O relatório, conduzido por Bruce Pinnington e Joanne Meehan da University of Liverpool e Alex Trautrims da University of Nottingham Rights Lab, revelou que não existe diferença estatística entre a quantidade de escravatura moderna nas cadeias de aprovisionamento da indústria de vestuário comparativamente com outros sectores.
O estudo analisou as perceções dos gerentes de compras e das cadeias de aprovisionamento perante o impacto do covid-19 no compromisso das empresas em lidar com a escravatura moderna. A iniciativa incidiu em dois grupos fundamentais com decisores políticos e influenciadores praticantes de vários sectores, nomeadamente produção, retalho e moda, de modo a compreender a extensão e a natureza das perturbações nas cadeias de aprovisionamento. Os autores da pesquisa também inquiriram quase 500 gestores de aprovisionamento do Reino Unido para as mesmas funções, que se enquadram nos requisitos do relatório Modern Slavery Act (2015).
Entre as principais conclusões do estudo consta que o covid-19 ajudou os gestores a ter em conta a escravatura moderna, já que apenas 53% tinham considerado abordar esta temática nas cadeias de aprovisionamento como uma prioridade importante antes da pandemia, uma percentagem que aumentou para 62% com a crise sanitária.
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De acordo com o relatório, nenhuma diferença estatisticamente significativa foi aparente por sector mas sim pela dimensão da empresa, o nível de antiguidade do inquirido e se o combate à escravatura moderna fazia parte do papel do participante. A prioridade atribuída a esta questão foi maior entre os gestores sénios e nas empresas de maior dimensão, uma vez que estes executivos estão mais conscientes do impacto estratégico da escravatura moderna, apesar da importância deste assunto não ser devidamente adotada por todas as funções e, consequentemente, empresas.
«Achei que haveria uma maior diferença entre as indústrias. A fast fashion é particularmente problemática devido à necessidade de preços baixos e resultados rápidos, então pensei que havia uma diferença na moda em comparação com outros sectores em termos de escravatura moderna, mas não houve nenhuma diferença estatística», explica Joanne Meehan ao Just Style. «Temos tendência para nos concentrarmos na escravatura moderna por sector, mas acho que as conclusões deste estudo mostram que a escravatura moderna ocorre em todos os sectores. Parece que estão todos no mesmo nível de maturidade, por isso poderia haver alguma colaboração entre indústrias para nos ajudar a progredir», acrescenta.
Problema ainda por resolver
Mesmo que a preocupação com este problema tenha aumentado com a pandemia, a abordagem à escravatura moderna continua a ser menor do que a preocupação com aspetos comerciais e operacionais da cadeia de aprovisionamento.
«O sentimento geral que entendo perante este relatório é que as empresas têm observado o que está a acontecer nas suas cadeias de aprovisionamento no que diz respeito à forma como os materiais são obtidos. Para mim, o que falta é responsabilizar-se pelas condições que criam para os trabalhadores e elas não estão a juntar os pontos», afirma Joanne Meehan.
A pesquisa demonstra que o covid-19 melhorou o conhecimento das empresas face às suas cadeias de aprovisionamento, o que cria uma oportunidade para que esse conhecimento seja aplicado num contexto de escravatura moderna, dado que 80% dos inquiridos acreditam que será necessária uma legislação mais forte em relação aos requisitos do Modern Slavery Act.
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«Uma das mensagens positivas que surge com o relatório é que todos entendem que a escravatura moderna é importante e está na agenda, mas não necessariamente na lista de tarefas», aponta a especialista, com esperança de que as empresas passem a cuidar melhor dos trabalhadores.
Mudanças a implementar
Para reverter este cenário que ainda não é o ideal, o estudo aconselha as empresas a mapear as estruturas das principais cadeias de aprovisionamento e analisar os riscos éticos e operacionais, sendo também incitadas a colaborar de forma mais abrangente com parceiros de outras indústrias com o objetivo de promover a responsabilidade ética nos vários sectores.
Para colmatar as falhas apontadas pelo relatório, Joanne Meehan anuncia a colaboração com o Chartered Institute of Procurement and Supply (CIPS). «Estamos a apresentar-lhes as nossas descobertas e o que isso significa na prática. Estou interessada em como traduzimos as descobertas com a necessária diligência, auditorias e mapeamento. Estamos a trabalhar com o CIPS para desenvolver uma conversa à volta do que isso significa, para começar a reunir alguns indicadores e boas práticas sobre como fazer o mapeamento da cadeia de aprovisionamento de uma maneira melhor no futuro», esclarece.
https://www.portugaltextil.com/escravatura-moderna-e-comum-a-todos-...