do filho”, comenta Monica Rosenburg, gerente de benefícios do Mercado Livre no Brasil.
Como empresa cidadã, além de conceder licença maternidade de 120 dias, o Mercado Livre também conta com licença parental de 20 dias, e 120 dias em caso de adoção ou para casais do mesmo sexo. Outro benefício promovido e financiado pela companhia é a preservação de óvulos para aquelas que decidem prolongar o ciclo de fertilidade.
Podem acessar este benefício colaboradoras a partir dos 33 anos de idade – estudos recomendam o congelamento entre 33 e 35 anos – com, pelo menos, um ano de Mercado Livre. A companhia paga até 75% do custo do procedimento, com teto de até US$ 5 mil, e a colaboradora arca com a manutenção do acondicionamento na clínica escolhida.
Desde que o programa foi lançado, em 2019, cerca de 15 mulheres usaram o benefício. “Fomos pioneiros no Brasil com esse programa e ele surgiu a partir da escuta ativa das colaboradoras”, comenta ela.
Monica conta ainda que a empresa tem o Soft Landing, que facilita a adaptação ao trabalho depois da licença por maternidade. Assim, as mães do Mercado Livre contam com uma jornada flexível durante o primeiro ano do bebê sem redução da remuneração.
Depois do primeiro ano até os dois anos, há a possibilidade de distribuir o Home Office no transcurso da semana, para poder ingressar mais tarde ou sair antes, e contar com essa flexibilidade para cobrir a visita ao médico, a adaptação à escola etc. Durante a pandemia, com a mudança de modalidade para o trabalho flexível para 90% das pessoas no Mercado Livre, o líder de cada equipe verifica o correto cumprimento do benefício Soft Landing para continuar mantendo o diferencial da experiência.
Na visão da executiva, as ações do Mercado Livre são, sem dúvidas, um fator de diferenciação no recrutamento de talentos. “Às vezes, a mulher não quer fazer um movimento de carreira, porque tem a pressão de tomar uma decisão de ser mãe. Trazemos, então, esse acolhimento para que ela consiga ter tranquilidade, ou de realmente seguir para um processo de congelamento e dar sequência ao sonho de ser mãe no curto prazo. Já tivemos contratações de mulheres na liderança grávidas. Isso mostra como encaramos o tema”, avalia.
A DocuSign, empresa que ajuda as organizações a conectar e automatizar a forma como gerenciam os seus sistemas de contrato, conta no Brasil com 40% dos talentos mulheres, sendo destas 24% mães. Para acolher essa população, a companhia lança mão de uma série de estratégias.
Renata Almeida, diretora de Marketing e Conteúdo para Brasil e América Latina da DocuSign, revela que a empresa conta com salas de amamentação em todas os seus escritórios no mundo, o que permite que mesmo em viagens de negócios, seja possível tirar a congelar leite e manter a amamentação. Ela, que tem um filho de oito meses, já usou o local para retirar e armazenar leite.
Renata Almeida, diretora de Marketing e Conteúdo para Brasil e América Latina da DocuSign. Foto: Divulgação
Há dez anos na DocuSign, Renata, inclusive, foi promovida grávida. “Me senti tão acolhida que contei sobre minha gestação com quatro semanas. Sabemos que muitas mulheres perdem oportunidades nesse período: são retiradas de projetos ou deixam de ter relevância. Não foi meu caso”, comemora ela.
Além dessas práticas, a DocuSign também conta com auxílio creche, realiza palestras com mães e mulheres sobre temas que envolvem saúde e adota e licença parental de seis meses, ou para o principal cuidador.
Com o trabalho híbrido, Renata também pode ficar mais tempo em casa e afirma que o fato de a empresa abraçar mães é muito natural. “Eu já precisei fazer reuniões com o bebê com colo. Já tivemos homens com bebê no colo e tudo bem e isso já não era pandemia. Precisamos normalizar. A empresa que não fizer isso, ficará para trás”, observa.
Para ela, sem dúvidas, contar com diversas iniciativas para mães é um diferencial da empresa. “A gente até brinca que existe um boom de mulheres grávidas da pandemia para cá e isso foi bom, porque fomos nos conectando. Também precisamos convidar os homens para a conversa”, lembrando que em um dos bate papos com um colega de trabalho que mencionou que a esposa precisava de um remédio específico para garantir a segurança da gestação, ela lembrou que a empresa ajuda no custeio e ele pôde levar o benefício para sua mulher.
Na Teltec Solutions, empresa brasileira que fornece soluções, serviços e consultoria de TI, 20% das mulheres são mães e a empresa lança mão de ações para elas. Uma delas, conta Natalia Pruchneski, gerente de departamento de desenvolvimento e organizacional da empresa, é a redução da carga de trabalho em 50% na voltada da licença, sem desconto no salário.
“Entendemos que é um processo de adaptação necessário, tanto para a mãe, quanto para o filho”, conta ela. Segundo ela, a empresa está agora em processo de avaliação para incluir outros benefícios, incluindo a licença maternidade estendida.
Natalia Pruchneski, gerente do departamento de desenvolvimento e organizacional da Teltec. Foto: Divulgação
Estudo realizado pelo LinkedIn apontou que 71% das mulheres que trabalham acreditam que o equilíbrio perfeito entre trabalho e vida pessoal é a definição mais sincera de sucesso profissional. O trabalho híbrido, sem dúvidas, favorece esse cenário, especialmente para as mães.
Para Priscila de Oliveira, head de Cultura e Pessoas na Kstack, que atua com serviços de TI, os novos modelos tecnológicos de inserção profissional sugerem um conceito diferenciado de prestação de serviço, além de facilitar o dia a dia da profissional, principalmente se ela já for mãe. “O mercado de tecnologia é bastante atraente, principalmente para as profissionais que já são mães, graças ao fato de a maioria das oportunidades atuantes hoje, serem oportunidades de home office ou no modelo híbrido, o que permite às mães perderem menos tempo durante o percurso, como no trânsito, por exemplo, e conseguirem ter um pouco mais de tempo de qualidade com os filhos, então isso facilita bastante”, diz Priscila.
Amanda Pinheiro, líder de People & Communities da Cisco Brasil, conta que mesmo antes da pandemia, que forçou a maioria das empresas a adotarem o home office, a fabricante já tinha em sua cultura o conceito de ‘Anywhere Office’ ou ‘trabalho híbrido’, no qual o ambiente de trabalho não está limitado ao escritório físico, mas em qualquer lugar em que os funcionários possam executar suas atividades por meio de ferramentas colaboração.
Além disso, prossegue Amanda, desde 2019 a empresa lança mão de licenças estendidas de 6 meses, levando em consideração o cuidador principal, independentemente do gênero, válidas também no caso de adoção. E, claro, sala de lactação no escritório para retirada e armazenamento do leite materno e um suporte adicional aos novos avós, com licença de três dias para os funcionários darem boas-vindas a seus netos.
Amanda Pinheiro, líder de People & Communities da Cisco Brasil. Foto: Divulgação
As iniciativas fazem da Cisco umas “Melhores Empresas para Trabalhar” na categoria ‘Primeira Infância’ pelo ranking GPTW. O reconhecimento é resultado da adoção de diversas práticas que colocam em primeiro lugar o bem-estar das crianças e das famílias, entre elas a flexibilização da jornada de trabalho e licenças de maternidade e paternidade estendidas, segundo a empresa.
Na Salesforce, o cuidado vai além das mães, se estendendo também à família. Priscila Castanho, diretora regional sênior de sucesso do colaborador da empresa, afirma que a gigante norte-americana de software conta com políticas robustas para colaboradores que já são pais ou mães ou que estão planejando ter o primeiro filho, aumentar a família ou mesmo cuidar de um de seus entes queridos.
O pacote inclui licença parental, no qual cuidadores primários podem tirar 26 semanas de folga remunerada, enquanto os secundários podem tirar 12 semanas, com retorno gradual ao trabalho; auxílio fertilidade a adoção; auxílio creche e até coaching para gravidez e maternidade.
“A Salesforce tem parceria com a Cleo para orientar os colaboradores nessa jornada, que conta com três modalidades de consultoria com especialistas globais em saúde familiar: Cleo Baby, que oferece coaching e suporte personalizados por 21 meses – desde a gravidez até o primeiro aniversário do bebê, o Cleo Kids, que oferece coaching e suporte personalizados para pais com filhos de 1 a 12 anos, e o Cleo Teens, que oferece coaching e suporte personalizados para pais com filhos de 13 a 18 anos”, detalha a executiva.
Priscila Castanho, diretora regional sênior de Sucesso do Colaborador da Salesforce. Foto: Divulgação
Priscila indica que entende que essas ações deveriam ser mais difundidas no mercado em geral, mas sabe que, muitas vezes, são diferenciais quando comparado com o mercado brasileiro. “Isso vem de uma cultura corporativa avançada da Salesforce. A família dos nossos colaboradores é de extrema importância para nós, além de ser uma de nossas prioridades na gestão de pessoas. Sabemos que poder passar um tempo de qualidade com a família é essencial, uma experiência maravilhosa”, conta.
Com uma cultura inclusiva, diversa e equitativa, a Amazon Web Services (AWS) e a Amazon.com tem benefícios também estendidos a todos os colaboradores, sendo alguns mais focados nos cuidadores e seus filhos.
“Oferecemos um programa de acompanhamento, acolhimento e orientação às gestantes realizado por meio de visitas em domicílio, contatos telefônicos, troca de mensagens e videoconferência, e um programa dedicado às famílias que têm pessoas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e/ou outras condições genéticas, como a Síndrome de Down. Há ainda um programa de saúde mental que presta suporte 24 horas por dia, sete dias por semana. Esses benefícios estão disponíveis a partir do primeiro dia do funcionário na empresa”, destaca Cleber Morais, diretor para o setor corporativo da AWS no Brasil.
Cleber Morais, diretor para o setor corporativo da AWS no Brasil. Foto: Divulgação
A empresa conta, ainda, com licença maternidade para o primeiro cuidador por um período de até seis meses. Para o segundo cuidador, a licença parental pode ir até seis semanas. Na AWS, também oferecemos o auxílio creche para crianças de até cinco anos. Outro benefício, disponível para todos, é licença não remunerada, que pode durar de 14 a 84 dias.
“Além dos benefícios, temos grupos de afinidades globais importantes para que as pessoas construam uma rede de apoio e não se sintam sozinhas. Um deles é sobre a experiência de cuidar. Como as mães passam um período longo sozinhas com seus filhos, é fundamental dar-lhes todo o acolhimento no retorno ao trabalho”, completa ele.
Buscando criar um ambiente acolhedor para as mães, a IBM vem há muitos anos tornando mais parrudo seu pacote de políticas e benefícios para esse público. Bernardo Marinho, líder de recursos humanos da IBM Brasil, cita como exemplo os programas de suporte de gestação saudável e bebê em casa, com acompanhamento de especialistas até a criança completar 18 meses, licença maternidade com 60 dias de extensão, reembolso para a compra de vitaminas necessárias durante a gestação, plano de auxílio creche, programa de aleitamento materno (contando com salas de poio a lactante nos sites) e programas de flexibilidade que facilitam a presença junto aos filhos que é tão importante nesta fase. “O programa mais recente é o coaching materno, implementado em janeiro de 2023”, conta o executivo.
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Bernardo Marinho, líder de recursos humanos da IBM Brasil. Foto: Divulgação
Para Monica, do Mercado Livre, não basta criar políticas e ações para mães, é preciso querer e entender se as estratégias fazem sentido para aquela empresa e cultural. “Tem de ser genuíno”, sintetiza, completando que é preciso, em seguida, ouvir internamente os anseios e os desejos das pessoas para melhorar proposta de valor internamente.
Já Renata, da DocuSign, aconselha que empresas, pelo menos, comecem com a licença maternidade de seis meses e incentivem mulheres a crescer na carreira e que a vida pessoal delas não seja prejudicada. “Se não conseguem conciliar as duas coisas, elas acabam deixando de lado a carreira. As duas coisas precisam caminhar juntas”, reforça.
Ela entende que tecnologia é uma área com mais homens, mas que isso está mudando. Nós somos um exemplo, mas é recente, e quanto mais normalizamos isso, mais normal vai ser. Era um desconforto e hoje é normal. Fico feliz que a imprensa de tecnologia esteja falando do tema”, finaliza.
Déborah Oliveira
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