Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Vicente Falconi, um dos mentores da cultura da meritocracia notória na AmBev, fala sobre a própria aposentadoria e a pressão por metas nas empresas

Vicente Falconi, da Ambev (Foto: Reprodução/YouTube)

OfluminenseVicente Falconi, 75 anos, costuma ser apontado como o mais influente consultor de empresas do Brasil. Ele é um dos principais idealizadores da chamada cultura AmBev, famosa pela obsessão com as metas e a meritocracia. Foi o primeiro conselheiro externo da Brahma, nos anos 1990 – e ainda hoje participa do conselho de administração da AmBev. Depois, criou uma consultoria (a “Falconi - Consultores de Resultados”) que replicou o modelo em dezenas de países e centenas de grandes corporações, como o Itaú e a Gerdau. Nos últimos quinze anos, enveredou pelo setor público. Participou de “choques de gestão” em prefeituras, governos e administrações federais, numa lista que vai de Aécio Neves (em Minas Gerais) até Lula e Dilma. Falconi falou a NEGÓCIOS no final do ano passado, em entrevista publicada na edição de janeiro da revista. No trecho abaixo, ainda inédito, ele fala sobre a própria aposentadoria, diz como está a consultoria que fundou e comenta a fama de que a “cultura Falconi” resultaria em pressão excessiva nas empresas.

O senhor anunciou que vai se aposentar em 2019. Qual é o futuro da Falconi?
Isso é uma empresa de pessoas e cabeças. Não temos propriedade nenhuma, o que temos é gente. Eu estou com 75 anos. Hoje a empresa é 100% minha. O que é meu aqui? O caixa que a empresa tem. Mais nada, o resto são pessoas. Eu assumi o compromisso de vender, até 2019, todas as minhas ações para os sócios. E a ação que eu vender vai ser pelo equivalente que ela tem de caixa. Se eu tenho 100 mil no caixa e 100 mil ações, vou vender cada ação a um real. Só estou resgatando meu dinheiro que está lá. A empresa, estou dando para eles.

Como está a Falconi, em termos de saúde financeira? A consultoria tem crescido?
Nós temos um caixa muito bom. Tem crescido, devagarinho. Logicamente que em um ano ou em outro ela fica mais parada, mas não temos perdido mercado.

Mas tem perdido dinheiro? A empresa dá lucro todo ano?
Temos dado lucro normal, todo ano. Vendemos, em 2015, mais do que no ano anterior, mas talvez um pouco abaixo da meta.

Se não bate a meta, dá problema para o pessoal?
Não, aqui não tem pressão nenhuma.

Quantos consultores a Falconi tem? Eram mil, uns anos atrás.
Reduziu bastante depois que o Mateus [Bandeira, CEO da consultoria] entrou. Ele começou uma campanha de melhoria de produtividade, criou um sistema de treinamento muito bom, programas de incentivo ao consultor. Um projeto que antes precisava de 10 consultores, hoje tem seis. Chegamos a ter 1100 ao todo, hoje faturamos mais e temos 600.

Por que o senhor, que sabe tanto de produtividade, não fez essas melhorias antes?  
Porque eu tinha um sócio, e ele sempre tomou conta da administração, enquanto eu cuidava da parte técnica e do contato com os clientes. Quando o Mateus entrou, viu que tinha espaço para melhorar a gestão.

A meritocracia na gestão da AmBev...
Pois é, todo mundo gosta de falar da AmBev... A AmBev usa o nosso sistema aqui, da Falconi. Tem várias empresas pelo Brasil usando, são excelentes. Acho que o setor privado brasileiro vai muito bem, obrigado.

A sua contribuição é inegável, mas existem críticas. Ouve-se que na AmBev, por exemplo, a pressão para se atingir metas é muito grande, principalmente depois que os bônus passaram a ser vinculados ao desempenho da equipe, nos últimos anos. O que o senhor pensa disso?
Olha, eu não sei de que pressão estão falando. Porque fala quem não entende. Ou talvez quisesse estar lá e não está. Mas não é bem assim, não. Para começo de conversa, as metas são bem estabelecidas. Não existe meta imposta. Você negocia com cada estágio. Por exemplo, você é meu subordinado, eu vou negociar uma meta com você. Vou falar: olha, seu consumo de óleo é de 25 quilos por tonelada e a fábrica tal chegou a 20. Pega um avião e vai lá ver como se chegou a 20.

Não existem metas muito altas?
[Continuando] Você tem uma oportunidade de economizar 5. Vamos colocar no meio? Faz 22,5 no primeiro ano? É tudo assim, tudo negociado. Não existe nenhuma guerra, imposição, pressão, “ai, to sofrendo” e tal. Não existe nada disso. O segundo ponto é o seguinte. Por que você já não estava gastando 22,5? Só tem uma resposta: porque não sabia como. Todo ser humano quer resultado bom, só não sabe como. Então o processo de correr atrás de meta, na verdade, é um processo de correr atrás de conhecimento, de desenvolvimento profissional. Sabe por que todo mundo quer contratar profissional da AmBev? Por que são reconhecidos na praça como competentes.

Mas o senhor já disse que “meta tem que ser lá na lua”.
Eu não falei nada disso, você não vai encontrar em lugar nenhum eu falando que meta tem que ser na lua.

Que “meta impossível não existe”, que “é preciso ter um saudável desprezo pelo impossível” (citando Larry Page, do Google), que “quando o cara gosta trabalha sábado e domingo e faz acontecer”. [Em um fórum sobre liderança, em 2012, Falconi narrou um caso no qual os diretores de uma empresa questionaram as metas estabelecidas pelos consultores dele. Na manhã seguinte, ele leu a frase de Page no jornal. “Então eu mandei um email para a turma e disse que o Page estava com toda a razão. A meta continuaria sendo o impossível e nós vamos chegar lá. Porque aí você vai fazer tudo o que precisa ser feito”, declarou o consultor]
Não, não é trabalhar sábado e domingo e fazer acontecer, não. Não tem nada disso. O negócio de Larry Page é outra história, que nós podemos conversar depois. Mas primeiro eu quero concluir o que estou falando. O processo de atingir meta é um processo de aprendizado. O método mais moderno de ensino hoje, pelo menos em engenharia, é o da Olin College, de Boston. As pessoas aprendem por projeto. No primeiro dia o professor fala: projeta uma garrafa inquebrável. Mas eu não sei como. Então vai pesquisar para saber. Isso é o que tem de mais moderno no mundo. O que nós fazemos nas empresas que têm gestão... Gestão é aquilo que [Carlos] o Brito [CEO da AB InBev] fala, é abrir lacuna e fechar lacuna. É isso. Abre, põe meta, corre atrás, atinge. Eu gostaria que meu filho trabalhasse numa empresa assim. Agora, [imita, com tom de voz diferente] “meu filho trabalha numa empresa em que todo mundo vive bem, a qualidade de vida é maravilhosa, todo mundo fica com o pé em cima da mesa, vai ver filminho, jogar Freecell no computador...”. Aí não dá.

O senhor não acha que, para a nova geração, essas questões de ter mais qualidade de vida e trabalhar menos são importantes, o que pode gerar questionamentos ao modelo que o senhor defende?
Eu acho que não. As necessidades humanas são as mesmas, não interessa se você tem cem anos ou zero, elas não mudam. Se agora apareceu um telefoninho e você fala mais rápido, isso é um detalhe.

Mas o senhor não vê uma mudança no perfil da nova geração? As empresas do Vale do Silício, que eles admiram, buscam essa qualidade de vida para os funcionários. Esse pessoal não vai ver o modelo AmBev como ultrapassado?
Mas vem cá, mais uma vez: lá na AmBev ninguém se mata, não, tá? Não é bem assim. Se não estaria saindo todo mundo de lá. E todo mundo quer trabalhar na AmBev. Qualquer concurso para trainee lá tem 15 mil, 20 mil candidatos.

Imagino que no Google também.
[Continuando] Então não é bem assim. Não é bem assim, não associa dessa forma que você está cometendo um erro e uma injustiça com a empresa. Se aquilo fosse o inferno que as pessoas falam, a empresa nunca seria o sucesso que é.

Mas por que as pessoas falam?
Falavam no passado. No passado, houve alguns erros cometidos. Principalmente por uma pessoa, na década de 80. Mas isso aí acabou. Um comportamento que não era bom, mas a pessoa saiu, foi embora. Acabou. Mudou. Não é que tinha nenhum absurdo, não. Mas tinha aquele negócio do tomatinho... [Entre as acusações de assédio moral enfrentadas pela AmBev, ficou famoso o caso que incluía o arremesso de tomates cenográficos em vendedores que não batiam metas.] Acabou. Tomatinho acabou. Quando o Brito entrou, acabou o tomate.

Como o senhor define o Brito?
A entrevista é sobre o Brito?

Não, mas ele tomou uma importância grande após a AB-InBev comprar a SAB Miller.
O Brito é meu amigo. Ele é um bom amigo meu. Pronto. Está definido.

O senhor não pode dar uma palavra sobre o perfil profissional dele?
Dedicado. Muito dedicado. Trabalhador. Muito leal, muito amigo. Um cara que responde a todos os emails. Eu sou muito amigo dele. Um cara bacana, dedicado em tudo que faz. Tem uma família muito bonita. Um cara legal.

http://epocanegocios.globo.com/Carreira/noticia/2016/02/nao-sei-de-...

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