De todas as heranças que a febre retrô tem deixado na moda contemporânea, o caráter caseiro e artesanal das peças tem sido o mais surpreendente. A ideia de usar, de maneira criativa, fios e tramas em busca de novos formatos tornam o tricô e o crochê algumas das alternativas mais atuais e inspiradoras para atualizar o guarda-roupa.
A possibilidade de infinitos resultados, de aliar volume e textura e de surpreender na combinação de cores faz com que as técnicas manuais seduzam muito mais as mentes criativas do que o trabalho em tecido plano. Essa foi a barganha do tricô para conquistar a designer Helen Rödel, que não se sentia desafiada em criar peças a partir do linho ou do algodão. “Eu também vi uma possibilidade além da indústria. Na malharia retilínea você depende de máquinas e de uma estrutura feita para grandes escalas. A técnica manual me deu liberdade, justamente por não estar vinculada ao industrial, ao qual eu não tinha capacidade alguma de fazer parte quando comecei. Pelo menos, não como eu queria”, disse, lembrando referências definitivas para a sua escolha, como a sueca Sandra Backlund.
A profusão de pontos, materiais e técnicas, aliada ao vasto campo de pesquisa, é o que mais tem instigado uma nova geração de designers a trazer a malharia para uma estética atual. Lucas Nascimento, brasileiro que mora em Londres e é uma das principais referências de knitwear do mundo, foi responsável pelo trabalho em malha de grifes como Basso & Brooke, Giles Deacon, Theatre de La Mode e Luella. Foi como assistente de Sid Bryan, o grande nome do tricô contemporâneo, que desenvolveu a técnica de tramar com linhas grossas e agulhas gigantes – conceito aplicado por ele aqui no Brasil em coleções da 2nd Floor e da Amapô, em 2008. A partir desse momento, o mercado brasileiro começou a ver o tricô com outros olhos. Mas se as tramas de lã carregavam o estigma de “roupas de vovó” até então, o que dizer do delicado tramado do crochê?
“Quando eu comecei com a marca, no final de 1999, só pensava em criar coisas diferentes. E a minha mãe sugeriu que eu trabalhasse com crochê. Mas quando eu morava em Minas Gerais, quem usava crochê era caipira. Eu nem gostava! Comecei a pesquisar, buscar referências, conheci os trabalhos manuais de Valentino e de Anna Sui e fiquei louca com a ideia. O mais difícl foi encontrar as modelagens certas até chegar a um conceito que me agradasse”, lembra a estilista Giovana Dias, que trabalha exclusivamente com a técnica.
Tendência e mão de obra
Quando o portal de pesquisa WGSN apontou o trabalho artesanal como uma das macrotendências para o verão europeu de 2012, ele lembrou algumas características da técnica como o toque decorativo, o visual retrô, a mistura nostálgica com frescor jovem e a sugestão kitsch. Mas se o perfume de outros tempos chega agora aliado às inspirações de gente moderna e inventiva, o processo de produção ainda é old school. “Cada peça é feita individualmente por uma artesã que se dedica a ela de uma semana a até dois meses ou mais. Muitas vezes, precisa ser desmanchada e refeita. O processo é absolutamente artesanal, orgânico, e a sintonia entre a gente precisa ser perfeita. O desenho não traduz o que um ponto representa, então elas têm que entender a minha explicação e o meu olhar “, explica Helen, que mantém um ateliê para o desenvolvimento das peças e encontro com as artesãs, mas conta que cada uma delas trabalha em sua própria casa.
Isso sem falar na matéria-prima, que é cara, difícil de encontrar e produzida em edições descontinuadas. Giovana diz que a fábrica que fornecia linha com elastano para fazer biquínis fechou. Ou seja, quando acabar seu estoque atual, provavelmente não fará mais moda praia. Helen também aproveitou um lote inteiro de lãs únicas para finalizar a sua coleção atual. O que significa que dificilmente terá reposição. Mas o interesse crescente do mercado de moda por esse tipo de trabalho deve acordar também a indústria têxtil e estimular novas iniciativas no Brasil. O público já existe e está só esperando.
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