LOS ANGELES - A Fashion Nova aperfeiçoou o modelo fast-fashion para a era do Instagram. A maioria dos varejistas online se apoia em uma vasta rede de celebridades, influenciadores e usuários aleatórios que postam sobre as marcas incansavelmente nas mídias sociais. São marcas criadas para satisfazer a clientela online, produzindo em massa roupas baratas que parecem caras.
"As pessoas precisam comprar muitos estilos diferentes e provavelmente usá-los poucas vezes para que seus feeds de Instagram possam se manter atualizados", disse Richard Saghian, fundador da Fashion Nova, em entrevista no ano passado.
Para possibilitar esse hábito, ele oferece a seus clientes um fluxo constante de novas opções a preços acessíveis.
Os dias de jeans a US$ 200 acabaram, se você perguntar a Saghian. O jeans skinny da Fashion Nova sai por US$ 24,99. E, segundo ele, a empresa pode confeccionar roupas "em menos de duas semanas", geralmente por meio de fabricantes em Los Angeles, a curta distância da sede da empresa.
Esse modelo indica um segredo horroroso por trás do grande sucesso da marca: o Departamento Federal do Trabalho descobriu que muitas roupas da Fashion Nova são costuradas por uma força de trabalho que recebe salários ilegalmente baixos nos Estados Unidos.
Los Angeles está cheia de fábricas que pagam o menor salário possível a trabalhadores sem registro, na tentativa de fazer frente a concorrentes estrangeiros, que podem pagar ainda menos. Muitas pessoas atrás das máquinas de costura estão no país ilegalmente e quase nunca denunciam seus patrões.
"O esquema tem todas as vantagens de um sistema clandestino", disse David Weil, que coordenou a divisão de horas e salários do Departamento do Trabalho dos Estados Unidos de 2014 a 2017.
Todos os anos, o departamento investiga denúncias de violações salariais em fabricantes de roupas de Los Angeles, aparecendo sem aviso prévio para vistoriar dados da folha de pagamento, entrevistar funcionários e interrogar proprietários.
Em investigações realizadas entre 2016 e este ano, o departamento descobriu que roupas da Fashion Nova estavam sendo fabricadas em dezenas de fábricas que deviam US$ 3,8 milhões em salários atrasados a centenas de trabalhadores, de acordo com documentos federais internos que relataram as descobertas e foram analisados New York Times.
Essas fábricas, contratadas por intermediários para produzir peças para marcas da moda, pagavam a seus trabalhadores apenas US$ 2,77 por hora, segundo uma pessoa familiarizada com a investigação.
O Departamento do Trabalho se recusou a comentar os detalhes das investigações. Em comunicado, uma porta-voz disse que o departamento "continua garantindo que os empregadores operem em conformidade com os requisitos de horas extras e salários mínimos, e a Divisão de Horas e Salários está comprometida em fazer cumprir a lei".
Depois que repetidas violações foram encontradas em fábricas que confeccionavam roupas para a Fashion Nova, autoridades federais se reuniram com representantes da empresa.
"Já tivemos uma reunião altamente produtiva e positiva com o Departamento do Trabalho, na qual discutimos nosso compromisso para garantir que todos os funcionários envolvidos com a marca Fashion Nova sejam adequadamente compensados pelo trabalho que realizam", disse em comunicado ao Times Erica Meierhans, advogada-geral da Fashion Nova. "Qualquer sugestão de que a Fashion Nova seja responsável por pagar mal a quem trabalha em nossa marca é categoricamente falsa."
Em 2018, Saghian disse que cerca de 80% das roupas da marca eram feitas nos Estados Unidos. A cadeia de suprimentos da Fashion Nova mudou desde então, e agora a marca diz que produz menos da metade de suas roupas em Los Angeles. A porcentagem geral feita nos Estados Unidos não foi especificada.
A empresa não lida diretamente com as fábricas. Em vez disso, faz pedidos em grandes quantidades a empresas que modelam as roupas e depois enviam tecidos para diferentes fábricas, onde os trabalhadores costuram as peças e colam a etiqueta da Fashion Nova. Os vestidos justos e os macacões com estampas de animais da marca geralmente são feitos por pessoas como Mercedes Cortes, que trabalha em prédios em ruínas que cheiram a esgoto.
Mercedes, 56 anos, costurou roupas da Fashion Nova por vários meses na Coco Love, uma fábrica empoeirada perto dos escritórios da Fashion Nova em Vernon, Califórnia. "Tinha muita barata. Tinha rato", disse ela. "As condições não eram boas."
Ela trabalhava todos os dias da semana, mas seu salário variava conforme a rapidez com que seus dedos se moviam. Mercedes recebia por peça costurada: cerca de 4 centavos para costurar uma manga, US$ 0,05 para uma costura lateral, US$ 0,08 para a costura do decote das camisas. Ganhava, em média, US$ 270 por semana, o equivalente a US$ 4,66 por hora, disse ela.
Em 2016, Mercedes deixou a Coco Love e, tempos depois, chegou a um acordo com a empresa para receber US$ 5 mil em salários atrasados. Ela continuou a trabalhar em fábricas que costuravam roupas da Fashion Nova, mesmo sabendo que as blusas que costurava por poucos centavos chegavam a custar US$ 12. "As roupas são muito caras pelo que nos pagam", disse Mercedes.
"Os consumidores podem dizer: 'Bom, é assim que funciona em Bangladesh ou no Vietnã, mas estes são países em desenvolvimento'", disse Weil. "As pessoas simplesmente não querem acreditar que a mesma coisa acontece aqui no nosso quintal."
Apesar das condições degradadas, essas fábricas ainda estão produzindo roupas para os principais varejistas americanos. Pela lei federal, as marcas não podem ser punidas por irregularidades de salário nas fábricas caso possam provar que não sabiam que suas roupas são feitas por trabalhadores que recebem salários abaixo da legislação. O Departamento do Trabalho arrecadou milhões em salários atrasados e multas sobre empresas de roupas de Los Angeles nos últimos anos, mas não multou nenhum varejista.
Este ano, as etiquetas da Fashion Nova foram as mais encontradas por investigadores federais que inspecionavam fábricas que pagam salários extremamente baixos, segundo uma pessoa familiarizada com as investigações.
Em setembro, três funcionários do departamento se reuniram com os advogados da Fashion Nova para dizer a eles que, em quatro anos, as roupas da marca foram encontradas em 50 inspeções de fábricas que pagam menos do que o salário mínimo federal ou não pagam horas extras.
Os advogados da empresa disseram às autoridades que haviam tomado medidas imediatas e já haviam atualizado os acordos da marca com os fornecedores. Agora, se a Fashion Nova descobrir que uma fábrica foi acusada de violar as leis "que regem os salários e as horas de seus funcionários, o trabalho infantil, o trabalho forçado ou as condições de segurança do trabalho", a marca colocará o intermediário que contratou a fábrica em um período "probatório" de seis meses, afirmou-se em comunicado.
A relação de trabalho pode continuar, a menos que os trabalhadores apresentem outra queixa contra a mesma fábrica ou outra que o intermediário contratou durante esses seis meses. Nesse caso, a marca suspenderá o contratado até que este seja aprovado por uma auditoria externa.
Embora a Fashion Nova tenha tomado medidas para tratar das descobertas do Departamento do Trabalho, a advogada da empresa observou que a marca trabalha com centenas de fabricantes e "não é responsável pela maneira como esses fornecedores lidam com suas folhas de pagamento".
Muitas das pessoas que trabalham com Saghian ocupam salas com paredes de vidro nos quarteirões mais frenéticos do bairro da moda no centro de Los Angeles. Estas são as empresas que desenham as roupas e as vendem a granel para a Fashion Nova e outros varejistas. Essas empresas terceirizam o trabalho de confecção das roupas para fábricas próximas, as quais trabalham como subcontratadas.
Em novembro, o Times visitou sete empresas que fazem roupas para a Fashion Nova em fábricas que pagam remunerações baixas aos trabalhadores, de acordo com as investigações do Departamento do Trabalho. Algumas pessoas falaram livremente sobre sua relação com a marca. Outras se recusaram a comentar ou falaram sob a condição de anonimato, temendo perder o contrato com a empresa, caso se pronunciassem publicamente.
Os cinco proprietários e funcionários que concordaram em dar entrevista disseram que a Fashion Nova sempre fez pressão para pagar o preço mais baixo possível por peça de roupa, exigindo retornos rápidos. "Eles me dão o melhor preço que podem dar e, ainda assim, tiram lucro", disse Saghian.
As empresas podem negociar com a Fashion Nova, mas seu poder é limitado. É cada vez menor o número de varejistas que ainda faz negócios em Los Angeles, e alguns pedidos grandes da Fashion Nova podem manter uma pequena empresa à tona por mais um ano. Por isso, elas procuram subcontratados que possam costurar as roupas o mais rápido e mais barato possível.
Quando Teresa Garcia começou a trabalhar na Sugar Sky, o lugar ainda se chamava Xela Fashion. Era 2014 e a Xela Fashion, como mostram os registros estaduais, era propriedade de Demetria Sajche, uma mulher a quem Teresa fora instruída a chamar de Angelina.
Vários meses depois - Teresa não se lembra quantos -, o nome em seus cheques havia mudado, embora ela trabalhasse na mesma fábrica suja no coração da cidade, a poucos quarteirões de uma academia SoulCycle.
Agora, quem pagava seu salário era a Nena Fashion, uma empresa fundada por Leslie Sajche, parente da chefe de Teresa, de acordo com registros comerciais arquivados na Secretaria de Estado da Califórnia. Cerca de um ano depois disso, o nome mudou novamente, para GYA Fashion.
Em 2017, a fábrica se mudou para um trecho industrial do Olympic Boulevard, no leste de Los Angeles, e começou a usar um novo nome: Sugar Sky. Mais um ano depois, Leslie parou de administrar as operações do dia a dia e entregou o trabalho a Eric Alfredo Ajitaz Puac, que os trabalhadores conheciam como seu namorado.
Semanas de tentativas de contatar Puac e Leslie não tiveram sucesso. Uma viagem ao último local conhecido da Sugar Sky, pouco antes do Dia de Ação de Graças, encontrou em seu lugar apenas uma loja de móveis. Os vizinhos disseram que a fábrica de roupas havia se mudado dois meses antes.
Fernando Axjup, listado como gerente de um setor da fábrica, concordou em dar entrevista. Ele foi demitido recentemente e entrou com processo por salários atrasados. "Eles continuam mudando os nomes para não precisar pagar as pessoas", disse Axjup. "Tinha muita exploração." Como gerente, ele tinha acesso aos dados da folha de pagamento e disse que Teresa raramente ganhava o salário mínimo.
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