Mal saímos de uma campanha eleitoral, já estamos em outra. É o ritmo frenético que Lula impõe ao processo político. Não tem jeito. Ele não consegue descer do palanque. É o seu elemento. Isso mantém permanentemente mobilizadas as bases de seu partido e também força adversários e aliados a fazer escolhas precoces. Como estes não têm exatamente uma agenda própria e se colocam como meros caudatários dos comandos petistas — sim, vale também para PSDB —, o Apedeuta pinta e borda.
Com dois ou três movimentos, Lula já colocou em xeque o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). Estou entre aqueles que acham que seria saudável que se candidatasse à Presidência — embora eu também queira saber o que ele pretende e como vai dizer ao eleitorado que permaneceu por tanto tempo na barca petista até decidir romper. De toda sorte, vejo com simpatia — e isso não é segredo para ninguém — um eventual racha do condomínio liderado pelo PT. Mas, também já escrevi aqui, não aposto muito nisso.
Ocorre que Lula, de uma ignorância oceânica, é, não obstante, dotado de uma esperteza política sem concorrentes no país. Nesse particular, e só nesse, ele é dotado de mais recursos do que FHC, por exemplo. Não por acaso, já atraiu o seu adversário de divã — sim, o problema é freudiano — para o bate-boca eleitoral. Levou o PSDB a tentar antecipar a escolha, os tucanos agiram como patos, e o partido, anotem aí, ainda acabará assistindo a uma revoada de descontentes se continuar nessa marcha. Sabem por quê? Com perspectiva de poder, os políticos podem até aceitar certos atropelos e humilhações. Sem ela, por que aceitariam? E o viés, tudo contabilizado, não é exatamente de alta para o tucanato na esfera federal.
Lula chamou o PSDB para a briga, e alguém lá do ninho teve uma ideia: “Ah, vamos decidir agora, pronto! E quem não gostar que se dane!”. OU POR OUTRA: OS TUCANOS COMBINARAM TUDO COM O ADVERSÁRIO, MAS ESQUECERAM DE COMBINAR COM OS ALIADOS. Lula não aprendeu a fazer essas coisas na política partidária. Ele vem do sindicalismo, onde só há cobras criadas. Pior para quem cai na sua conversa.
O Apedeuta também leva outra vantagem sobre qualquer político: não tem nenhum escrúpulo. Não é o único. Mas ninguém é tão inescrupuloso, no que concerne aos hábitos políticos, quanto ele. Ontem, por exemplo, como se fosse presidente da República, visitou as obras do Maracanã, acompanhado do governador do Rio, Sergio Cabral (PMDB), e do vice, o sr. Pezão. Falou aos operários. E qual foi o tema? Os 10 anos do PT no poder. Ou por outra: foi a um canteiro de obra pública para fazer proselitismo partidário — não sem elogiar fartamente o anfitrião, Cabral. PT e PMDB fluminenses estão em pé de guerra por causa de 2014. Mas o Apedeuta estava lá fazendo a conciliação. Assim como é muito difícil para Campos levar adiante o seu intento, a candidatura de Lindbergh não será muito fácil. Em seu discurso no estádio em obras, o ex-presidente excitou o ufanismo da massa e fez um desagravo de agravo que não houve: segundo ele, diziam (quem “diziam”?) que o Brasil não seria capaz de realizar a Copa do Mundo, mas estaríamos provando que é mentira etc. etc. etc. Bem, nunca ninguém disse isso. Lula vive atribuindo coisas a um sujeito indeterminado para que possa, então, afirmar o contrário. Está permanentemente em guerra.
De lá voou para Fortaleza para um dos eventos que marcam os dez anos da chegada do PT ao poder. Poucos estão se dando conta do quão autoritário é o espírito que anima essa comemoração. Os petistas tentam transformar o ano de 2003 numa espécie de data do calendário oficial, como se tivesse havido um rompimento da velha ordem em benefício da nova. Que velha ordem se rompeu? O Brasil já era um democracia plena, regido por uma Constituição elaborada por representantes do povo, eleitos livremente — Constituição que os petistas se negaram homologar, destaque-se.
O PT comemora os 10 anos (tendo a certeza de mais dois que a lei já lhe assegura) como quem anuncia que virão mais quatro a partir de 2015, depois outros quatro a partir de 2019; em seguida, outro tanto… E assim eternidade afora. “É normal, Reinaldo! Os partidos lutam para ganhar eleições!” Eu sei. Mas não é corriqueiro que transformem isso em marco inaugural. Fico cá a imaginar se os tucanos decidissem fazer seminário em São Paulo para exaltar as conquistas dos últimos 18 anos de poder PSDB — 20 em 2014… O mundo viria abaixo na imprensa paulista: “Ora, onde já se viu?”. Aliás, nos setores “petizados” das redações, como sabem, a gente ouve falar na necessidade de “renovação”…
Essa “comemoração” liderada por Lula é um absoluto despropósito e foi só a maneira encontrada para deflagrar a campanha antes da hora — o que a Lei Eleitoral proíbe, é bom lembrar. Mas quem se importa? O inimputável pode fazer o que lhe der na telha, incluindo proselitismo partidário num canteiro de obra pública. Não reconhece instância que possa lhe botar freios.
“Ah, tudo vai às mil maravilhas com o Brasil, e fica esse Reinaldo Azevedo enchendo o saco…” Não! As coisas não vão às mil maravilhas, como sabe qualquer pessoa medianamente informada. Mas nem temos na oposição quem sem disponha a pôr o guizo no pescoço do gato nem há na situação quem consiga pôr algum freio em Lula e sua turma. Ele pressentiu que começava a haver um acúmulo considerável de críticas às irresoluções e incompetências do governo. Animal político notável, deflagrou a campanha eleitoral.
O mandato de Dilma durou apenas dois anos. Os outros dois serão anulados pelas articulações políticas para conseguir outros quatro a partir de 2015.
Por Reinaldo Azevedo
Tags: Governo Dilma, Lula
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