56% dos brasileiros são negros, mas onde fica a história deles no mapa?

Talita Azevedo, pesquisadora e empreendedora do interior de São Paulo, Brasil, criou um projeto de mapeamento de territórios invisibilizados. Ela defende o uso descolonial da tecnologia para preservar a memória afro-brasileira.

No Brasil, mais da metade da população é negra, segundo o IBGE (2022), mas referências históricas à sua ancestralidade raramente são visíveis em mapas urbanos, livros didáticos ou plataformas digitais. Essa invisibilidade não é acidental. É o resultado de séculos de apagamento sistemático que continua a moldar as cidades, a educação e a narrativa da história do país. Ruas não contêm os nomes de líderes negros, monumentos celebram apenas a elite branca e os currículos escolares reduzem a história africana e afro-brasileira a um único capítulo sobre a escravidão. Como define a escritora Conceição Evaristo , a memória é “uma escrita da vida, uma escrita-existência”, enfatizando a necessidade de sujeitos negros serem representados como protagonistas.

Essa falta de memória afeta a autoestima coletiva, o acesso ao conhecimento e a representação cultural. Reforça a violência simbólica e apaga o protagonismo negro, incluindo suas contribuições científicas, tecnológicas e intelectuais.

No entanto, essa história está mudando. Reparar a memória negra no Brasil é possível porque o apagamento é resultado de escolhas políticas — e, portanto, reversível.

A plataforma Presente Histórico de Talita utiliza tecnologia digital para mapear e georreferenciar lugares conectados à memória afro-brasileira. Ela combina história oral, geolocalização e ferramentas digitais colaborativas para criar uma cartografia viva e afetiva de territórios, histórias, personagens e sabedorias ancestrais apagados.

Lançado em dezembro de 2024, o Presente Histórico já mapeou locais importantes, incluindo:

  • Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos em Salvador
  • Largo Terreiro de Jesus, Salvador
  • Lagoa das Lontras, Rio de Janeiro
  • O baobá do século XVII na Ilha de Paquetá, Rio

Esses locais exemplificam a abordagem do projeto: combinar dimensões religiosas, culturais, tecnológicas e territoriais para resgatar a memória afro-brasileira. A pesquisa também visa propor uma intersecção no campo científico, integrando práticas populares, tradições religiosas, tecnologias digitais e saberes territoriais, criando uma metodologia holística para a reconstrução da memória.

A plataforma atraiu milhares de visitas online e gerou mais de 30 menções orgânicas na mídia nacional , refletindo o crescente engajamento do público. A iniciativa também rendeu a Talita um convite para sua primeira palestra no TEDx , expandindo a visibilidade da memória afro-brasileira internacionalmente.

“Meu objetivo é propor uma nova relação entre ciência, tecnologia e saberes ancestrais. O Brasil tem sido historicamente um berço de sabedorias que apontam para formas sistêmicas, saudáveis ​​e respeitosas de nos relacionarmos com o meio ambiente — especialmente os saberes indígenas e afrodiaspóricos”, diz Talita.

A base teórica da plataforma integra conceitos de epistemicídio (Boaventura de Sousa Santos; expandido por Sueli Carneiro), tecnologias sociais decoloniais e filosofias afro-brasileiras de ancestralidade e territorialidade. Ao mesclar tradições orais com mapeamento digital, Presente Histórico transforma paradigmas educacionais e culturais.

Em um país que frequentemente esquece, Presente Histórico faz da lembrança um ato de resistência. Transforma a tecnologia em uma ferramenta de reparação social, dando aos negros brasileiros a possibilidade de se verem refletidos nos próprios espaços que habitam.

 

Talita Azevedo  é pesquisadora e empreendedora, especialista em memória afro-brasileira e inovação digital.
É fundadora da oná , embaixadora do Web Summit e Top Voice do LinkedIn .
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https://www.fashionrevolution.org/56-of-brazilians-are-black-but-wh...

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