Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

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Desfiles incentivados pela Lei Rouanet: entenda a polêmica e as contrapartidas das marcas

Looks do mais recente desfile de Alexandre Herchcovitch para o Verão 2014 ©Agência Fotosite

O Ministério da Cultura aprovou nesta manhã (22.08) a captação de recursos via Lei Rouanet para a realização de desfiles. Outros projetos de moda, como exposições e livros, já são contemplados pela lei.

Os três primeiros estilistas a se beneficiarem desta iniciativa são Alexandre Herchcovitch (R$ 2,6 milhões), Pedro Lourenço (R$ 2,9 milhões) e Ronaldo Fraga (R$ 2 milhões). A lei é um mecanismo de incentivo à cultura por meio de isenção tributária, o que não significa que a captação seja bem sucedida. Com a aprovação, eles podem iniciar a captação para a realização de dois desfiles.

Nesta quinta (22.08), a “Folha de S.Paulo” publicou uma matéria em que questiona o benefício dado aos estilistas. “Está certo usar a Lei Rouanet para bancar desfiles de moda?”, lemos logo no título.

O assunto é polêmico e divide opiniões até mesmo dentro da indústria da moda. Para uns, a iniciativa representa uma vitória para o setor, já que a moda brasileira luta há muitos anos para garantir seu lugar como força criativa global. Outros criticam os valores liberados e temem que outros projetos que poderiam beneficiar a indústria não sejam contemplados. No entanto, qualquer pessoa pode propor projetos à Lei Rouanet, sejam eles desfiles ou não. “Essa aprovação representa apenas 30% do processo. O desfile é a ponta de um iceberg que estimula o pensar moda no Brasil”, diz Ronaldo Fraga.

Duas discussões acendem a polêmica: moda é arte? E qual a contrapartida para a sociedade, uma vez que estamos falando de cofres públicos e os desfiles são eventos fechados para convidados?

Moda como expressão artística é um assunto antigo. “Existe um enorme preconceito em relação à moda. O que acontece com uma foto ou um quadro na parede após uma exposição? Eles são vendidos! E as roupas depois de um desfile? São vendidas também”, diz Herchcovitch, que acordou nesta manhã com mensagens contrárias à aprovação. “As pessoas estão entendendo isso de outra maneira e estou bem indignado e chateado”, disse ao FFW. “O preconceito é grande por falta de entendimento”, reforça Fraga. “Não temos nenhum representante dentro do ministério com formação e informação de moda. Já tive projetos recusados por estar ali o nome estilista. Quando eu troquei por artista, aí ficou tudo bem”.

O projeto de Herchcovitch contempla duas coleções/desfiles que o estilista mostrará em São Paulo e em Nova York em outubro de 2013 e fevereiro de 2014. Herchcovitch desfila também fora do país desde 1999 (muitos realizados com recursos próprios, segundo ele).

A InBrands, grupo que detém os direitos sobre a marca, respondeu, em um questionamento oficial pré-aprovação da lei que “a repercussão desse evento [em Nova York] mostra o quanto nosso material criativo é reconhecido no âmbito internacional/global”, destacando a importância de um estilista brasileiro exibindo suas coleções para uma audiência global, formada por imprensa, compradores e consumidores.

Este também é o ponto de Pedro Lourenço, que há alguns anos, investe em uma carreira internacional com desfiles bem recebidos na semana de moda de Paris. Anteriormente o projeto de Pedro não passou na avaliação do CNIC (Comissão Nacional de Incentivo à Cultura), órgão que decide quem poderá captar via Rouanet.

Entre os pontos colocados em um parecer emitido em 5 de agosto de 2013, está a falta de democratização do acesso, já que caracteriza um evento fechado. “Considerando que Pedro Lourenço é um dos ‘poderosos da moda’, questiona-se se a otimização dos recursos será utilizada para o fortalecimento do próprio estilista e não da moda”, diz o despacho.

Looks da mais recente coleção de Pedro Lourenço, lançada na semana de moda de Paris para o Inverno 2013 ©Divulgação

Foi uma intervenção de Marta Suplicy, ministra da Cultura, que reverteu o quadro de Lourenço e aprovou o projeto. “Essa oportunidade tem como consequência o incremento das confecções e gera empregos. E é um extraordinário soft power no imaginário de um Brasil glamouroso e atraente”, diz em nota (soft power é um termo usado para definir o conceito que visa fortalecer a imagem do Brasil no exterior a partir de bens imateriais).

Desfilar em capitais como Nova York e Paris exige investimentos altos para poder, minimamente, se destacar em semanas de moda infladas por marcas históricas, globais, famosas, com estratégias de marketing ferozes e acesso a profissionais de primeiro nível em todos os processos de produção e criação.

Ir para Paris para ficar invisível não pode fazer parte dos planos; acaba virando uma brincadeira que custa caro e não leva a marca ou a moda brasileira além. Portanto, trata-se de investimentos altos. São também oportunidades de divulgar o Brasil, não apenas sua moda e seus estilistas, mas seu lifestyle e alguns de seus valores culturais. “Dessa forma, a moda brasileira poderá ser mostrada fora do Brasil de uma maneira mais competitiva e forte”, diz Herchcovitch.

Pedro irá mostrar duas coleções em que interpreta valores culturais estéticos da cantora Carmem Miranda, traduzidas para os dias atuais (leia os projetos de cada um abaixo).

Como contrapartida, segundo o projeto ao qual o FFW teve acesso, Pedro fará cinco workshops gratuitos nos três meses finais da execução do projeto. Em relação à democratização, 480 convites serão distribuídos por ordem de inscrição, em “ação amplamente divulgada na internet e nas mídias sociais, permitindo que todos os interessados saibam da existência dos dois desfiles”.

Já o projeto da marca Herchcovitch;Alexandre consiste em dois desfiles femininos, em São Paulo e Nova York, que têm como tema o movimento artístico antropofágico.

Em São Paulo, dos 500 convites, 20% vão para patrocinadores e formadores de opinião, enquanto todo o restante vai para espectadores que mostrarem interesse. O mesmo acontece em Nova York.

Após o término, todo o material será doado: 20% para o Museu da Cidade de São Paulo, 20% para o Museu de Moda do Rio de Janeiro, 20% para o Senac de São Paulo e os 40% restantes das peças dos desfiles serão destinados a outras instituições, que ainda serão informadas ao Minc.

Ronaldo Fraga vai criar duas coleções inspiradas em Mário de Andrade, João Cabral de Melo Neto e no artesão Espedito Seleiro. Seus desfiles são exibidos apenas em São Paulo e a cultura brasileira é uma ferramenta sempre muito presente em seu processo criativo.

Looks do mais recente desfile de Ronaldo Fraga para o Verão 2014 ©Agência Fotosite

Ronaldo também tem como contrapartida a democratização de convites (20% para patrocinadores e formadores de opinião e 320 ingressos disponibilizados ao público) e uma possível mostra têxtil.

Incentivo do governo em outros países

Ronaldo lembra que Japão e Bélgica interviram por seus estilistas no início dos anos 1980 e 1990, respectivamente. “São países que entendem a moda como vetor cultural. E eles entendem isso há muito tempo”.

No final, o sentimento que fica é de vitória. Milhares de jovens brasileiros buscam a expressão artística através da moda e muitos poderão se beneficiar com esta abertura”, diz Herchcovitch. “Nossa indústria têxtil está descendo ao mesmo tempo em que nunca se consumiu tanta moda no Brasil. Esse projeto vem para estimular isso, mostrar como um vetor econômico também pode ser um vetor cultural”, finaliza Fraga.

No entanto, como Ronaldo diz, é apenas a ponta de um iceberg. A indústria ainda cobra do governo um plano maior para a moda, além de iniciativas com viés cultural. Precisamos de tecnologia, mão de obra qualificada e uma revisão urgente da carga tributária para que nosso mercado cresça com saúde.

Veja a descrição dos três projetos de moda no Diário Oficial:

“Mostra de Moda em São Paulo e Nova York: Herchcovitch fala de Antropofagia Americana

Resumo do Projeto: “O resultado do processo de pesquisa e criação será apresentado na forma de uma coleção feminina desfilada em duas cidades centrais no calendário da moda nas Américas, São Paulo e Nova York, revisitando o movimento de antropofagia cultural em sentido amplo, criando obras de vestuário contemporâneo na dialética viva entre estranho e o familiar, estrangeiro migrante e o sedimento local, extraindo a experiência conceitual que emerge do passado colonial no contato dos europeus com corpos ameríndios”.

“Moda brasileira em Paris: internacionalização da criatividade, Pedro Lourenço”.

Resumo do Projeto: “A exposição de artefatos e de criações artísticas pretende mostrar duas coleções contemporâneas de moda feitas por um designer brasileiro, pensadas através da ótica do jovem e internacionalmente renomado estilista Pedro Lourenço que interpretará valores culturais e estéticos da performer e cantora Carmem Miranda e que os traduzirá para os dias atuais em duas mostras diferentes desfiladas na semana de moda de Paris”.

“Mostra Artesãos do Brasil na poética da moda: Sedimentos criativos revisitados por Ronaldo Fraga”

Resumo do Projeto: “A exposição de cultura visual contemporânea e de criações de cunho autoral de Ronaldo Fraga apresentará artefatos têxteis e técnicas brasileiras que transitam do popular ao erudito e do erudito ao popular, trabalho que se desdobra em duas coleções desfiladas nas temporadas de moda de São Paulo, evento conhecido como São Paulo Fashion Week. Mário de Andrade, João Cabral de Melo Neto e o artesão Espedito Seleiro são inspirações para estas duas Mostras”.

http://ffw.com.br/noticias/por Camila Yahn | Moda

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Respostas a este tópico

“Está certo usar a Lei Rouanet para bancar desfiles de moda?”

Boa discussão! Se por um lado há o medo de que esses incentivos financiem as marcas e não a moda brasileira, por outro os argumentos dos contemplados (principalmente do Ronaldo Fraga, que eu respeito muito) são bem convincentes. Algumas perguntas podem ser interessantes: como funciona nos outros países? O cinema nacional não teve um crescimento significativo com esses incentivos? Isso pode ocorrer na moda? Que precisamos desenvolver uma identidade própria e para isso precisamos de criação (mas ninguém por aqui consegue viver de criatividade...) não há dúvida! Abraços Romildo

É claro que temos que usar a Lei Rouanet para "incentivar" os pobres Alexandre Herchcovitch, Pedro Lourenço e Ronaldo Fraga... e os que vierem a seguir.

Enquanto isso "nosotros" somos incentivados com impostos escorchantes, concorrência desleal, importações fraudulentas ou mesmo contrabando, exigências mirabolantes dos magazines, etc, etc, etc...

A moda recentemente foi admitida no ministério da cultura, como sendo uma forma de expressão de nossa cultura.

A partir desse reconhecimento, a moda se iguala ao cinema e atividades culturais locais; creio que por definição não há nada errado no uso da lei Rouanet. Atribuir um erro a este uso, seria negar o reconhecimento anteriormente dado.

O que entendo é que não podemos misturar a criação de moda -  as passarelas -  com o varejo de vestuário. Este último se inspira no primeiro para fazer sua leitura e recriação em sua própria moda. 

Quando falamos de incentivar a moda como arte, ou expressão cultural , estamos tentando transformar o Brasil numa referência internacional. Isso quer dizer que se tivermos sucesso, essa atividade deverá gerar riqueza para o país como gera em outros países como a França. É lógico que para chegar lá, não bastará apenas incentivos em desfiles, mas na geração e estruturação do conhecimento gerado nessa área. O que quero dizer, é que criar o moda brasileira como um referencial internacional, não precisa necessariamente estar ligado a todo elo da cadeia têxtil. A criação pode ser vista como uma síntese de materiais colhidos em qualquer lugar do mundo, mas combinados e vivificados no Brasil, traduzindo nossa cultura em forma de moda.

O que quero defender aqui, é a manutenção desses incentivos e da visão dada à criação da moda brasileira; mas TAMBÉM à indústria têxtil. Porque nossos criadores só poderão criar a moda com produtos brasileiros quando também tivermos condições de atende-los técnica e criativamente; senão terão que ir fora do país para se manter criativos e atualizados.

Também defendo os incentivos para a indústria do vestuário,  elo que se inspira nas passarelas dos criadores de moda -  que podem ser brasileiros ou não, depende do valor que essa moda tem no mercado. Defendo esse incentivo, porque senão iremos gerar moda no Brasil, mas produzir vestuário em qualquer lugar do mundo; como acontece nos países atualmente reconhecidos como inspiradores para essa indústria.

Assim, os investimentos e incentivos devem estar direcionados de acordo com as metas para cada setor que podem ser reconhecidos independentemente para esse fim, de acordo com a política estatal orientada para os setores.

Agora, se o país não sabe orientar uma política para os setores ou define o incentivo apenas a um elo da cadeia; ou está analisando que os elos da indústria têxtil e do vestuário não são prioridades em seu plano de desenvolvimento industrial ou então não sabe realmente o que está fazendo. Que Deus nos ajude, nesse caso.

Espero que realmente alguém que tenha o poder de definição dessas políticas esteja realmente sabendo o que está fazendo.

 

tudo que e criado neste pais para melhorar vira mutreta, trambicagem, safadeza entre outras coisas, a lei rouanet, foi criada para incentivar a moda, mas moda que tem uma carga cultural,  que vem beneficiar e melhorar a vida de comunidades descobrir talentos entre outros beneficios, porem a primeira vez que ela sai do papel e uma afronta a toda sociedade, porque em relaçao a estes 3 apenas o ronaldo trabalha a nossa cultura mas é somente isto os outros requisitos ele tambem nao contempla, inclusive ficou numa saia justa na implantaçao do colegiado quando  idelgard angel, afirmou que ele fazia trabalho com as comunidades e la nao melhorava nada, o hercovitch

 e o pedro lourenço , simplesmente o requisito e ter nascido em sao paulo galinheiro eleitoral desta ministra equivocada que esta lá todos sabem porque, inclusive quem estava la tentando fazer um trabalho serio como a claudia leitao ela exonerou e ainda queria acabar com a secretaria de economia criativa, precisamos ir pra rua acabar com esta vergonha, derrubar esta ministra e principalmente evitar este derramamanto de dinheiro publico para promover estilistas apenas sem contemplar absolutamente nada dos objetivos que a lei foi criada para atingir, com este rio de dinheiro nos fariamos sai do papel centenas de projetos que que estao engavetados por nao termos condição sequer de  trabalhar melhor as comunidades que nao tem como organizar em formas de cooperativas, associaçãoes, pois nao tem ninguem la sequer para informar os caminhos, mais uma vez eu tenho vergonha de ser brasileira, certamente estes estilistas nao estao envergonhados quanto eu, envergonhada e indignada, espero que o colegiado falça alguma coisa, senao ele é  apenas um grupo de palhaços que estao la para legalizar esta safadeza.

como a paraiba tem o maior numero no colegiado, infelizmente eu nao tive tempo para isto, esperamos que voces se articulem e o membro do colegiado que for favoravel a isto voces nos informem pois precisamos divulgar este tipo de comportamento  se caso venha acontecer, espero que nao que o colegiado honre a moda a verdadeira e nao a fabricada.

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