Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Ziquinha, bem popular na cidade do interior onde mora, resolveu "entrar para a política", oferecendo-se como candidato a vice-prefeito. Procurou as lideranças locais, sem considerar partidos: qualquer um serviria. Estranho no ninho, foi sendo enrolado, até que um dos dirigentes, para livrar-se do incômodo, sentenciou: "Eu topo, Ziquinha. Mas campanha custa caro, você sabe. Arruma R$ 100 mil que garanto legenda." Ziquinha desistiu na hora: "Se eu tivesse isso saía do aluguel e até comprava um carro novo. Não quero mais saber de mexer com política!"

A carreira efêmera de Ziquinha revela o padrão degenerado da política no Brasil de hoje. Cada campanha eleitoral confirma a confissão do ex-governador e ex-detento José Roberto Arruda, do Distrito Federal: "Para vencer, o que vale não é o tamanho das ideias, mas do bolso."

A rotina da democracia brasileira tem calendário eleitoral bienal, mas é aí que se agudizam seus vícios: siglas desideologizadas, com alianças de negócios em que antagônicos se abraçam, e o crime da compra de votos é praticado impunemente. As campanhas têm vencedores previsíveis, de acordo com os recursos despendidos e a sedução das suas peças publicitárias. Os 350 mil disputantes no próximo pleito, abrigados em 30 partidos, não efetivam a "maior democracia do mundo" dos ufanistas: poucos confrontarão propostas e serão portadores de princípios e causas.

Uma esquizofrenia política estimula a dissociação entre o eleito e o eleitor. Este é apenas parte da massa a ser manipulada na democracia delegada. O próprio eleitor não tem interesse em acompanhar os eleitos nos Executivos e Legislativos. A apatia é o pano de fundo dessa despolitização da política e do raquitismo republicano. A cultura da informação descartável e o declínio da operação intelectual da leitura e da escrita reforçam a "cidadania do aplauso". Já a multidão dos descrentes da vida social, imersa no individualismo, faz o elogio da ignorância quanto aos mecanismos da representação.

Lembro de outro personagem real: "seu" Oscar, camponês, organizador de seus iguais, de poucas letras e imensa sabedoria. Certa feita, brincando, ele me disse que ia se candidatar a um cargo político. Não tinha centavo, mas já formulara um instigante lema de campanha: "Oscar, que está com a pobreza não só no tempo da política, mas no tempo inteiro de mudar!"

O tempo da política não pode ser o do período eleitoral, movido a dinheiro e expectativas de ganhos, que animou e desestimulou Ziquinha. Tem que ser o de "seu" Oscar, da cidadania ativa. Para que ela não fique prisioneira do discurso hipócrita e do voto enganoso, que aprofundam o abismo entre o institucional e a vida real.

Fonte:O Globo

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