Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Industria Textil e do Vestuário - Textile Industry - Ano XVI

Especialista explica por que túnica surrada até os joelhos e uso de alpargatas são imagens mais realistas do que longos cabelos, pele clara e olhos azuis.

Imagem gerada por computador com a face de Jesus Cristo, a partir das características dos homens judeus do século primeiro, conforme estudo de Richard Neave - Bob Collier / Sygma/Getty Images

Durante as últimas décadas, surgiu vez ou outra a pergunta: qual era a aparência de Jesus? Falou-se muito sobre uma reconstrução digital de um homem da Judeia criada para Son of God, documentário da BBC de 2001. A imagem foi feita com base num crânio antigo e, usando tecnologias avançadas para a época, mostra a cabeça de um homem baixo e gordo, com uma expressão ligeiramente preocupada.

É correto afirmar que o tom de pele é bronzeado e o cabelo e a barba são pretos e curtos, mas o nariz, os lábios, o pescoço, os olhos, as pálpebras, as sobrancelhas, a camada de gordura e a expressão são apenas conjecturas. Fazer um homem de carne e osso somente a partir de crânios antigos não é uma ciência exata, porque o tecido mole e a cartilagem são desconhecidos.

Para mim, como historiadora, tentar visualizar Jesus com precisão é uma forma de tentar compreendê-lo com mais precisão também.

O Jesus que herdamos após séculos de arte cristã não é o correto, mas é uma marca poderosa. Sua aparência como um homem de cabelo longo, partido ao meio, com uma barba grande — em geral de pele clara, cabelos castanho-claros e olhos azuis — tornou-se a mais aceita. Imaginamos Jesus usando mantos compridos de mangas largas, da forma como é representado na maioria das obras de arte ao longo dos séculos. Em filmes contemporâneos — de Jesus de Nazaré (1977), de Zeffirelli, em diante — esse estilo predomina, mesmo quando suas roupas são consideradas malfeitas.

Há muitas razões por trás dessa representação aceita como o padrão mundial, e nenhuma delas tem a ver com a preservação da precisão histórica. Eu as exploro em meu novo livro, What did Jesus look like?, mas no fim das contas procuro por pistas do Jesus de verdade em textos antigos e na arqueologia.

Para mim, sua aparência não é só sua carne e osso. Afinal, nossos corpos não são apenas corpos. Como argumenta o sociólogo Chris Shilling, eles são “tanto recursos pessoais como símbolos sociais que ‘emitem’ mensagens sobre identidade”. Podemos ser velhos, novos, altos, baixos, gordos, magros, ter pele clara, pele escura, cabelos crespos, cabelos lisos e assim por diante, mas nossa aparência não começa e termina em nosso corpo físico. Numa multidão, podemos encontrar um amigo por causa de seu cachecol em vez de seu cabelo ou nariz. O que cria uma aparência é o que fazemos com nosso corpo.

Então a aparência de Jesus teria tudo a ver com aquilo que ele vestia. Assim que determinarmos sua paleta de cores correta, levando em conta que ele era um homem judeu do Oriente Médio, como o vestiremos? Como ele parecia para as pessoas de seu tempo?

A visão de Jesus do pintor inglês William Holman Hunt (1827-1910) - William Holman Hunt / Manchester Art Gallery, 1853

Não existe uma descrição física nítida de Jesus nos Evangelhos ou na literatura cristã antiga. Existem, sim, detalhes incidentais. Por causa da Bíblia (por exemplo, Marcos 6:56), você consegue descobrir que ele usava um manto — um xale longo (em inglês, himation, palavra de origem grega) — que tinha borlas, descritas como “bordas”; é nitidamente uma versão mais antiga do talit judeu. Normalmente feito de lã, o manto poderia ser grande ou pequeno, grosso ou fino, colorido ou na cor natural, mas os homens preferiam o modelo não tingido.

Ele usava alpargatas, como sugerido por múltiplas passagens da Bíblia (ver Mateus 3:11; Marcos 1:7, 6:9; João 1:27), e sabemos agora como eram as sandálias antigas usadas na Judeia, pois foram preservadas, em cavernas secas, pelo Mar Morto.

Usava uma túnica, quíton, que para os homens ficava um pouco abaixo do joelho, e não no tornozelo. Apenas os mais ricos usavam as compridas. Inclusive, Jesus identifica que especificamente esses homens de túnicas longas (Marcos 12:38) não merecem as honras que recebem de pessoas que se impressionam com seus trajes finos, pois, na verdade, eles devoram injustamente as casas das viúvas.

A túnica de Jesus também foi feita a partir de apenas um pedaço de tecido (João 19:23-24). Isso é estranho, porque a maioria delas era feita de dois tecidos costurados no ombro e nas laterais. Normalmente, mantos de apenas um pedaço, no primeiro século na Judeia, eram roupas de baixo finas ou roupa infantil. Não devemos pensar nas roupas íntimas contemporâneas, mas usar um artigo de peça única, e só ele, provavelmente não era bem-visto. Era extremamente básico.

É possível que não surpreenda, então, o fato de Jesus ser lembrado como alguém que parecia desleixado por um erudito chamado Celso, em seu tratado contra os cristãos escrito na metade do segundo século. Celso fez seu dever de casa. Entrevistou pessoas e — como nós — estava interessado na aparência de Jesus. De judeus e outros que questionou, ouviu dizer que Jesus “circulava pelos lugares de forma vergonhosa à vista de todos”. Ele “obteve seu sustento de maneira infame e inoportuna” — pedindo esmola ou recebendo doações.

Uma ilustração mais realista de Jesus: o cabelo e barba curtos, túnica até os joelhos e alpargatas - Ilustração: Joan Taylor / Cortesia do autor

Da perspectiva de pessoas respeitáveis, podemos supor que Jesus aparentava ser relativamente bruto. Quando o escritor cristão Orígenes discutiu com Celso, ele rejeitou muitas de suas declarações, mas não questionou esse fato.

Então, embora Jesus usasse roupas similares, em vários aspectos, às de outros homens judeus, seu “visual” era surrado. Eu duvido que seu cabelo fosse especialmente longo, como era retratado na maioria das obras de arte, devido às normas masculinas da época, mas certamente não era bem cuidado. Usar uma túnica básica que outras pessoas usavam como roupa de baixo combina com a indiferença de Jesus quanto a coisas materiais (Mateus 6:19-21, 28-29; Lucas 6:34-35, 12:22-28) e com sua preocupação com os pobres (Lucas 6:20-23).

Isso, para mim, é o começo de uma maneira diferente de ver Jesus — muito relevante para nossa época de enorme desigualdade entre ricos e pobres, assim como era no Império Romano. Ele ficou do lado dos pobres, e isso teria sido óbvio por seu aspecto.

A aparência de Jesus é importante porque reflete a essência de sua mensagem. Independentemente de como é retratado em filmes e obras de arte hoje em dia, ele precisa ser mostrado como alguém que não tinha nada. Seus ensinamentos só podem ser verdadeiramente compreendidos a partir dessa perspectiva.



Leia mais: https://epoca.globo.com/o-que-jesus-vestia-23039383#ixzz5QPcfaJH2 
stest 


Para participar de nossa Rede Têxtil e do Vestuário - CLIQUE AQUI

 

Exibições: 1658

Responder esta

© 2025   Criado por Textile Industry.   Ativado por

Badges  |  Relatar um incidente  |  Termos de serviço