Fizemos uma revolução no campo, agora é hora de construir uma imagem sólida no exterior, com foco na Ásia.
Após uma esplêndida safra que nos permitiu ultrapassar a Índia e a Austrália, o Brasil chega à posição de segundo maior exportador mundial de algodão, o que vai gerar mais de US$ 2,5 bilhões em divisas no ano de 2019. Mantida a atual taxa de crescimento (10% ao ano), antes de 2030 já teremos superado os Estados Unidos, primeiros exportadores mundiais que hoje detém um terço do mercado.
Trata-se de uma transformação fenomenal para um país que nos anos noventa chegou a se posicionar como segundo maior importador mundial do produto. Naquela época, nosso modelo era baseado na pequena produção da região Sul, sujeita a constantes instabilidades climáticas e ao descontrole de pragas e doenças.
Ao migrar para os cerrados do centro-norte, o algodão ganhou escala (propriedades rurais e operações muito maiores), reduziu a incidência de doenças (a colheita deixou de coincidir com o período chuvoso) e, em consequência, obteve maior produtividade e qualidade de pluma.
Entre os anos setenta e hoje, enquanto a área plantada com algodão caiu de 4 para pouco mais de 1 milhão de hectares, a produtividade deu o espetacular salto de 200 kg para 1.800 kg de pluma por hectare. Se naquele período o algodão era cultura única, hoje ele é comumente plantado como segunda safra da soja, usando a mesma área agrícola, sem precisar de irrigação.
Isso permitiu conquistar dois elementos únicos de diferenciação do Brasil: a padronização do produto —cuja rastreabilidade pode ser feita em nível de talhão— e as características intrínsecas de sustentabilidade, graças à adoção generalizada pelo setor de certificações como o ABR (Algodão Brasileiro Responsável) e a BCI (Better Cotton Initiative).
Mas quem de fato puxou o crescimento da cotonicultura foi a demanda do continente asiático, que hoje responde por 93% das nossas exportações. Ocorre que a indústria do vestuário e confecções é uma das que mais migraram ao longo do tempo, saindo do Reino Unido na Revolução Industrial para se instalar nas Carolinas nos EUA. Depois foi para o Japão e a Coreia do Sul, depois China e hoje chega a Indonésia, Vietnã, Turquia, Bangladesh e Paquistão, países cujas importações crescem a dois dígitos por ano. Isso sem falar dos novos destinos que despontam no horizonte, como Filipinas e Myanmar. Essa extraordinária mobilidade da indústria, em busca de mão de obra competitiva, gerou forte demanda para o algodão brasileiro em países com notáveis limitações de terra e água.
Mas o que falta ser feito para coroar essa saga? Como vamos vencer os Estados Unidos na disputa pela liderança das exportações? Minha opinião é que ganhos de produtividade são fundamentais, mas não suficientes, para ganhar o jogo global e que qualidade medida no campo é diferente de qualidade percebida pelo consumidor.
A cotonicultura americana lidera o mercado não apenas porque historicamente produziu grandes volumes com alta produtividade, mas também porque investiu pesadamente em comunicação e diferenciação em relação aos concorrentes.
O Cotton Council International (CCI), braço de promoção internacional do Conselho Nacional do Algodão dos EUA, tem representações em 15 países e um site de grande envergadura em 12 idiomas. Em 2017, gastou US$ 26 milhões com programas de internacionalização da indústria, fóruns, trade shows e eventos, focados principalmente no continente asiático.
Além disso, o CCI criou a marca “Cotton USA”, que certifica produtos que contêm algodão americano e ainda promove estudos, visitas, missões e a divulgação de inovações em tecnologia, mistura de tecidos, design e moda.
A Abrapa (Associação Brasileira dos Produtores de Algodão) patrocinou uma bela campanha para promover o uso do produto no Brasil, com o lema “Sou de Algodão”.
Fizemos uma revolução no campo. Agora é hora de construir uma imagem sólida para o algodão brasileiro no exterior, diferenciando-o no coração e na mente de nossos clientes e consumidores, que, na sua maioria, hoje vivem do outro lado do planeta.
Jornal “Folha de São Paulo”, Caderno Mercado, 24/11/2018
(*) Marcos Sawaya Jank é especialista em questões globais do agronegócio. Escreve aos sábados, a cada duas semanas.
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Parabéns à cotonicultura brasileira. Melhor ainda se fossemos capaz de exportar uma maior parte deste algodão na forma de fios, tecidos e até confecções, movendo nossa economia interna e agregando valor a esta matéria-prima. Hoje, exportamos o algodão na forma de fibra e importamos o produto industrializado. O que o texto não comenta, é que a "Cotton USA" (CCI), além do marketing da fibra, divulga e incentiva as indústrias têxteis estadunidenses a ampliarem seus mercados.
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