As expectativas eram altas, ainda que variadas. Depois de mais de um ano sem desfiles presenciais, tinha quem queria que tudo voltasse ao que era antes, como se nada fosse. Tinha gente achando que ainda era cedo e arriscado demais abrir mão do formato digital. E tinha quem não via sentido em seguir fazendo tudo igual.
Terminada na semana passada, a temporada de desfiles internacionais de verão 2022 era aguardada com um bem-vindo momento de virada. Com mais de 4,5 milhões de mortes no mundo, a maior pandemia da história nos forçou uma revisão generalizada de tudo.
Passamos a olhar de maneira diferente para nossas casas, para nós mesmos, para os outros e para o mundo. Tivemos importantes movimentos em prol de justiça social, de responsabilidade climática e ambiental e de democracia. Especificamente na moda, questionou-se o consumo, a produção, o timing de lançamento, o valor das roupas e do trabalho nelas empregado.
Diante de tudo isso, esperava-se uma temporada de desfiles IRL (in real life) no mínimo sensível ao que as pessoas estão passando em suas vidas – o que não é pouco.
Não foi bem o que aconteceu.
Apesar dos discursos engajados dos últimos tempos, a impressão que ficou é de extremo apego ao passado: das celebridades ostentando privilégios na primeira fila, montadas da cabeça aos pés, aos estereótipos de beleza ultrapassados até uma ideia de luxo em dessintonia com as demandas atuais.
Ainda assim, houve quem fizesse diferente ou ao menos tentado. A seguir, destacamos os melhores momentos da temporada e as tendências mais relevantes da estação.
Antes de mais nada, é importante frisar que a retomada dos desfiles presenciais, com plateia e tudo mais, só foi possível devido ao sucesso das campanhas de vacinação. Ainda assim, apesar do fim de algumas restrições, a pandemia ainda não acabou, e alguns cuidados são essenciais para evitar um repique no número de contágios, hospitalizações e mortes.
Numa ação coordenada com as organizações de saúde locais, a semana de moda de Nova York exigiu comprovante de vacinação completa para os convidados e para todos os profissionais envolvidos nas apresentações. A ideia era prevenir o avanço da variante Delta pelo país, incentivar a imunização da população e, com isso, controlar a evolução da Covid-19.
Em novembro deste ano, algumas semanas de moda nacionais, como a São Paulo Fashion Week e Casa de Criadores, planejam retomar os eventos físicos. Dado os números ainda altos da pandemia no Brasil, seria no mínimo de bom tom seguir o modelo estadunidense. Fica a dica!
Balmain, verão 2022.
Foto: Getty Images
Ainda sobre a New York Fashion Week, uma das apresentações mais interessantes não aconteceu nas passarelas. Na verdade, ela foi quase como uma coletiva de imprensa para comunicar o lançamento da Telfar TV. Trata-se de uma espécie de canal de televisão (só que na internet) com conteúdos especiais acompanhando cada drop da marca, além da transmissão de eventos e material produzido por amigos e admiradores da etiqueta.
Em Paris, o diretor de criação da Balmain, Olivier Rousteing, transformou o desfile de verão 2022 da maison em um festival de música de dois dias. "Acho que a única forma da moda sobreviver é por meio da conexão com outras áreas da cultura", disse o estilista, em entrevista publicada no Vol. 5 da ELLE impressa.
Uma das principais novidades foi a abertura do ao público – eram dois dias de apresentação, um com entrada gratuita e outro mediante doações de no mínimo 15 euros para organizações que trabalham na pesquisa e combate ao HIV e AIDS. É comum eventos de moda em espaços públicos, porém eventos abertos ao público é outra coisa. E uma que parece fazer cada vez mais sentido em tempo de discursos por mais acesso, inclusão e diversidade.
Balenciaga.
Foto: Getty Images
Na Balenciaga, moda e entretenimento também se cruzaram. A principal atração do evento foi o curta feito em parceria com a animação Os Simpsons. O melhor, contudo, aconteceu antes da exibição, no tapete vermelho. Foi lá que a coleção de verão 2022 foi apresentada, junto com a chegada de convidados famosos e desconhecidos. Como a maioria vestia peças da grife, ninguém sabia ao certo o que estava acontecendo, o que era coleção nova e o que não era, quem era modelo e quem estava lá pelo evento.
O questionamento sobre verdadeiro ou falso, real ou virtual é algo recorrente nos últimos trabalhos do diretor de criação Demna Gvasalia, mas aqui ganhou todo um outro contexto. Ao romper os limites entre plateia e passarela, o estilista aproxima sua moda de uma ideia de realidade mais plausível do que aquela representada por um grupo de modelos jovens, altas e magras. No red carpet da Balenciaga tinha gente alta, baixa, magra, gorda, jovem, velha, cis, trans, de um (quase) tudo.
Algo similar aconteceu em Milão, no desfile da Marni. Lá, o diretor de criação Francesco Risso vestiu não só as modelos, mas todos os convidados. O desfile foi quase como um ritual comunitário, com todos mundo participando do auê, culminando numa quase catarse coletiva ao final.
PatBo, verão 2022.
Foto: Getty Images
De volta para a New York Fashion Week, esta edição do evento contou com a participação da brasileira PatBo. A grife de Patrícia Bonaldi já havia realizado duas apresentações digitais por conta das restrições sanitárias e, agora, pôde fazer sua estreia nas passarelas. O desfile marca um importante passo na internacionalização da etiqueta, que ganhou também sua primeira loja fora do Brasil, mais especificamente no bairro do Soho, em Nova York.
Peter Do, verão 2022.
Foto: Divulgação
Outra estreia aguarda na semana de moda nova iorquina era a do estilista vietinamita Peter Do. A marca foi fundada em 2018 e, desde então, ganhou toda uma legião de fãs e seguidores nas redes sociais. Para o début nas passarelas, o designer olhou para sua primeira coleção refinando sua identidade e o que há de mais essencial em sua marca: uma alfaiataria precisa, de silhueta alongada e uma sensualidade bastante particular.
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