Nos próximos meses, o problema dos bancos europeus poderá transformar-se em problema financeiro para a América Latina. O mais recente relatório da Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês), divulgado no início de dezembro, mostrou que, para enfrentar as dificuldades causadas pela crise na zona do euro, os bancos europeus precisarão de um capital extra de 114,7 bilhões, um valor 8% maior do que o previsto em outubro, de 106,4 bilhões. O prazo dado pela autoridade reguladora do setor para que as instituições europeias obtenham esse valor termina em junho de 2012. E de onde virá o dinheiro? Muito provavelmente, boa parte dele será obtida com a redução de ativos no exterior, pois a recomendação das autoridades é manter os ativos domésticos, para evitar uma desaceleração ainda mais intensa da atividade econômica na União Europeia.
É desse modo que a fraqueza dos bancos europeus espalhará seu efeitos para outros mercados, especialmente naqueles onde sua presença é mais intensa. E os bancos europeus têm forte presença na América Latina. De acordo com relatório do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), entidade formada pelos maiores bancos do mundo, é grande o risco de os bancos europeus retirarem um "montante significativo de liquidez" da América Latina para cumprir até o fim do primeiro semestre de 2012 as exigências de capitalização feitas pela autoridade reguladora da Europa.
O IIF, segundo reportagem publicada no jornal Valor (27/12), observou que os bancos europeus estão sendo "fortemente encorajados" pelos órgãos reguladores a reduzir seus ativos no exterior, para atender às metas de redução dos riscos de suas operações de crédito. Essa recomendação foi feita também pelo FMI há algum tempo.
Nos últimos anos, os bancos europeus concederam muitos empréstimos aos países emergentes, visando a obter uma rentabilidade que já não conseguiam nos seus mercados tradicionais. Estudos de instituições privadas mostram que, entre 2005 e 2011, o crédito dos bancos europeus para os países emergentes cresceu quatro vezes, tendo atingido US$ 2,4 trilhões. Os créditos concedidos pelos bancos americanos para essas regiões atingia, na mesma época, US$ 727 bilhões e os dos bancos japoneses, US$ 62 bilhões.
Do total emprestado pelos bancos europeus para países emergentes, 23% destinaram-se à América Latina. Quanto à dívida externa total contratada pela América Latina, os bancos europeus detêm de 65% a 68%, segundo estudos recentes de instituições privadas. Esses números não deixam dúvida quanto à importância dos bancos europeus para a região.
Há tempos os bancos europeus vêm reduzindo seus ativos no exterior. Em outubro, de acordo com o IIF, os ativos líquidos no exterior foram cortados em 80 bilhões, por causa, sobretudo, da redução de sua exposição aos países europeus com maiores dificuldades financeiras (Portugal, Itália, Irlanda, Grécia e Espanha). A redução poderá ser mais intensa nos próximos meses, justamente no período em que esses países estarão renegociando boa parte de suas dívidas. A pressão para a redução da exposição em países fora da zona do euro poderá se exacerbar.
É possível que o impacto do ajuste dos bancos europeus sobre a América Latina seja menos intenso do que em outras regiões, como o Leste Europeu, pois, como ressalvou o IIF, a maioria dos empréstimos dessas instituições na região é feita com recursos obtidos localmente por suas subsidiárias, e não com transferências originárias de suas matrizes.
Se enfrentarem maiores dificuldades para cumprir as novas exigências de capital próprio é provável que os bancos europeus recorram a suas subsidiárias, não apenas para delas obter parte dos recursos de que necessitam, mas também para forçá-las a reduzir seus ativos na América Latina. Isso poderá desacelerar ainda mais a atividade econômica na região, que vem perdendo impulso desde 2010, embora deva continuar mais intensa do que em outras partes do mundo, especialmente nos países ricos.
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