De acordo com o livro “The Paula Principle: How and why women work below their level of competence”, publicado a 9 de março (ver Mulheres são subvalorizadas no trabalho), a maior parte das mulheres ocupa funções que estão abaixo do seu nível de competência. Isto de acordo com Tom Schuller, que usou uma comparação com “O Princípio de Peter” para formular a sua conclusão no volume. O estudo que Schuller levou a cabo mostra que mulheres em todos os níveis profissionais estão subpromovidas – não apenas aquelas que aspiram a chegar ao nível mais alto da pirâmide executiva.
Na indústria da moda, o papel de diretor criativo pode ser tão desgastante que muitos acabam por lutar pelo equilíbrio entre a vida profissional e familiar e, não raras vezes, pelo seu bem-estar físico e mental. Para o género feminino, é ainda mais difícil equilibrar essa responsabilidade com os deveres familiares.
Voltando a atenção para os números, segundo o South China Morning Post, dos 92 desfiles do calendário da última semana de pronto-a-vestir feminino de Paris, menos de 30 tinham nos bastidores diretoras criativas e, em Milão, apenas 31% das marcas estavam representadas por mulheres. Do lado dos negócios, a vice-presidente executiva do conglomerado LVMH, Delphine Arnault, parece estar sozinha entre os executivos do sexo masculino.
Como é que uma indústria voltada para as mulheres ainda é predominantemente um mundo de homens? No corpo estudantil da Central Saint Martins, as mulheres têm um peso de 74%, enquanto o FIT, em Nova Iorque, tem 85% de participação feminina. As mulheres ganham nas universidades, mas perdem na liderança no mercado de trabalho.
Muitas das marcas líderes mundiais foram iniciadas por mulheres, mas a escalada do sucesso implicou mudanças. A Chanel é o exemplo mais notável de controlo masculino, mas Jeanne Lanvin, Madeleine Vionnet, Elsa Schiaparelli, Nina Ricci e Marie-Louise Carven são mulheres cujas marcas se tornaram influentes e foram depois assumidas por homens.
Na opinião de alguns analistas, as mulheres não são vistas como pioneiras, apostando numa estética que se aproxima mais daquilo que a mulher real quer usar. Por isso, numa indústria onde a inovação é crucial, as marcas procuram homens como Jonathan Anderson ou Alessandro Michele, conhecidos pela sua capacidade de redefinir a estética de uma marca estabelecida. «Sinto que o meu trabalho ainda está muito relacionado com o facto de eu ser uma mulher que desenha para mulheres», afirma Julie de Libran, diretora artística da Sonia Rykiel. «É considerada uma perspetiva mais pessoal, subjetiva, por isso é muitas vezes apelidada de “vestível”».
Esta avaliação repete-se em relação ao trabalho de designers como Stella McCartney, Donatella Versace e Bouchra Jarrar. Todavia, ainda que alguns analistas relativizem a originalidade de designers como Mary Katrantzou, Sarah Burton ou das irmãs Mulleavy na Rodarte, Phoebe Philo, na casa Céline, tem um poder incontestável naquilo que mulheres querem vestir.
Outra das barreiras no caminho das mulheres em direção ao topo é a natureza implacável do atual calendário de moda. Diretores criativos como Alber Elbaz e Raf Simons lamentaram, à data da sua saída das casas Lanvin e Dior, respetivamente, que o ritmo de trabalho os impedia de ter uma vida normal. Considerando que muitas mulheres acabam por conciliar a carreira com a vida familiar e que a maioria dos diretores criativos é nomeada entre os 35 e os 45 anos, a dificuldade é acrescida.
A designer britânica Phoebe Philo é um exemplo raro de alguém que combinou com sucesso a família e a moda, ajudada pelo facto da Céline ter transferido o seu atelier de Paris para Londres e inclusivamente cancelado o desfile de outono-inverno 2012/2013 quando a designer estava na reta final da sua gravidez. «A realidade é que as mulheres na direção criativa ainda são vistas como uma minoria», reconhece de Libran. «A indústria da moda é extremamente exigente e as mulheres muitas vezes têm de fazer uma escolha entre a vida familiar e a carreira. Nem sempre têm o apoio para fazer das suas carreiras uma prioridade e, de seguida, há a tensão inevitável para uma mulher em conflito entre o seu papel na sociedade e o seu papel na família. Os homens normalmente não são sobrecarregados com essa culpa – os seus compromissos de trabalho são tradicionalmente mais respeitados dentro do seio familiar», acrescenta.
Este fardo fica mais leve quando as mulheres são diretoras de marcas epónimas, isto é, tendo o poder de criar equipas que podem trabalhar em função da sua agenda. No entanto, chegar a esse patamar é um desafio. «Tendo crescido com três irmãos, nunca percebi que havia uma diferença tão grande entre homens e mulheres», revela a designer americana Tory Burch. «Conheci algum preconceito nos meus primeiros trabalhos, mas quando comecei a minha empresa percebi rapidamente como podiam ser as pessoas. Quando precisava de investimento, levantavam-se muitas sobrancelhas e comentários mesquinhos. Isso fez-me entender os desafios enfrentados pelas mulheres», admite.
A Ásia acrescenta novas camadas ao desafio enfrentado pelas mulheres na indústria da moda. Os homens compõem uma percentagem muito maior de consumidores do que no Ocidente, com marcas como a Ermenegildo Zegna e a Dunhill agora a apostarem alto no mercado oriental. Este foco na moda masculina traduz-se em cada vez mais homens a estudar moda e numa maior percentagem de homens a entrar no mercado de trabalho.
No entanto, muitas mulheres não se sentem intimidadas ou limitadas. Masha Ma, designer de origem chinesa, sediada entre Xangai e Paris, não experimentou sexismo profissional na Ásia ou na Europa. «Há excelentes designers do sexo feminino nesta indústria», observa. «No entanto, temos de admitir que existem fatores externos que restringem as designers e que significam que precisamos de fazer algumas cedências em determinados estágios da vida», conclui.
Você precisa ser um membro de Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI para adicionar comentários!
Entrar em Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI