Jamais imaginei que a Virtude pudesse homologar o Vício. E é triste e sombrio constatar que tal aconteceu no longo voto argumentativo do ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, que, após idas e vindas dissertativas, desnecessárias aliás, votou a favor dos embargos infringentes e, portanto, livrou da cadeia alguns corruptos petistas, dentre eles José Dirceu, condenado principalmente por chefiar uma quadrilha que roubava dinheiro público.
Diz um velho ditado popular que ninguém sabe o que pode sair da barriga de uma mulher grávida, da bunda de um neném e da cabeça de um juiz. Isso era no tempo do zagaia. Hoje, aparelhos de ressonância identificam o sexo do feto; e juiz que fala fora dos autos, sob holofotes, já deixa claro o seu voto — como foi o caso do ministro Celso de Mello — e de todos os seus colegas de Corte, contrários ou não. Tanto que dias antes do início da análise dos votos infringentes, leigos e não leigos em Direito já sabiam que o placar seria desempatado pelo decano do Supremo, sempre o último a votar. Mas sempre o primeiro a saber, como a seguir saberá o raro leitor.
Vivi os últimos dias sonhando com o voto contrário às pretensões dos bandidos do mensalão, mesmo porque, não confiando na memória, guardei no meu arquivo a sentença do ministro Celso de Mello que, naquele primeiro de outubro próximo passado, assim a rematou: “Esses vergonhosos atos de corrupção parlamentar, profundamente lesivos à dignidade do ofício legislativo e à respeitabilidade do Congresso Nacional, alimentados por transações obscuras idealizadas e implementadas em altas esferas governamentais, com o objetivo de fortalecer a base de apoio político e de sustentação legislativa no Parlamento brasileiro, devem ser condenados e punidos com o peso e o rigor das leis desta República, porque significam tentativa imoral e ilícita de manipular, criminosamente, à margem do sistema constitucional, o processo democrático, comprometendo-lhe a integridade, conspurcando-lhe a pureza e suprimindo-lhe os índices essenciais de legitimidade, que representam atributos necessários para justificar a prática honesta e o exercício regular do poder aos olhos dos cidadãos desta Nação. Esse quadro de anomalia, Senhor Presidente, revela as gravíssimas consequências que derivam dessa aliança profana, desse gesto infiel e indigno de agentes corruptores, públicos e privados, e de parlamentares corruptos, em comportamentos criminosos, devidamente comprovados, que só fazem desqualificar e desautorizar, perante as leis criminais do País, a atuação desses marginais do Poder.”
Pois bem. Meses depois, o mesmo decano afirmaria em entrevista que “embargos infringentes” eram direitos que os réus do mensalão poderiam pedir. E eles pediram e conseguiram. Resta saber o que fazer com o que escreveu e leu Celso de Mello há quase um ano, diante de seus pares e a nação, quando apresentou as penas que deveriam cumprir os bandidos mensaleiros. E fique certo o raro leitor que bem sei que é melhor uma sociedade que tem um juiz que erra do que uma sem juízes.
Bandidos, todos eles, merecem passar um tempo na cadeia para refletir sobre o que fizeram não só à sociedade, mas, principalmente, a si próprios e a seus familiares e amigos, que todo e qualquer crime constrange a todos, e mais ainda a própria vítima.
De resto, tudo me parece dominado pelo lulo-petismo, o Executivo e o Legislativo. Só faltava o Judiciário — e agora não falta mais nada. Tudo dominado. E para quem acha que ainda falta a Imprensa, bem, ela já está infiltrada de jornalistas-petistas desde 1980, data da fundação do PT, e esteja certo o raro leitor que um plebiscito constituinte — para mudar as regras eleitorais — será proposto em um futuro nem tão distante, assim como aconteceu na Venezuela, Equador e Bolívia, países onde o direito do indivíduo foi massacrado pelo direito do coletivo, assim como aconteceu na União Soviética, e ainda permanece na China, Coreia do Norte e Cuba — sem contar as ditaduras milenares que pululam no Oriente Médio. Por favor, nada de conspirações idiotas.
O julgamento do mensalão já dura oito anos e os condenados ainda seguem livres e soltos. E ficarão livres e soltos até que as penas de formação de quadrilha prescrevam. Serão sempre chamados de ladrões e condenados. Mas jamais de penitenciários.
E o que sai da barriga dos nenéns não é muito diferente do que rola pelos ralos políticos de um país que não consegue se livrar das latrinas chicaneiras de uma republiqueta de jabuticabas jurídicas. E assim se desfaz o mistério de mais um adágio popular. Infelizmente.
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